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Fórum do trigo destacou viabilidade econômica da cultura

Evento em Passo Fundo (RS) reuniu cerca de 300 pessoas de dez estados brasileiros


Um estudo realizado pela Fundação ABC apontou que a cultura trouxe lucratividade aos produtores que cultivaram o cereal no inverno em lavouras no Paraná e São Paulo. Segundo o pesquisador do setor de Economia Rural da Fundação ABC, Cláudio Kapp Júnior, foram analisadas 24 safras avaliando a produtividade e custos de produção do trigo junto a cooperados na área de atuação da Fundação ABC, composta pelas cooperativas Capal, Frísia e Castrolanda. 

Os resultados mostram que, desde de 1995, o custo de produção ficou, em média, abaixo dos 2 mil kg/ha (quilos por hectare), registrando a rentabilidade de R$ 299,00 por hectare em média, 24 safras avaliadas. Conforme Cláudio, mesmo em anos de frustração, como em 2017, o custo foi de 2.400 kg/ha, mostrando viabilidade econômica para a cultura. “É preciso considerar de três a cinco safras porque apenas uma safra com frustração climática ou oscilações no mercado pode mascarar o real resultado do trigo”, avalia o pesquisador, lembrando que o custo do trigo precisa ser comparado com o custo da cobertura de inverno, somado a possibilidade de obter renda com a possível venda dos grãos.

O pesquisador frisa a importância de ser implantada uma metodologia que diferencie o fluxo de caixa e a gestão, para compreender que a cultura pode ser boa opção financeira para a propriedade:  “não podemos sobrecarregar o trigo com os custos fixos. Mesmo o investimento em nutrientes e controle de pragas realizado no inverno também deve estar contabilizado na soja”.  

Cláudio Kapp Júnior lembra, ainda, que é preciso avaliar o sistema agronomicamente e não apenas financeiramente: “precisamos de sustentabilidade a longo prazo, mesmo que num determinado ano o resultado financeiro do trigo seja negativo”. 

Perspectivas do Trigo: passado, presente e futuro

O diretor da Biotrigo Genética, Ottoni Rosa Filho, abordou as novas tecnologias para o trigo na abertura do painel "Perspectivas do Trigo: passado, presente e futuro". Segundo ele, novas tecnologias são comuns em milho e soja. Para trigo, o tema é visto de forma bastante diferente. Ele detalhou algumas tecnologias que estão mais próximas do triticultor, como HB4, Clearfield e Heathsense. “Estas tecnologias têm em comum dois componentes: propriedade intelectual e agregação de valor. No caso do trigo, o valor agregado pode ser tanto para o agricultor, quanto para o consumidor final do trigo”, disse.

O engenheiro agrônomo e consultor Sérgio Schneider, apresentou o cenário do trigo no Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Segundo ele, o trigo sempre foi uma cultura importante na região, fazendo parte do binômio trigo/soja. Hoje na grande maioria das regiões tritícolas do RS são cultivados menos de 20% da área disponível para a cultura, em função da instabilidade climática e da falta de políticas de preços e garantias de comercialização. Entretanto, ele enfatiza que, nas últimas décadas, a evolução na triticultura tem acontecido na pesquisa, através da busca de materiais genéticos mais produtivos e adequados ao mercado, bem como na evolução do manejo para altos rendimentos e assistência técnica levando as tecnologias até os produtores. “Por vários anos tínhamos a famosa receita dos 25 sacos por hectare (sc/ha), sendo que, hoje, bons produtores têm superado os 80 sacos com facilidade”, comentou.

