CI

Em tempo de freqüentar o futuro


Eleri Hamer
O país do futuro. Isso é o que parecemos ser eternamente. A sensação que tenho, porém, é que em vários setores da sociedade estamos num processo de acomodação. Já escrevi noutro artigo que não fazemos o que precisa ser feito. Isso em várias esferas, até na familiar quando delegamos à escola educar nossos filhos ao invés de fazê-lo. Principalmente porque pensamos no curto prazo e muitas vezes o longo prazo exige ações que requerem fibra e podem ser dolorosos no presente.

Uma pequena mostra disso é dada pela discussão e pelas primeiras ações em torno do embargo europeu à carne brasileira e as respectivas exigências, e o mais recente, ao Mato Grosso, pela Rússia, em função da estomatite vesicular. Para-se tudo e começamos a procurar culpados. Sabemos que não terá utilidade, até porque muitos já foram encontrados e tem endereço sabido, mas não são punidos. Por isso, a sensação de acomodação permanece.
Vamos dar uma olhadela no que a nossa sociedade, boa parte da classe política e, por conseguinte o governo está preocupado na atualidade. O nosso debate tem sido sempre em torno de temas mínimos, que resultam em pouca efetividade no desenvolvimento do Brasil como nação.
Na Europa a tônica da discussão tem sido a integração efetiva dos países, alguns inimigos mortais a pouco tempo, num mesmo espaço econômico e a luta integrada para garantir-lhes segurança alimentar; na Índia o foco está nos grandes temas de ciência e tecnologia colocando-os em pé de igualdade com americanos e europeus; sem falar em China e Chile que tem dado um baile no quesito planejamento e execução.
Aqui não. Além do reality show que já está na 8ª. edição graças a imensa massa preocupada em não pensar, temos nos atido às importantes discussões em torno dos cartões corporativos, se o bolsa-família deve ou não ter décimo terceiro, além da constante acomodação da base aliada na estrutura do governo. Aliás, foi essa última grande necessidade do país que guindou o glorioso Stephanes ao posto de Ministro da Agricultura.
Isso parece mais ou menos como a história da tartaruga em cima do poste. Se ela não tem capacidade para chegar lá, como chegou? Provavelmente alguém importante deve tê-la colocado lá. Por isso também, ela acaba ficando, sem que ninguém se aventure a tirá-la.

Sinceramente, fiquei estupefato diante da declaração do ministro. Não pude acreditar. Presentear o adversário com um argumento desses, para quem já está perdendo o jogo, nos permite começar a duvidar a que interesses servem o chefe maior do MAPA. Não pode ser só incompetência. Depois das trapalhadas das listas, agora essa.
Prefiro crer que por outro lado, muita coisa tem sido feita em direção ao futuro. Temos que reconhecer que apesar da nossa eventual incapacidade de fazer no tempo e na medida certa, muita coisa avançou. Depois de 10 anos de luta insana para os produtores reconhecerem a importância da rastreabilidade e torna-la algo possível, estava prestes a acontecer efetivamente, faltando apenas detalhes. Penso que estamos morrendo na praia porque faltou seriedade e liderança. Demoramos muito tempo para aprender a nadar com eficácia. Nesse ponto, o futuro estava quase presente.
Agora a questão se tornou de importância pátria e não diz respeito somente aos produtores ou a bancada ruralista, diz respeito à sociedade e toda a classe política nacional. Está em jogo a reputação do Brasil como nação. Com atitudes desse tipo, a nossa credibilidade é arranhada e pode respingar para outras cadeias, como a de suínos, aves, soja, algodão, dentre outras.
Como escreve o Giambiagi em seu livro BRASIL – Raízes do Atraso, “...a forma como nos relacionamos com o tempo é uma função da própria idade: chegar ao Brasil almejado no espaço de 25 ou 30 anos, quando se tem 30 anos, não é a mesma coisa de quando se tem 45...emana da minha alma...a aspiração de estar ainda em tempo de poder freqüentar o futuro”.
Grande semana.

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.