Plano Recupera Rural RS encerra ações de 2025
Comunidade planeja ações para 2026 após impactos das enchentes na região
Foto: Divulgação
A comunidade de Arroio do Ouro, em Estrela/RS, recebeu no dia 2 de dezembro o evento que marcou o encerramento das ações do Plano Recupera Rural RS em 2025 na região e definiu, de forma coletiva, os rumos para o próximo ano. A “Oficina de Planejamento Participativo 2026” reuniu 81 participantes, entre agricultores, lideranças locais e representantes de instituições públicas, entre elas: Emater, Prefeitura Municipal de Estrela, Secretaria de Qualidade Ambiental de Estrela, Instituto Retomada RS, Univates, Associação de Moradores de Arroio do Ouro, Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Estrela, Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Sicredi, Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do Rio Grande do Sul (SEMA-RS) e Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). O encontro foi motivado pelo cenário ainda sensível na região, fortemente impactada pelas enchentes de novembro de 2023 e maio de 2024 e pelas ações implementadas pelo Recupera RS ao longo do ano.
Abertura e balanço das ações de 2025
A programação teve início às 8h, com a formação da mesa de autoridades, que contou com a presença da prefeita de Estrela, Carine Schwingel; do chefe-geral da Embrapa Clima Temperado, Leonardo Dutra; do representante da Secretaria de Meio Ambiente e Infraestrutura do Estado, Valmir Zanatta; o chefe do escritório da Emater/RS-Ascar de Estrela, Álvaro Trierweiler; da representante do Instituto Retomada, Virgínia Pies; do presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Rogério Heemann; da representante do Sicredi, Neiva Huwe; e do produtor rural Fernando Mallmann. Todas as lideranças presentes ressaltaram a relevância da iniciativa e reforçaram o compromisso coletivo em apoiar a reconstrução das famílias, especialmente aquelas que tiveram suas propriedades e rotinas profundamente afetadas pelos desastres climáticos. O chefe-geral da Embrapa Clima Temperado, Leonardo Dutra, reforçou a importância da escuta das famílias e do fortalecimento da resiliência produtiva:
“Estamos em uma comunidade que sofreu muito. Hoje, depois de um ano de trabalho dentro do Plano Recupera Rural RS, estamos apresentando para as famílias as ações executadas até aqui. Nosso objetivo é não apenas apoiar a recuperação imediata, mas fortalecer a resiliência dos sistemas produtivos diante das mudanças climáticas que já estão em curso, de forma participativa, ouvindo a comunidade para poder avançar.”
Após os pronunciamentos, equipes da Embrapa, que integram a Plataforma Colaborativa Sul, responsável pela execução do Plano Recupera Rural RS, e Emater, apresentaram as ações desenvolvidas em 2025 na localidade, envolvendo manejo do solo, restauração ambiental, qualidade da água e adaptações produtivas realizadas em parceria com agricultores atingidos.
O coordenador do Plano Recupera Rural RS, Ernestino Guarino, destacou que o evento foi um espaço essencial de devolutivas e escuta: “Estamos trazendo para a comunidade resultados concretos de 2025, como práticas de manejo conservacionista do solo, orientações que ajudam o agricultor a garantir maior infiltração da água da chuva, ações de restauração das margens do rio com sistemas agroflorestais e estudos sobre a qualidade da água dos poços profundos. São iniciativas construídas com parceiros como a Emater, Fiocruz e secretarias de Meio Ambiente.” Sobre os desafios ainda presentes, Guarino reforçou:
“Os resultados são positivos, mas ainda há muitos desafios, especialmente nas áreas onde houve deposição de areia e na recuperação produtiva das margens do rio. Esses desafios exigem continuidade da pesquisa e, principalmente, o protagonismo dos agricultores para que possamos avançar na adaptação às mudanças climáticas".
Comunidade participa do planejamento para 2026
Os participantes foram divididos entre grupos de agricultores e grupos institucionais para dar início a dinâmica participativa. Cada grupo trabalhou com base em perguntas norteadoras que orientaram a construção dos resultados: no grupo das instituições, a reflexão partiu da questão “Quais capacidades, recursos e competências cada instituição pode mobilizar para fortalecer a comunidade e ampliar sua resiliência diante de eventos climáticos extremos?” Já os agricultores foram convidados a responder “Quais os desafios e prioridades a comunidade identifica para fortalecer sua recuperação e resiliência, e que tipos de apoio seriam mais úteis das instituições presentes?”
