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Calagem - Características dos corretivos de acidez do solo

Entenda as principais características de um corretivo de acidez para fazer a melhor escolha na aquisição de um produto.



O pH (potencial hidrogeniônico) do solo é a medida do grau de acidez de uma solução e é definido pelo teor de íons H3O+ livres. Quanto menor o valor de pH, mais ácida é a solução, e quanto maior, mais básica. Diversos fatores interferem no pH do solo, como a composição, região, concentração de sais, adubação, metais, ácidos, bases e matéria orgânica. No Brasil, a maior parte dos solos são ácidos, o que significa que o pH do solo está abaixo de 7,0. O pH do solo interfere diretamente na disponibilidade dos nutrientes que estão no solo, e por isso o seu manejo é fundamental em um cultivo agrícola.

A correção do pH do solo, quando necessária, é feita através da calagem, adicionando-se calcário ao solo, que serve para diminuir a acidez neste ambiente. Abaixo, explicaremos as principais características a ser consideradas na escolha de um calcário. Recomendamos também a leitura do material "Aplicações" e "Critérios para a recomendação de calagem"

 

Natureza química

Caracteriza a quantidade necessária e tempo de reação para elevar o pH. Pode originar bases fracas (carbonatos e silicatos) com ação mais lenta ou bases fortes (hidróxido) com ação mais rápida e energética.

 

Poder de neutralização

Capacidade do corretivo em neutralizar. Depende do teor de neutralizantes e sua natureza química. É sempre expressa em relação ao CaCO3.
 

Tabela 1. Capacidade de neutralização de corretivos de acidez
Espécie neutralizante % ECaCO3 ou capacidade de neutralização
em relação ao CaCO3
CaCO3 1,00
MgCO3 1,19
CaO 1,79
MgO 2,48
Ca(OH)2 1,35
Mg(OH)2 1,72
CaSiO3 0,86
MgSiO3 1,00


Fonte: Alcarde & Rodella (2003)

 

Exemplo: 100 kg de CaO possuem ação equivalente a 179 kg de CaCO3

 

Teores de cálcio e magnésio

Estão na forma de CaO ou MgO (óxido de cálcio / óxido de magnésio) e ambos possuem capacidade de neutralização. Em outras formas, como sulfato por exemplo, não possuem esta capacidade. Não existe calcário sem cálcio ou magnésio. A ausência ou teor muito baixo destes elementos indica que o produto não corrige acidez. 

 

Granulometria

O tamanho do grânulo é uma característica muito importante, que irá determinar tanto a reatividade (efeito instantâneo) quanto o efeito residual (efeito posterior) de um calcário. Deve haver concordância entre poder de neutralização e granulometria. Quanto maior a área superficial específica (ou seja, quanto menor o tamanho do grânulo), maior o contato com a solução do solo e com o hidrogênio, aumentando a solubilidade e assim o efeito instantâneo do produto. A solubilidade depende também da moagem e da mistura do corretivo com o solo. 
A granulometria é classificada conforme às normas ABNT, seguindo a tabela abaixo:

 

Tabela 2. Reatividade das partículas de diferentes frações granulométricas dos corretivos.
Fração granulométrica: peneiras Reatividade (RE) %
ABNT nº mm
10 >2,00 0
10 - 20 2,00 - 0,84 20
20 - 50 0,84 - 0,30 60
50 <0,30 100

Fonte: Legislação brasileira: Instrução normativa n. 35 - 04/07/2006

Conforme citado anteriormente, quanto menor o tamanho do grânulo, mais instantâneo (maior a reatividade, explicada posteriormente) será seu efeito. Assim sendo:

  • Fração ABNT nº 10: equivalente a grânulos com diâmetro maior do que 2 mm não possuem efeito instantâneo e pouquíssimo efeito residual;
  • Fração ABNT nº 10 - 20: equivalente a grânulos com diâmetro entre 2 e 0,84 mm, possuem 20% do seu efeito reagindo em até 3 meses (reatividade), e o resto após este período (efeito residual);
  • Fração ABNT nº 20 - 50: equivalente a grânulos com diâmetro entre 0,84 e 0,3 mm, possuem 60% do seu efeito reagindo em até 3 meses (reatividade), e o resto após este período (efeito residual);
  • Fração ABNT nº 50: equivalente a grânulos com diâmetros menores do que 0,3 mm, possuem 100% do seu efeito reagindo em até 3 meses (reatividade), e nenhum efeito após este período.

