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Arroz sem sal (Marketing da Terra)


Richard Jakubaszko

 

Arroz sem sal? Ou seria muito salgado? É a dúvida que está na cabeça e na ponta da língua de muitos orizicultores a propósito da campanha de incentivo ao consumo de arroz deflagrada pelo Instituto Rio-Grandense do Arroz (Irga), ao final de 2005. Será estimulado o consumo de arroz brasileiro e também do arroz importado do Uruguai e Argentina, cujos preços finais são mais baratos aos importadores. No primeiro trimestre de 2006, segundo o Ministério da Agricultura, importamos US$ 39 milhões de nossos parceiros no Mercosul. Os estoques de arroz nunca estiveram tão altos. Os preços recebidos pelos produtores brasileiros, nos últimos dois anos, já saíram da escala de desestimulantes e batem no prejuízo. Dessa forma, o único marketing que se percebe coerente nesse baile dos insensatos é o do governo federal que, via liberalização das importações, mantém os preços da cesta básica dentro de limites suportáveis para que esta não estimule a inflação. Os governos estaduais praticam guerra fiscal, esse sim, um baile de malucos.

Acreditamos que é tempo – e urgente – de impor cotas nas importações de arroz, pelo menos enquanto os estoques estiverem altos. Recorde-se que, quando os nossos eletrodomésticos incomodaram os parceiros do Mercosul, houve gritaria, e com certa razão. Ao mesmo tempo necessitamos fazer marketing para estimular demanda e aumentar o consumo per cápita do brasileiro, que é baixo quando comparado a países da Ásia (de 50 a 80 kg/ano), e que caiu, em períodos recentes, de 42 para 35 kg/ano. Consumimos, entretanto, cinco a sete vezes mais que a média de países ricos, que fica entre 5 a 10 kg/ano, o que caracteriza o arroz, cada vez mais, como alimento de populações pobres.

Nessa ótica, a campanha do Irga é meritória, e torna-se uma das primeiras no agronegócio, assim como as iniciativas "Coma carne", do Pró-carne, da maçã em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, e do leite em Goiás, e deveria ser repetida por produtores de outros frutos da terra. Esse é um dos temas que a DBO Agrotecnologia abraçou desde sua edição inaugural, há dois anos, e vemos, de forma gratificante, essa idéia tomar corpo em termos práticos. É possível e viável agregar valor aos produtos da terra usando-se de forma inteligente o marketing e suas ferramentas, entre elas a propaganda.

A iniciativa do Irga, todavia, mostra características que poderiam ser melhoradas. Duas questões chamaram a atenção: no aspecto mais importante está o bairrismo gaúcho, notório nas mensagens de publicidade, fato percebido inclusive pelos patrocinadores, que instituíram dois slogans em adesivos, sendo "Arroz tem que ser gaúcho", para uso interno no Estado, e "Arroz RS", aparentemente para uso em publicações nacionais. Acreditamos que faltou união entre os produtores gaúchos de arroz e os do Brasil Central. Se estes participassem da campanha, com certeza somariam forças para a conquista do aumento do consumo do arroz e reforçariam a verba publicitária. A exposição da campanha ao grande público teria maior visibilidade. Não sabemos, todavia, se os produtores do Brasil Central foram convidados. Nota-se no material publicitário a presença política do governo do Estado do Rio Grande do Sul, como único patrocinador da campanha, por meio do Irga. Em ano eleitoral até isso acontece...

Nos anúncios, o maior diferencial mercadológico do arroz não foi abordado, que é seu uso criativo na culinária, seja como alimento principal ou como complemento de outros pratos. O uso como complemento o brasileiro já faz, e nesse sentido o arroz é insubstituível. Mostrar arroz branco em fotos nos anúncios, porém, ocupando metade dos pratos, não estimula o apetit appeal do alimento. Alimento vende-se sozinho desde que estimule o apetit appeal, seja no prato colocado na mesa ou em anúncios, pois "comemos" primeiro com os olhos.

Por que não se mostrou um arroz à grega, com pimentão verde e vermelho, uvas passas? Ou por que não se mostrou um risoto todo enfeitado e "pilchado" como prato único e principal? Ou um "arroz a carreteiro", ou a quatro queijos bem gratinado, ou o "arroz de puta", conhecido por todos no Sul, pela facilidade e rapidez no preparo, e muito saboroso? E arroz doce como sobremesa, abrilhantado por canela.

Aos gaúchos faltou criatividade nessa campanha. Criatividade e versatilidade que não faltam ao arroz branco, que vira bolinho no dia seguinte. Faltou ainda mostrar usos alternativos e rápidos do arroz para a dona-de-casa que trabalha fora, pois essa é uma das razões da queda do consumo. A campanha deve aumentar o consumo per cápita de arroz, mas poderia aumentar mais, talvez o suficiente para reduzir os estoques.

Por conta da iniciativa, aplausos aos gaúchos, mas poderia ser melhor.

 

Este artigo foi publicado na revista DBO Agrotecnologia, edição nº 7 maio/junho 2006. E está disponível em PDF no site www.dboagrotecnologia.com.br A assinatura da revista é gratuita para agricultores, agrônomos e técnicos, e pode ser solicitada no mesmo site.

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