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BAIÃO DE DOIS


Paulo Lot Calixto Lemos

Entre as décadas de 40 e 80 vivemos a era da inteligência lógica-pragmatica, sob a batuta do famoso teste de QI (coeficiente de inteligência), que pretendia medir o “tamanho” da inteligência de uma pessoa. A era do QI passou, nos anos 90 apareceu o cientista e escritor Daniel Goleman, com o seu QE, coeficiente emocional, pois segundo ele a inteligência esta ligada à forma como negociamos nossas emoções, que apenas um alto QI não é garantia para tornar as pessoas mais bem sucedidas ou mais felizes. Agora, no século XXI, já ouvimos falar que além de emocionalmente equilibradas, as pessoas precisam ter, para obterem sucesso e felicidade, uma boa dose de intuição. Parece que estamos prestes a entrar na era da Intuição, que consiste na percepção direta da realidade, sem a interferência de conceitos pré-estabelecidos ou das limitações da lógica. Uma espécie de “sexto sentido”.

São inúmeros os casos que comprovam isso, de pessoas quase sem escolaridade, cujos conhecimentos científicos, históricos ou geográficos estão restritos aos limites de seus interesses, mas que se dão bem na vida, tornando-se pessoas bem sucedidas, lideres natos ou políticos famosos, que se viram bem em qualquer lugar ou em qualquer situação. Haja vista o nosso atual presidente da republica. Aqui em Passos existiu um deles: o senhor José Lourenço de Andrade, conhecido de todos por Zé Lourenço.

Zé Lourenço nasceu e foi criado na roça, praticamente sem estudo, mas tornou-se uma das figuras mais importantes do meio econômico e político de seu tempo. Enérgico, sem papas na língua, porem um homem justo e muito bem quisto em sua terra. Era o proprietário de uma das maiores fazendas de terra de cultura do município – a fazenda Boqueirão, onde criava gado e cultivava toda sorte de plantação. Alem de bem sucedido, Zé Lourenço era uma pessoa alegre e extrovertida. Um apreciador fanático do “mestre lua” – o mestre cancioneiro Luis Gonzaga. Sua admiração era tanta, que a musica Baião de Dois tornou-se sua marca registrada, pois mandava imprimir “de fábrica”, em todas as suas camionetes, a inscrição: B 2.

Como era costume na época, os fazendeiros utilizavam os caminhões leiteiros para encomendar que trouxessem da cidade o que precisassem, desde ferramentas, insumos agrícolas até miudezas em geral. Assim, certa ocasião Zé Lourenço encomendou ao seu leiteiro que passasse na loja da cooperativa e lhe trouxesse 20 sacos de sal. Para tanto escreveu, assinou e lhe entregou a necessária requisição de compra.

Lirácio, o leiteiro, logo após a entrega do leite, se dirigiu à loja da cooperativa. Apresentou a requisição do Zé Lourenço, e pediu que enquanto bebia um cafezinho, que carregassem o caminhão.

No outro dia, madrugada ainda alta, partiu para fazer sua linha. Na fazenda Boqueirão, enquanto aguardava o termino da ordenha, descarregou a encomenda do Zé Lourenço no local de praxe.

Terminada a descarga, Zé Lourenço apareceu para conferir seu pedido. Porém ao checar verificou que em vez de 20 sacos de sal o leiteiro havia trazido 20 sacos de cal. Pra que...

- Mais num é possível! Como é que me mandam cal ao invés de sal! Como é que ocê me explica isso Lirácio?

- Uai sô Zé, eu só entreguei a requisição pro pessoal da loja e enquanto tomava um café eles carregaram o caminhão... Pra mim tava tudo nos conforme!

- Mas que povo desmazelado! Fica lá aquele bando trombando uns nos outros e ninguém faz nada direito! Hoje mesmo eu vou lá reclamar pessoalmente com o presidente. Onde já se viu! Só falta essa gente achar que boi meu lambe cal no lugar de sal!

Dito e feito, à tarde, bem trajado, Zé Lourenço adentra a sala do então presidente da cooperativa:

- Boa tarde seo Zé Lourenço, a que lhe devo a honra da visita?

- É o seguinte presidente, pra resolver logo a questão eu vim falar direto com o dono dos porcos, porque da porcada eu já tô cansado...

- Tá mais do que certo Zé Lourenço, no que eu puder lhe ser útil...

- Ontem, eu mesmo escrevi a tal de requisição pro Lirácio apanhar 20 sacos de sal aqui, e não é que me carregaram o caminhão com 20 sacos de cal! Meu gado tá sem sal! E esse leva e trás fica caro! Vim aqui porque quero uma solução pra isso, uai!

- Realmente, parece que o acontecido foi um erro grosseiro sô Zé. Mas pode ter certeza de que a entrega do sal será por conta da cooperativa, só que pra isso precisamos ter em mãos a sua requisição...

Falando isso apertou o interfone e ordenou a secretaria que localizasse o mais rápido possível a requisição do que foi entregue ao senhor José Lourenço na tarde anterior. Passados poucos minutos ela retorna com a esperada requisição...

O presidente, compenetrado, lê o que está escrito no papel, lê de novo e pergunta ao Zé Lourenço.

- Foi o senhor mesmo que escreveu o pedido sô Zé?

- Foi uai! Porque?

- Então veja o senhor mesmo - disse isso lhe passando o papel – o senhor se enganou sô Zé. Escreveu CAL e não SAL!

- Uai, é mesmo! Como é que eu fui esquecê de botá o danado do C-cedilha sô!

Paulo Lot Calixto Lemos

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