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O trigo e o preço mínimo


Argemiro Luís Brum
O Brasil, desde que se lançou na modernização da agricultura, nos anos de 1950, nunca conseguiu ser autossuficiente em trigo. Por questões técnicas e climáticas, e mais recentemente por questões igualmente de política econômica interna, o país continua sendo dependente das importações em cerca de 50% de suas necessidades.
Produzimos ao redor de 5 milhões de toneladas e consumimos ao redor de 10,5 milhões de toneladas. O Rio Grande do Sul, por onde começou a modernização agrícola no país, é hoje o segundo maior produtor nacional do cereal, com cerca de 2 milhões de toneladas em média, quando de clima normal. Pois desde 1990, quando o governo anunciou a mudança na sua política tritícola, deixando as compras estatais a preço mínimo garantido de lado, e colocando os produtores diretamente em confronto com o mercado, a triticultura nacional entrou em outro contexto e assim deve ser compreendida.
O advento do Mercosul, em 1991, acabou sacramentando o processo. Assim, em termos de economia do Estado nacional, a produção local de trigo perdeu importância relativa. Ou seja, sai muito mais barato comprar o produto, em muitos casos de bem melhor qualidade, da Argentina, no contexto de fortalecimento do Mercosul, ou da América do Norte e mesmo da Europa, particularmente num momento em que a moeda nacional permanece por longo tempo sobrevalorizada em relação ao dólar. O governo se enganou no ano passado, ao estabelecer um preço mínimo muito elevado em relação ao comportamento cambial (hoje o preço mínimo serve particularmente para operações de AGF/EGF e para balizar os leilões de PEP, visando escoar a produção com subsídios aos industriais, embora na prática o sistema deixe muito a desejar).
Como a tendência é do câmbio permanecer nestes níveis atuais e os preços internacionais do cereal se fixarem, via Bolsa de Chicago, entre US$ 4,00 e US$ 5,00/bushel, o governo adota uma medida de recuo em 2010, pouco se importando com a redução da área semeada, que já se prevê entre 10% a 20% no mínimo, havendo regiões indicando 30% a menos de área cultivada.
O trigo e o preço mínimo (II)
O recuo se dá pelo anúncio, já comentado nos bastidores pelo mercado há alguns meses (portanto, não foi surpresa !), de uma redução em 10% no novo preço mínimo do cereal. A ideia, além de levar a uma redução na produção, é diminuir o custo do Estado com o trigo caso seja necessário exercer novamente (como será !) medidas tipo os leilões de PEP.
O produtor, com poucas alternativas de inverno e geralmente precisando de liquidez nesta época do ano, acaba semeando o trigo em busca do crédito bancário, mesmo sabendo que terá prejuízo econômico direto com a cultura (os dados informados pela Fecoagro/RS recentemente demonstram que entre o custo total de produção projetado e o atual preço pago pelo cereal, quando há comprador, chega a uma defasagem, já no momento de plantar, de aproximadamente R$ 11,00/saco).
Ou seja, nas condições que o Brasil construiu a partir de 1990, não é viável semear trigo no país se olharmos unicamente a lógica econômica de mercado, salvo para aqueles produtores bem estruturados e com um eficiente controle de custos e processos de produção. Estes últimos anos mais uma vez compravam tal realidade, agravada pelo fato de que o governo continua indicando desinteresse em revitalizar a produção nacional. Está mais do que na hora das regiões produtoras repensarem a atividade, as alternativas existentes e os processos de gestão das propriedades em relação à cultura.
Está mais do que na hora, particularmente, de se constituir de fato uma cadeia do trigo no país, que venha efetivamente trabalhar em defesa do produto, sem pensar única e exclusivamente no socorro estatal ou, o que é pior, em vantagens específicas de um ou outro segmento.
Caso contrário, a atividade, neste quadro, será sempre uma geradora de dívidas e não uma solução ao desenvolvimento regional, como no passado chegou a se cogitar.
China valoriza sua moeda ( ?)
O anúncio chinês de que flexibilizará mais o seu câmbio a partir de agora, veio ao encontro das pressões internacionais e particularmente dos EUA. Isso porque a China havia, desde o início da atual crise mundial, ancorado sua moeda ao dólar, desvalorizando-a ao ritmo da moeda norte-americana.
Assim, sua competitividade no mercado mundial foi mantida, criando uma tensão enorme entre os países já que o saldo comercial chinês se tornava constantemente positivo, impedindo que grande parte dos demais países do mundo conseguisse alavancar suas economias debilitadas pela crise, via exportações mais interessantes para o maior mercado mundial na atualidade.
O anúncio da mudança de postura na política cambial, embora ainda seja muito cedo para realmente ser avaliado como positivo, na prática, traz uma esperança ao mundo na medida em que se espera que o yuan (oficialmente conhecido como reminbi na China) seja valorizado, retirando um pouco da competitividade dos produtos chineses e abrindo as portas do país para mais importações, fato que ajudaria a puxar a economia mundial, especialmente a estadunidense.
Resta saber o que farão os exportadores chineses e o consequente impacto na economia interna do país com o aumento das dificuldades para vender seus produtos ao exterior. Poderemos estar diante de mais um mecanismo de freada no crescimento da economia do país asiático, hoje desejada inclusive pelo próprio governo local.  

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