Vale observar que quanto mais fino for o grânulo, mais difícil será a aplicação. Temos como exemplo o calcário filler, com granulometria menor que 0,3 mm, ultra fino, e possui uma reatividade de 100% em 3 meses, porém terá uma aplicação mais complexa. Temos como outro exemplo o calcário granulado, formado por grânulos maiores. Este produto serve apenas como nutriente, e não como corretivo de solo.

A legislação defende que o calcário, no teste de granulometria, deve passar no mínimo 95% do calcário pela peneira de 2mm, 70% na peneira de 0,84mm e no mínimo 50% na de 0,3mm.
Abaixo podemos observar a composição granulométrica de diferentes corretivos, e avaliar suas propriedades:

 

Tabela 3. Composição granulométrica de diferentes corretivos.
Corretivos Composição granulométrica (frações em %)
Peneiras (mm)
> 2,00 2,00 - 0,84 0,84 - 0,30 < 0,30 RE
A 100 0 0 0 0
B 33 0 0 67 67
C 5 25 20 50 67
D 16 0 0 84 84
E 0 10 20 70 84
F 0 0 0 100 100

 

Avaliando cada um dos calcários acima, podemos chegar às seguintes conclusões:

  • Calcário A) Não está dentro dos critérios da legislação. Com todas as partículas acima de 2 mm de diâmetro, teremos uma reatividade de 0%. Em alguns anos, as partículas terão algum efeito, mas de imediato para correção do solo em poucos meses, não terá qualquer efeito significativo.
  • Calcário B) Não está dentro dos critérios da legislação, pois 33% do produto não passou pela peneira de 2 mm (a legislação prevê 95%). Terá uma reatividade de 67%.
  • Calcário C) Está dentro dos limites da legislação. Porém, neste calcário, diferente do calcário B, teremos um efeito residual para neutralização posterior.
  • Calcário D) Não está dentro dos limites da legislação. Não terá efeito residual, tendo apenas um efeito instantâneo
  • Calcário E) Está dentro dos limites da legislação. Terá um efeito instantâneo pouco menor que o calcário D, porém, terá um efeito residual maior.
  • Calcário F) Está dentro dos limites da legislação. Terá todo seu efeito instantaneamente, sem qualquer efeito residual. É conhecido como calcário “Filler”. 

 

Reatividade

A reatividade (RE), relacionada com a granulometria, é a velocidade com que o corretivo corrige a acidez. Conforme o MAPA, é mensurada através da porcentagem do corretivo que reage no solo em até 3 meses. Quando temos um atraso na calagem, podemos optar por um calcário com granulometria fina e consequentemente maior reatividade, como por exemplo um calcário “filler”, de modo que o efeito ocorra rapidamente. Vale lembrar que produtos com granulometria fina exigem equipamentos e condições ambientais específicas para sua aplicação. 
O cálculo da reatividade é feito da seguinte forma:

%RE (corretivo) = F10-20 x 0,2 + F20-50 x 0,6 + F<50 x 1

Sendo F = fração do intervalo de grânulo conforme ABNT

Tabela 4. Reatividade das partículas de diferentes frações granulométricas dos corretivos.
Fração granulométrica: peneiras Reatividade (RE) %
ABNT nº mm
10 > 2,00 0
10 - 20 2,00 - 0,84 20
20 - 50 0,84 - 0,30 60
50 < 0,30 100

Fonte: Legislação brasileira: Instrução normativa n. 35 - 04/07/2006

 

Observe que o calcário possui diferentes valores de reatividade conforme o tamanho do grânulo. Grânulos maiores que 2 mm possuem uma reatividade extremamente lenta, por isso não são considerados no cálculo.
Para entendermos melhor o cálculo, podemos observar os 6 tipos diferentes de calcário na tabela abaixo. A partir da sua composição granulométrica, iremos calcular a reatividade de cada um.

