Nas planilhas, os números da pecuária de corte brasileira são robustos. Com 1,182 milhão de toneladas de carnes embarcadas e receitas da ordem de US$ 1,365 bilhão entre janeiro e novembro, o País caminha para se tornar o principal exportador mundial. Mas, nos últimos meses, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) identificou no crescimento do abate de matrizes sinal que pode comprometer o quadro de expansão. "Podemos, no futuro, ficar sem matéria-prima para sustentar a demanda externa", alerta o presidente do Fórum Nacional Permanente de Pecuária de Corte da entidade, Antenor Nogueira.
A preocupação estará na pauta que a CNA levará ao encontro dos setores do agronegócio com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva marcado para amanhã. Ela está amparada na informação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de que, em junho, as matrizes responderam por 34% dos abates efetuados no mês, o maior percentual desde janeiro de 1997. "A média mensal fica entre 18% e 20%", compara o presidente da entidade. Os reflexos, aponta, serão sentidos a médio prazo, já que o ciclo de produção de um animal para abate é de entre 2,5 a 3 anos. O plantel brasileiro de matrizes é estimado entre 60 milhões e 65 milhões de animais.
O presidente do Fórum de Pecuária de Corte considera a situação um reflexo do avanço da agricultura sobre as pastagens, que ocupam uma área estimada em 200 milhões de hectares. "Hoje é mais rentável arrendar a área para a produção de soja", compara Nogueira. Mas Nogueira também aponta a participação da indústria de carne, que "nada fez para transferir os ganhos no mercado internacional aos produtores".
A base do raciocínio de Nogueira é a evolução dos preços médios da tonelada de carne in natura exportada, que avançou de US$ 1,453 mil em janeiro para US$ 2,206 mil em novembro, o que corresponde a 43%. Enquanto isso, no mercado interno, o preço da arroba do boi gordo, segundo pesquisa da CNA e do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo (Cepea/USP), teve variação média de 1,85% entre os meses de março e novembro.
O estudo, feito com base na média ponderada dos sete estados pesquisados, também aponta um crescimento, no período, de 6,5% do custo operacional total (COT), que inclui depreciações do patrimônio, contra uma variação do IGP-M de 3,22%. O maior impacto foi apurado em Mato Grosso do Sul, que abriga 21% do rebanho de corte do País. No estado, entre março e novembro, os custos totais da atividade aumentaram 9,29% e os preços pagos aos produtores, 1,32%. Nas 20 mesoregiões pesquisadas em Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Rondônia, Rio Grande do Sul (a partir de agosto) e São Paulo, onde estão 60,35% do rebanho nacional, os custos foram alavancados por insumos de formação de pastagens, medicamentos, salários e itens para construções.
Perspectiva otimista
Mas existem perspectivas otimistas na pesquisa CNA/Cepea. Dados referentes a novembro apontam variação de 0,1% dos custos totais e efetivos (COE). Além disso, nos contratos com vencimento em outubro de 2004, o preço da arroba está estimado em R$ 70, alta de 12% em relação ao no mesmo período deste ano.
As melhores perspectivas vêm do mercado externo. Projeções da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) apontam que o Brasil deverá responder por 21% do total do comércio mundial de carnes em 2004, que deverá evoluir 6% em relação as 5,991 milhões de toneladas comercializadas este ano. A CNA prevê que as remessas anuais brasileiras devem ficar entre 1,65 milhão e 1,7 milhão de toneladas, contra até 1,4 milhão em 2003.
O Brasil deverá encerrar o ano com exportações de carnes no montante de US$ 4 bilhões, segundo estimou ontem o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. Segundo ele, o superávit do setor de agronegócio este ano deverá ficar ao redor de US$ 25,1 bilhões, com incremento de 25% em relação ao saldo positivo setorial registrado no ano passado.