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Mitos e verdades sobre lagartas do gênero Spodoptera na soja


Amélio Dall’Agnol

As lagartas são velhas inimigas do sojicultor e sempre foram motivo de grande atenção no Manejo Integrado de Pragas (MIP-Soja). Entretanto, cerca de 74% da soja cultivada no país na safra 2019/2020 foi de intacta RR2 Ipro, com percentuais variando desde 60% no Rio Grande do Sul, até 92% no Piauí. Essa soja com tecnologia Bt, única disponível aos produtores para cultivo comercial até o presente momento, expressa a proteína Cry 1Ac, que controla as principais espécies de lagartas. No entanto, as espécies do complexo Spodoptera não são controladas, fazendo-se necessário esclarecer alguns mitos e verdades a respeito desta praga em soja.

Na soja, as espécies mais comuns de Spodopera são Spodoptera eridania e Spodoptera cosmioides. Entretanto, nas últimas safras, Spodoptera frugiperda, também conhecida como lagarta-do-cartucho-do-milho, também vêm ocorrendo com muita frequência. É importante salientar que trabalhos em andamento na ESALQ/USP indicam que a densidade e a ocorrência de lagartas Spodoptera spp /m de linha de soja, é a mesma em lavouras nas diferentes regiões do Brasil, sem diferença estatística entre os períodos pré e pós-intacta. Entretanto, a redução de área cultivada com milho 1ª safra (principal hospedeiro da praga) e aumento na 2ª safra (safrinha), além de promover a evolução da resistência das lagartas Spodoptera spp. ao milho Bt, podem ser fatores relevantes para a maior frequência de ocorrência da praga em soja.

Além disso, antes da adoção da soja Bt, aplicações de inseticidas feitas para controlar a lagarta-da-soja e a lagarta-falsa-medideira podiam, possivelmente, exercer algum controle sobre Spodoptera spp na soja. Em virtude dessas alterações no ambiente, essa lagarta tem sido verificada com mais frequência pelo sojicultor que, muitas vezes, temendo o seu potencial de dano, principalmente nas vagens e flores, acaba aplicando inseticidas em demasia para seu controle.

Resultados de uma tese de doutoramento conduzida em parceria entre a Universidade Estadual de Londrina (UEL) e a Embrapa Soja, com uma cultivar de soja de crescimento indeterminado, indicaram que, mesmo com 25% de vagens perfuradas pelo inseto no estádio R4, não houve redução significativa da produtividade, em parte devido à continuidade na emissão de vagens após a injúria. Além disso, ao avaliar o comportamento de S. eridania alimentando-se de soja, verificou-se que a praga é preferencialmente uma desfolhadora que, eventualmente, também danifica vagens. Os resultados obtidos na pesquisa indicaram que as folhas são o alimento principal da praga, propiciando desenvolvimento mais rápido e maior sobrevivência das lagartas em relação àquelas que tiveram vagens em sua dieta.

Por isto, é importante evitar certos “exageros” que veem sendo praticados pelos produtores, realizando pulverizações desnecessárias de inseticidas com populações da lagarta em quantidades abaixo do nível de ação. Para controle de Spodoptera spp. na soja, inseticidas devem ser apenas utilizados quando a população de lagartas (com tamanho maior ou igual a 1,5 cm) for igual ou superior a 10 lagartas por metro de fileira observados no monitoramento com o pano-de-batida.  Ainda, o controle da praga se justifica, quando for observado 30% ou mais de desfolha no estádio vegetativo da planta ou 15% de desfolha no estádio reprodutivo. Aplicações de inseticidas com populações abaixo desses níveis de ação devem ser evitadas, pois representam desperdício de dinheiro, sem retorno financeiro em produtividade.

Outro ponto importante a ser destacado é que novas tecnologias Bt, como Soja Intacta 2 Xtend e Soja Conkesta estão em fase final de desenvolvimento e deverão estar disponíveis no mercado brasileiro em curto espaço de tempo. Essas novas tecnologias, conhecidas como soja Bt de segunda geração, vem com estaqueamento de novos eventos transgênicos, permitindo a expressão de múltiplas proteínas, ante a expressão única de Cry 1Ac da soja Bt atual (de primeira geração). Esse estaqueamento de múltiplos eventos (piramidação) é muito importante para o manejo da resistência das pragas alvo da tecnologia e é essencial para prolongar sua eficiência e vida útil no campo.

É importante destacar que esta segunda geração de soja Bt foi desenvolvida como estratégia para controlar pragas já alvo da primeira geração de soja Bt, objetivando prolongar a vida útil da tecnologia através de um manejo de resistência mais eficiente. Sendo assim, a efetividade das novas tecnologias para o controle de S. frugiperda deverá ser baixa e não resultar em mudanças drásticas em relação ao atual cenário da soja Bt presente no mercado. Consequentemente, não deverá resultar em melhorias no controle dessa praga.

Entretanto, mesmo com essa baixa especificidade para espécies de Spodoptera, a adoção das novas tecnologias é importante para retardar a seleção de pragas-alvo resistentes e, assim, preservar a eficiência das proteínas Cry utilizadas. Dessa forma, é um grande desafio que a substituição do cultivo de soja Bt de primeira geração pelo de segunda geração ocorra rapidamente, antes que problemas de resistência às pragas alvo em campo sejam detectados para Cry 1Ac, o que também impactaria negativamente à soja Intacta 2 Xtend e Conkesta, que também utilizam Cry 1Ac em sua composição.

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