Tabela 5. Composição granulométrica de diferentes corretivos
Corretivos Composição granulométrica (frações em %)
peneiras (mm)
> 2,00 2,00 - 0,84 0,84 - 0,30 < 0,30 RE
A 100 0 0 0 0
B 33 0 0 67 67
C 5 25 20 50 67
D 16 0 0 84 84
E 0 10 20 70 84
F 0 0 0 100 100

 

Conforme citado anteriormente, grânulos maiores que 2mm (fração ABNT nº 10) não fazem parte do cálculo de reatividade, pois sua ação é muito lenta. Assim temos:

%RE (corretivo) = F10-20 x 0,2 + F20-50 x 0,6 + F<50 x 1

%RE (corretivo A) = 0 x 0,2 + 0 x 0,6 + 0 x 1 = 0
%RE (corretivo B) = 0 x 0,2 + 0 x 0,6 + 67 x 1 = 67
%RE (corretivo C) = 25 x 0,2 + 20 x 0,6 + 50 x 1 = 67
%RE (corretivo D) = 0 x 0,2 + 0 x 0,6 + 84 x 1 = 84
%RE (corretivo E) = 10 x 0,2 + 20 x 0,6 + 70 x 1 = 84
%RE (corretivo F) = 0 x 0,2 + 0 x 0,6 + 100 x 1 = 100

 

Efeito residual

Já o efeito residual, antagônico à reatividade, diz respeito ao tempo de duração da correção da acidez. Como a reatividade é medida pela quantidade de calcário que irá reagir em 3 meses, o efeito residual consiste no calcário que irá reagir após este período. A dosagem deve ser maior se o efeito residual não durar tempo o suficiente. Em implantação de culturas perenes, pastagens e sistema plantio direto em solo ácido, necessitamos de maior efeito residual. Solos com alto poder tampão de hidrogênio necessitam de maior dose, bem como solos argilosos. 
Observe a tabela abaixo:

Tabela 6. Composição granulométrica de um corretivo qualquer.
Composição granulométrica (frações em %)
peneiras (mm)
> 2,00 2,00 - 0,84 0,84 - 0,30 < 0,30 RE
5 25 20 50 67

 

Em uma amostra de 100 gramas deste corretivo, temos 25 gramas de partículas dentro da fração 2 - 0,84mm. Sendo assim, conforme a fórmula de reatividade, teremos 5 gramas (20%) desta fração reagindo em até 3 meses, sobrando 20 gramas (80%) para reagir após os 3 meses (efeito residual). Ainda, neste mesmo calcário, considerando agora a fração 0,84 a 0,30 mm, onde temos 20 gramas de calcário dentro deste intervalo, teremos 12 gramas (60%) reagindo em até 3 meses, e 8 gramas (40%) reagindo após 3 meses (efeito residual).
Se fizermos uma análise de solo baseada em amostras coletadas durante o efeito residual de um corretivo, o diagnóstico pode ser errado pois parte do corretivo ainda está reagindo. Assim, uma nova aplicação de corretivo só deverá ser feita após este período com base em uma nova análise de solo.
Alguns agricultores, desconhecendo as informações acima ou pelo empolgamento de uma última aplicação com bons resultados, aplicam o corretivo em intervalos curtos, provocando o efeito de “supercalagam”, desequilibrando os nutrientes do solo e favorecendo o desenvolvimento de patógenos nocivos às plantas.

PRNT

O “poder relativo de neutralização total” (PRNT) expressa a eficiência de um corretivo, que depende de suas características químicas, expressas pelo “PN” e de suas características físicas, expressas pela “RE”. É um índice desenvolvido para ajustar a dose a ser aplicada, e não a eficiência do corretivo.

