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POUCA COBRA PRA MUITO SUSTO


Paulo Lot Calixto Lemos

Talvez não tanto como antigamente, mas nossa região sempre foi infestada por muitas espécies de cobras, especialmente a feiosa Cascavel cujo veneno já vitimou muita gente por essas bandas; a bela Muçurana, de cor preta, lisa e brilhante, extremamente agressiva e esperta, mas que apesar de não ser venenosa, e seu cardápio ser composto preferencialmente por cobras venenosas, é hoje uma raridade, pois sempre foi, erroneamente, muito perseguida; outra muito comum em nossa região é a Jibóia, esta pode chegar a medir 3 metros de comprimento e atingir um diâmetro de até 30 centímetros. A Jibóia tem uma particularidade especial: possui todas as características externas de uma espécie venenosa, possui o veneno em suas glândulas, porém não possui presas capazes de inocula-lo na vitima, assim torna-se praticamente inofensiva, consegue seu alimento, composto por pequenos animais como ratos, coelhos e preás, abocanhado-os e matando-os por estrangulamento. Enfim, a Jibóia seria uma mini-sucurí.

Tatão Lemos, fazendeiro pecuarista e agricultor, sempre foi um admirador e estudioso de tais répteis, porém não se bastava apenas com os livros a respeito do assunto, foi também um exímio pegador desses asquerosos animais. As cobras não venenosas, ele pegava, examinava cada particularidade e depois as soltava. As venenosas como a cascavel, ele as enviava para o Butantã em São Paulo e recebia em troca frascos e mais frascos de soro antiofídico. Para isso, o instituto lhe mandava periodicamente caixas apropriadas para que as cobras fossem acomodadas, lacradas, e então enviadas através da linha de ferro da Mogiana, até o Butantã.

Esta sua faceta o deixou bastante conhecido e requisitado quando o assunto era cobra ou picada de cobra, pois sempre colocou à disposição de quem necessitasse, o soro que recebia, e o seu dom de “encantador de serpentes”.

Como quase todo fazendeiro, Tatão era também um “gozador”, gostava de exibir suas “amigas” principalmente quando o publico era composto por gente medrosa. Assim, num belo dia, quando voltava da fazenda em seu caminhãozinho Chevrolet-51, na altura das terras do Dr. Maninho, vê uma bruta Jibóia atravessando a estrada, sem pestanejar freou imediatamente o caminhão, e apeou já pensando em exibi-la no café dos fazendeiros logo que chegasse. Assim, depois de alguma labuta, domou a bichona, que devia medir mais de 2 metros, e a jogou na carroceria do caminhão pensando ser impossível que ela saísse dali, principalmente devido as bacadas da estrada. Chegando ao café, verificou que infelizmente a cobra, não se sabe como, conseguiu fugir...

Desolado, porém admirado, foi então pra oficina mecânica do Zé Valim, então o mecânico de 9 entre cada 10 fazendeiros:

- Boa tarde Zé Valim. Dê uma olhada no freio desse caminhão pra mim, que ele tá falhando.

- Vai ser coisa à toa Tatão, deve de sê o hidro-vácuo do freio, num minutinho eu troco ele pro cê...

Foi falando isso e entrando, deitado de costas, debaixo do caminhão. Não se passou nem 30 segundos quando Zé Valim, coitado, urrando que nem um bicho, esperneando que nem um louco, batendo com a cabeça pra todo lado na carroceria, tentava sair o mais rápido possível debaixo daquele inferno... Até que saiu, esbaforido, mais branco que farda de médico, esfolado pra tudo quanto era lado, e com toda razão xingando e falando:

- Num entro debaixo desse caminhão por dinheiro nenhum desse mundo! Cruz credo, que bicho feio!

Já imaginando o que havia acontecido, Tatão fez como quem não sabia de nada, e perguntou no momento em que os outros mecânicos e clientes correram para saber o que se passava:

- Que é que aconteceu Zé Valim? Por acaso tem assombração debaixo desse caminhão?

- Antes fosse! Mil vezes um capeta com dois par de chifre do que esse lasca jararacuçú que tá ai debaixo! A sorte que eu fui esperto e ele num me mordeu, mas Deus me livre da soprada que ele deu na minha cara!

É... Mas a historia não termina ai não. Já escurecia quando Tatão desceu e estacionou em frente a sua casa. Morava na época no sobrado do antigo armazém Triunfal do “brimo” Bacil. Em frente, do outro lado da rua, havia outro armazém, este do Chafik Calixto, também libanês, casado com dona Mariinha. Pois bem, na manhã seguinte, antes de voltar pra fazenda, Tatão confirmou o que já esperava, que dessa vez a Jibóia fugiu mesmo. Sabendo tratar-se de uma cobra inofensiva e imaginando que à noite ela devia ter decido pro córrego da barrinha, pois umidade atrai esse tipo de bicho, foi pra roça e esqueceu o assunto.

À tarde, ao regressar da fazenda, sua mulher Regina, que sabia de toda historia, vem lhe falar:

- Êh Tatão, por culpa sua quase morri de vergonha hoje quando fui comprar algumas coisinhas no armazém do sô Chafik! Assim que entrei, ele veio assustado me contar:

E conta tentando imitar o sotaque libanês de seu primo Chafik:

- Rigina, Rigina! Hoje Mariinha quase moreu de susto, quando vai cuida seu plantaçon, um bruta cobrom, enrolado no meio dos pé de couve quase come a coitadinha... De onde será veio esse bruta cobrom Rigina?

Paulo Lot calixto Lemos

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