O diretor da Lagoa Bonita Sementes, Auleeber Santos, apresentou o cenário da cultura em São Paulo. O cultivo do trigo no Estado é recente, crescendo a partir dos anos 2000. Desde então, ele ressalta a evolução significativa na área cultivada em função da pesquisa, disponibilizando cultivares adaptadas e maior potencial produtivo. “Grande parte do nosso produto final tem como destino mercados em São Paulo, o que viabiliza nossa logística e negociação. Por conta disso, o cenário é favorável”, diz Santos, acrescentando que o trigo é uma opção de cultivo que auxilia na diluição de custos e fluxo de caixa em um período em que os produtores têm limitadas opções de cultivo. “O trigo ajuda a distribuir os custos e ainda traz uma renda em um período (inverno) em que não teríamos receita. Temos que começar a tratar o trigo como ele merece e não como uma ovelha negra. Porque hoje o produtor coloca 50% do custo no trigo, mas os benefícios proporcionados pelo cereal não são levados em conta.  A produtividade de 17% a mais que a soja produz na área que anteriormente foi ocupada pelo cereal, não é colocada na conta pelo agricultor”, finalizou.

Os experimentos com a cultura do trigo no Cerrado tiveram início na década de 70, mas começaram a ganhar força a partir dos anos 2010/2011. Atualmente, a cultura ocupa cerca de 150 mil hectares nos estados de Minas Gerais, Goiás, Bahia e Distrito Federal. O surgimento de variedades adaptadas às condições do Cerrado e com tolerância à brusone foram os principais avanços nas últimas décadas, destacou o presidente da Associação dos Triticultores do Estado de Minas Gerais (Atriemg), Eduardo Elias Abrahim. Na região, o aumento da produção de trigo proporcionou um impacto muito grande na competitividade dos moinhos instalados, com crescimento da moagem e a consequente oferta de empregos em toda cadeia tritícola. Para Abrahim, a expectativa é de aumento expressivo de área nos próximos anos, bem como a expansão da cultura no país, em função da qualidade do produto e pela quase ausência de micotoxinas. Ele destaca que entre as vantagens da produção está a rotação de culturas, redução de doenças, melhoria do perfil do solo, entre outros.

O engenheiro agrônomo Lucas Simas, chefe de Departamento da Fazenda Experimental da cooperativa Coamo, apresentou o cenário do cereal no Paraná e Mato Grosso do Sul e ressaltou que o potencial produtivo do trigo não depende apenas das condições climáticas, mas também da tecnologia empregada na cultura. Simas cita como exemplo o ano de 2016, safra em que a cooperativa tem como referência de potencial, quando 18% dos cooperados obtiveram produtividade superior a 65 sc/ha e 6% atingiram produtividade superior a 74 sc/ha. “Isso mostra que o potencial evoluiu bastante e compete a nós, da assistência técnica, e aos produtores buscar potenciais produtivos dessa magnitude”, destaca.

Com relação à rentabilidade, comparando com outros cereais de inverno, Simas explica que o trigo torna-se viável com o passar dos anos, pois o cultivo do cereal está atrelado à fertilização. Segundo ele, a distribuição de fertilizantes é muito maior e mais efetiva em lavouras de trigo, pelo fato de ser cultivado com espaçamento reduzido de 17 cm entre uma linha e outra, sendo muito positivo quando comparado com o espaçamento a soja que é entre 45 a 50 cm e do milho, entre 50 a 60 cm. Além disso, o volume de cobertura de solo que o plantio do trigo proporciona é muito superior do que o milho segunda safra plantado neste período na região. Sem contar que o trigo é uma cultura que pode ser trabalhada sem aplicação do glifosato. “Com uma cobertura do solo mais eficiente, temos menor incidência de plantas daninhas e um custo menor de dessecação para a cultura principal que é a soja. Comparando com o milho segunda safra, a dessecação com o trigo custa cerca de 10 vezes menos”, comentou.

Legislação torna mais rígidos limites da micotoxina no trigo

O Sul do Brasil concentra 90% da produção nacional de trigo e nessa região a principal doença é a giberela, causada por espécies do fungo Fusarium graminearum, que ocorre especialmente em anos com frequentes períodos de chuva durante o estádio de florescimento/espigamento. Ao colonizar os grãos de trigo, esse fungo produz, principalmente, a micotoxina desoxinivalenol (DON), que representa risco para a saúde das pessoas e dos animais, sendo objeto de legislação específica para limites máximos de tolerância nos alimentos.