A partir dessas discussões, foram formadas “nuvens de palavras” que sintetizaram as percepções coletivas e serviram como base para organizar demandas em eixos temáticos. Eloi Wermann, produtor rural de Arroio do Ouro, que perdeu toda a sua produção leiteira na catástrofe e participou do evento, fez um relato sobre a sua situação atual: “Os animais foram todos embora. De 140 animais, sobraram só 11 vivos. Destruiu a ordenhadeira, não teve nada inteiro. Foram 40 anos investindo na propriedade, na área do leite. Em questão de 10 horas, não tinha mais nada.” Ao refletir sobre os caminhos para reconstrução, Eloi destacou aquilo que considera essencial: “Acho que a partir de agora o principal para a gente poder se reerguer é que as nossas dívidas sejam cobradas de forma mais acessível. Que a gente consiga empréstimos com juros baixos ou que tenha programas do governo que façam com que a gente consiga retomar a atividade de forma fácil e integrada. Outra coisa primordial é que as estradas de terra continuem sendo bem mantidas.” Para Pedro Coletti, também agricultor da localidade, é fundamental que a presença dos órgãos públicos permaneça na comunidade. “Para nós, aqui da comunidade, é muito importante que os órgãos públicos continuem presentes. Esse tipo de ação que estamos vivendo hoje — as visitas técnicas nas propriedades, as pesquisas para melhorar a infiltração da água no solo — precisa seguir por mais tempo. Mesmo quando a catástrofe do ano passado deixar de ser assunto recente, a gente ainda vai precisar desse acompanhamento de perto por muito tempo”.
Escuta ativa fortalece vínculo entre comunidade e poder público
O vice-prefeito de Estrela, Márcio Mallmann, destacou a importância da dinâmica participativa e da aproximação entre instituições e agricultores. Para ele, a iniciativa representa um marco para o município: “Nós ficamos muito felizes e nos sentimos acolhidos pela Embrapa e pelas instituições quando vêm até aqui e prestam esse auxílio, não apenas técnico, mas de escuta. Isso faz diferença para pensarmos o futuro de forma assertiva. Quando as demandas partem da comunidade, elas tendem a dar certo.” Mallmann recordou ações anteriores de apoio emocional e organizativo após a enchente, reforçando o papel da escuta comunitária. Ele também refletiu sobre a importância de manter a conexão entre agricultores e poder público: “Muitas vezes as pessoas, aqui, têm dificuldade de pedir ajuda, porque sempre foram aquelas que ajudavam a construir a igreja, a escola, a comunidade. Agora precisam ser ajudadas, e isso é um exercício. Quando a gente escuta, esse processo fica mais fácil. No que o município puder ser parceiro, estaremos juntos com a Embrapa e demais órgãos.” O biólogo Rafael Meneghini, servidor da Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Estrela, reforçou a importância da atuação conjunta das instituições: “Sou funcionário público municipal há mais de 16 anos e nunca tivemos a presença tão forte de instituições importantes como a Embrapa a Fiocruz. Consideramos de altíssima relevância este evento para a comunidade e para a nossa cidade. Ter acesso à tecnologia e ao corpo técnico especializado da Embrapa para restabelecer a atividade rural, aliado à recuperação ambiental e ao entendimento das pessoas, é tudo o que o município necessita neste momento. Esperamos, em breve, colher frutos para podermos replicar essas ideias em toda a bacia do rio Taquari.”
Dinâmica define ações e responsabilidades
A segunda parte das atividades começaram após o almoço, a dinâmica “Rio do Tempo” transformou as demandas levantadas em um cronograma coletivo de ações para 2026. Cada iniciativa foi representada por barcos de papel conduzidos por instituições “capitãs”, com participação de demais entidades e moradores como “tripulantes”. O processo colaborativo permitiu visualizar o fluxo das ações ao longo do ano, fortalecendo o compromisso conjunto entre comunidade e instituições parceiras.
O encontro resultou na proposição de seis ações principais para o próximo ano, elaboradas com base nas demandas levantadas pelos sete grupos de agricultores e pelas instituições parceiras. Entre os encaminhamentos, destacaram-se:
• Crédito rural e flexibilização das dívidas adquiridas pelos produtores, após a enchente;
• Manutenção constante das estradas rurais do município e recolhimento dos entulhos acumulados em algumas vias, após a catástrofe na região;
• Fortalecimento da Unidade de Aprendizagem Coletiva (UAC) Arroio do Ouro;
• Implantação e ampliação de Unidades de Referência Tecnológica (URTs);
• Continuidade das ações de restauração produtiva e ambiental;
• Apoio articulado entre instituições para fortalecimento da resiliência local.
Encerrada às 17h, a oficina reafirmou o compromisso conjunto de reconstrução sustentável no Vale do Taquari. Com o planejamento construído de forma participativa, 2026 inicia com agenda integrada entre a comunidade e instituições, fortalecendo capacidades locais e ampliando a preparação para futuros eventos climáticos extremos. O Plano Recupera Rural RS integra a Plataforma Colaborativa Sul para Mitigação de Efeitos Climáticos Adversos na Agropecuária, uma iniciativa da do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) em parceria com a Embrapa. Todas as ações aqui apresentadas visam construir resiliência e adaptação às mudanças climáticas para um futuro mais seguro e sustentável.