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O calcanhar-de-aquiles do agronegócio


Benedito da Silva Ferreira

Quando os números do agronegócio brasileiro são colocados em perspectiva, o seu desempenho e a conseqüente contribuição para a economia brasileira aparecem de forma clara e inconteste: desde 1997 as exportações do setor tiveram um crescimento de 150% e atingiram a marca de US$ 58,4 bilhões em 2007, e nos últimos 12 meses já acumulam US$ 60,2 bilhões, número crucial em um ano em que o País caminha em direção a uma forte retração do superávit comercial.

Também nos últimos dez anos a produção de grãos cresceu 82% e deve chegar a 139,3 milhões de toneladas na safra 2007/2008, segundo estimativa da Conab, graças aos importantes ganhos de produtividade advindos de investimentos em tecnologias e à presença de recursos humanos altamente capacitados. Além disso, os recentes números divulgados pelo IBGE indicam que em 2007 a agropecuária foi o setor que mais cresceu no ano, com uma elevação de 5,4% do PIB. Soma-se este desempenho aos atuais preços recordes das commodities no mercado internacional e se forma na opinião pública o sentimento de que o agricultor foi capaz de recompor as perdas advindas da crise de 2004-2005, marcada por dois pesadelos: as intempéries climáticas, como secas prolongadas, e os preços internacionais depreciados.

Ocorre que as margens seguem apertadas pelo aumento dos custos de produção, puxados especialmente pela elevação dos preços de alguns insumos agropecuários no mercado internacional, como os produtos para alimentação animal e fertilizantes. Neste caso, é importante observar, por exemplo, que o Brasil é o 4º consumidor mundial de fertilizantes, atrás da China, da Índia e dos EUA, respectivamente. Embora o 4º lugar confira ao País uma posição de destaque, somente a China e a Índia têm um consumo anual desses insumos sete vezes superior ao brasileiro. Assim, qualquer incremento da demanda nesses países pode gerar dificuldades no suprimento do produto, influenciando gravemente os preços de mercado, como ocorreu em 2007.

A solução estratégica seria incentivar a produção doméstica, mas se observa que o movimento tem sido oposto: no ano passado, cerca de 64% dos fertilizantes entregues ao consumidor final, ou 17,5 milhões de toneladas, foram produzidos no exterior. O mais grave é que, segundo projeções da MB Associados, as importações representarão 86% do total consumido no Brasil em 2025. Em vez de incentivar a produção nacional, a falta de isonomia tributária com o produto importado causa desestímulo ao investimento no País. Para citar um exemplo ainda neste setor, o produto importado é isento de ICMS, ao contrário do nacional, que é taxado nas operações interestaduais. É importante lembrar que, uma vez tomada a decisão de investir neste setor, uma nova indústria exige um tempo mínimo de maturação para início da produção, que varia de 5 a 7 anos, e cifras na casa do bilhão.

No caso dos defensivos agrícolas, a dificuldade de incluir novos fabricantes, por conta do demorado processo de registro de novas empresas no Brasil, tem restringido a oferta de defensivos no mercado nacional, levando ao risco de faltar itens essenciais à atividade agrícola, como o glifosato.

Para as rações, pesa o aumento do preço do farelo de soja e do milho, resultante em grande parte da política de etanol dos EUA, que utiliza o milho como matéria-prima, impactando os custos da cadeia produtiva da carne de aves. Mas não é só isso: os nutrientes importados, muitos deles da China, sofreram alarmantes reajustes de preços naquele país. No caso do sal mineral, o fosfato bicálcico respondeu por 77% do aumento do preço do produto e, além do fator China, ainda pesa o aumento do preço do petróleo, cujo céu parece ser o limite. Neste caso, é a cadeia da carne bovina que sofre o impacto.

Assim, há que se alertar que a agricultura brasileira caminha para uma dependência excessiva em relação aos insumos importados, para que se adote, o quanto antes, uma estratégia nacional para o tema. China, Rússia e outros importantes fornecedores brasileiros já aplicam algum tipo de restrição ao fornecimento, principalmente por meio de quotas e crescentes tarifas às exportações. Isto porque, entre outros motivos, precisam garantir o próprio abastecimento, uma vez que são também grandes consumidores. É bom lembrar que, se o agronegócio é o motor da economia brasileira, o insumo é o seu combustível, mas pode se transformar também no seu calcanhar-de-aquiles.

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