O manejo da giberela do trigo no campo, foi abordado pelo fitopatologista da Biotrigo Genética, Paulo Kuhnem. Pela nova legislação de limites máximos toleráveis de DON nos grãos e farinhas terem ficado mais rígidos a partir de janeiro de 2019 ele enfatizou que o manejo para a adequação destes níveis de DON começa no campo pela utilização de cultivares com maior nível de resistência genética associado a aplicação de fungicidas. “Por não se dispor ainda de cultivares imunes é muito importante que os produtores e assistência técnica estejam monitorando o desenvolvimento da cultura e as condições climáticas para realizar aplicações de fungicidas no florescimento e reduzir os teores de micotoxinas nos grãos colhidos”, disse.

A pesquisadora da Embrapa Trigo, Casiane Salete Tibola abordou as estratégicas para minimizar a contaminação do trigo por micotoxinas. Ela destacou a importância de medidas pós-colheita para minimizar a contaminação do trigo e derivados, visando contribuir para a produção de alimentos seguros e garantir liquidez no mercado.

A especialista em engenharia de alimentos e supervisora de qualidade industrial da Biotrigo, Kênia Meneguzzi, tratou sobre as possibilidades de redução de DON na pré-moagem e abordou uma visão geral do problema. Segundo Kênia, a nova legislação que entrou em vigor em 1º de janeiro deste ano, baixou para 750ppb o limite de DON para farinha de trigo. Ela destacou que os elos da cadeia devem utilizar todas as ferramentas que dispõem para atingir esses novos limites e ter uma melhor comercialização dos lotes.  “O produtor possui opções de cultivares mais resistentes à giberela e ainda tem como ferramenta o manejo da lavoura. Os cerealistas podem ser eficientes no recebimento através da pré-limpeza, com mesa de gravidade e com o cuidado o armazenamento dos grãos. Já os moinhos possuem equipamentos mais específicos, como a selecionadora ótica, que através de infra-vermelho detecta e descarta os grãos contaminados e as impurezas, além do peeling - equipamento que remove a camada mais externa do grão aonde se concentrados os maiores níveis de bactérias, micotoxinas e agrotóxicos”, destacou.

Mosaico do trigo

O pesquisador da Embrapa Trigo, Douglas Lau, palestrou sobre as principais viroses que impactam na produção de trigo no Brasil e destacou a mais recente pesquisa que resultou na descoberta de um novo vírus causador do mosaico do trigo, chamado WhSMV (Wheat stripe mosaic virus). Esta doença, também presente em vários lugares do mundo, provoca prejuízos de nada menos de 50% da produtividade da lavoura do cereal de inverno. “Até há pouco tempo, acreditava-se que o Mosaico do trigo era provocado somente por dois vírus: SBWMV (Soil-borne wheat mosaic virus) e WSSMV (Wheat spindle streak virus). Por isso a descoberta foi tão importante: identificar que há mais agentes causadores da doença reforça a importância do direcionamento da pesquisa em busca de novas tecnologias, de cultivares resistentes, além de alternativas químicas e culturais para o manejo”, explicou. 

Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo 

O Fórum Nacional do Trigo e a RCBPTT são eventos promovidos anualmente pela Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale para estabelecer estratégias de cultivo para o trigo e triticale em todo o Brasil. A entidade é formada por instituições de pesquisa e de apoio comprometidas com a produção de ações de pesquisa, difusão de tecnologia e desenvolvimento da cadeia de trigo e triticale. Nesta edição, a promoção dos eventos ficou a cargo da Biotrigo Genética, com apoio da Embrapa Trigo, ambas de Passo Fundo (RS), além dos patrocínios das empresas Basf, Syngenta, Bayer, Coamo, Granotec, Agrária, Apasem e FMC.

 

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