Por exemplo, se um corretivo tem PN = 90% e RE = 74,3%, seu PRNT será calculado da seguinte forma:

Quanto menor o PRNT de um calcário, maior a quantidade necessária para neutralizar a acidez, e assim devemos ajustar a dose, pois as recomendações são feitas considerando-se um produto com 100% de PRNT. Por exemplo, para uma recomendação de 3,0 t/ha, devemos usar do corretivo acima:

O valor de PRNT não é o único valor que devemos observar ao adquirir um calcário, pois este valor pode omitir algumas informações fundamentais para a decisão de compra do melhor produto. Observe a tabela abaixo:

 

Tabela 7. Interpretação do PRNT
Corretivos PN (ECaCo3) RE PRNT Ação do PN
3 meses posterior
-------------- % --------------
A 100 70 70 70 30
B 81 87 70 70 10
C 70 100 70 70 0
D 60 100 60 60 0
E 100 100 100 100 0
F 135 100 135 135 0

 

Notamos na tabela acima que o calcário B terá um menor efeito posterior do que o calcário A, mesmo tendo o mesmo PNRT. O mesmo serve para o calcário C comparado ao calcário B. O calcário C, com 70% de PRNT não tem qualquer efeito posterior, com a mesma quantidade reagindo instantaneamente (em até 3 meses) do que o B, sendo o C um calcário inferior. Desta forma, apesar de indicar a eficiência de um produto, o PRNT não é o único indicador de qualidade. No exemplo A e C, onde temos o mesmo PRNT, percebemos que no produto C, estamos perdendo 30% do produto, sendo um produto bastante inferior ao produto A, mesmo apresentando o mesmo valor de PRNT.

OBS: reatividade de 135% significa que ele irá reagir antes de 3 meses. Em 2 meses, possivelmente todo o produto já terá reagido. 

Em situações onde a relação cálcio / magnésio é ideal ou próximo disso, pode-se usar o calcário dolomítico. Em situações de elevada relação cálcio / magnésio, recomenda-se o uso de calcário magnesiano. Porém, se ocorrer o contrário (bastante magnésio e pouco cálcio), dar-se preferência ao calcítico.

Em situações como necessidade rápida de correção de acidez, devemos utilizar produtos finamente moídos, com predominância de partículas menores que 0,30mm de diâmetro. Já em situações em que não será possível o revolvimento do solo após a correção, podemos utilizar calcário que tenham partículas maiores - porém, inferiores a 2 mm - para termos um efeito residual mais prolongado.

Critérios econômicos para a escolha do calcário

O critério inicial, quando não estamos preocupados com o efeito residual, é avaliar o Poder Relativo de Neutralização Total (PRNT) de um corretivo. Assim:

  1. Divide-se 100 pelo valor de PRNT, obtendo o peso efetivo do corretivo
  2. Multiplica-se este peso pela necessidade de calagem, obtendo a quantidade necessária por hectare
  3. Calcula-se o custo por hectare a partir do peso efetivo e preço, somando-se também valores com frete, armazenamento e aplicação

Assim, comparamos o custo de diferentes calcários comerciais, optando pelo menor custo por unidade de PRNT. Quando necessitamos de um efeito residual, por exemplo no caso de plantio direto, devemos levar em conta o efeito residual. Diferentes situações agrícolas exigem diferentes produtos, desta forma, não há um melhor produto, mas sim o mais adequado para a situação. Devemos observar também a concentração de magnésio.
 

Continue lendo

Calagem - O que é a acidez e calagem do solo

Calagem - Tipos de corretivos de acidez do solo

Calagem - Aplicações dos corretivos de acidez

Calagem - Critérios para a recomendação

 

Anderson Wolf Machado - Engenheiro Agrônomo

 

Referências:

EMBRAPA et al. MANUAL DE CALAGEM E ADUBAÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. 1. ed. Brasília, DF: Editora Universidade Rural, 2013.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE CIÊNCIA DO SOLO. Manual de Adubação e de Calagem Para os Estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. 10. ed. Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, 2004.

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