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Como manter o seringal produtivo por mais tempo

Pesquisadora lista os manejos e as boas práticas na cultura


Foto: Divulgação Apabor

No Brasil a heveicultura ou plantio de seringueiras para extração de látex para borracha natural se desenvolve basicamente em São Paulo e outros estados com menor proporção como Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais. A área plantada é de 258 mil hectares, sendo 158 mil hectares em produção.

Um heival bem manejado pode se manter produtivo por 15 anos. Por ser uma cultura perene necessita de alguns cuidados e boas práticas para dar lucro. A pesquisadora da APTA Regional de Colina, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Elaine Cristine Piffer Gonçalves, dá algumas dicas importantes para cultura. 

Portal Agrolink: o que o produtor deve ter como prioridades de manejo para seu seringal ser mais eficiente e produtivo?
Elaine Gonçalves: a primeira iniciativa que o produtor precisa é escolher a área onde será implantada sua floresta, pois áreas com acúmulo de água, com presença de camadas de impedimentos, regiões suscetíveis ao mal das folhas e com grande possibilidade de ocorrência de geada devem ser evitadas. Após a escolha da área, ponto fundamental para ter um seringal produtivo e homogêneo é a escolha das mudas. Ao adquirir mudas de seringueira é necessário saber qual material foi usado para produção dos porta enxertos e na enxertia e qual a origem destes materiais (exigir certificado de origem genética).

Além da origem genética, deve-se prezar pela qualidade sanitária das mudas (devem estar livres de pragas e doenças). Para tanto, o viveiro deve ter todos os documentos que comprovem a aquisição dos materiais genéticos de áreas destinadas a este fim, com cadastro no MAPA (Ministério de Agricultura e Abastecimento), na CDA (Coordenadoria de Defesa Agropecuária) e ter um responsável técnico. Para implantação do projeto heveícola os lotes de mudas devem ser selecionados e de preferência serem plantados no início das estações chuvosas, devendo-se no primeiro ano de implantação fazer a irrigação destas mudas com tanque na época da seca, caso não haja irrigação. A compra de mudas padronizadas e selecionadas proporciona maior porcentagem de pegamento e menor índice de replantio.

Com relação as replantas, as mesmas devem ser feitas com até 6 meses após plantio e deve-se cuidar destas de maneira diferenciada para que elas se desenvolvam rapidamente e alcancem as outras. Deve-se fazer o controle das plantas daninhas nas linhas de plantio de forma eficiente e para que não ocorra competição das mesmas com a seringueira e de forma que o desenvolvimento do seringal não seja comprometido pela presença de invasoras.

Fazer a desbrota dos brotos laterais até 2,50 m de altura e controle de pragas e doenças sempre que necessário. Realizar todas as adubações e correções de solo, de acordo com as recomendações existentes para a cultura e os resultados das análises de solo da área. Estes cuidados farão com que tenhamos um plantio: homogêneo, com bom desenvolvimento, com materiais genéticos de boa procedência e, consequentemente, baixo índice de replantio e maior número de plantas aptas para entrada em sangria em menor tempo. No estado de São Paulo, os seringais entram em sangria aos 7 anos após a implantação com 50% das plantas aptas. Se tomarmos todos os cuidados acima, podemos ter até 80% das plantas aptas para sangria na mesma idade. Estes cuidados garantirão eficiência e produtividade na sua floresta. 

Portal Agrolink: o que é considerado um seringal ideal e que boas práticas podem ser adotadas?
Elaine Gonçalves: o seringal ideal é aquele que apresenta um bom stand de plantas, que possui precocidade no desenvolvimento das plantas, homogeneidade, antecipação da entrada em sangria, boa produtividade e longevidade de cultivo. Para obtenção de um seringal ideal há necessidade de adoção de boas práticas desde a implantação até o gerenciamento correto de sangria.  O seringal precisa ser implantado com mudas de boa qualidade, com baixo índice de replantio e poucas falhas, sem plantas dominadas e áreas inaproveitáveis dentro do seringal. Todas as práticas de manejo recomendadas para a cultura (Manual Técnico da SAA) devem ser respeitadas, com relação ao controle de pragas, doenças, plantas daninhas, correções de solo a adubações.

Além disto, o seringal ideal é aquele que apresenta um período de imaturidade menor do que o convencional, e maior número de plantas aptas para sangria na ocasião da abertura de painel e início de produção. Para entrada em sangria, deve-se realizar um rigoroso levantamento dentro do seringal e todas as orientações e procedimentos para entrada em sangria devem ser observados: valor mínimo de 45 cm de perímetro da planta à 1,30 m de altura do solo, espessura de casca mínima de 6 mm, fazer as linhas geratrizes e a correta marcação do ângulo de corte com utilização de bandeira adequada.

Deve-se definir o sistema de sangria a ser adotado em cada propriedade de acordo com as peculiaridades de cada local e dentro do sistema de sangria escolhido, deve-se respeitar as recomendações de sangria e estimulação para que se busque boas produções, sem risco de secamento de plantas devido ao uso excessivo de estimulantes ou a falta de controle de fungos de painel. 

 Após o início de sangria, o seringal deve apresentar boa produtividade durante todos os anos de produção. Para que isto aconteça o acompanhamento técnico responsável e especializado é fundamental. Alguns fatores relacionados à sangria interferem diretamente na produção de látex e na durabilidade do seringal. Dentre estes, a profundidade de sangria, consumo de casca por sangria, declividade de corte, ferimentos, frequência de sangria, estimulação e controle de doenças de painel, são os mais impactantes na produção e longevidade do seringal.

Do acompanhamento e gerenciamento das atividades de sangria do seringal é que dependerão: boas produtividades associadas à longevidade da cultura e alta lucratividade da atividade. 

Portal Agrolink: é possível ter um seringal produtivo por muitos anos? Como?
Elaine Gonçalves: sim, é possível ter um seringal produtivo por muitos anos. Para que isto aconteça devemos ter uma boa gestão dentro do seringal e acompanhamento técnico especializado e focado nos pequenos detalhes que fazem toda a diferença quando se trata de uma cultura perene (produz por mais de 40 anos), altamente dependente de mão de obra qualificada e da adoção de boas práticas desde a implantação.

Para manter o seringal produtivo por muitos anos deve-se fazer coletas, e análises de solo para que sejam feitas correções a adubações necessárias, deve-se também realizar o monitoramento das pragas e doenças e quando houver necessidade realizar pulverizações e controle das mesmas. Com relação a sangria, deve-se respeitar as recomendações feitas de acordo com o sistema de sangria adotado e fazer a gestão e gerenciamento de todas as atividades relacionadas à mesma dentro do seringal. O desenvolvimento de planilhas de sangria e avaliação mensal de sangria dos sangradores é fundamental para garantir a produtividade e longevidade do seringal. 

Através das avaliações de sangria pode-se verificar se existem critérios técnicos que não estão sendo respeitados pelos sangradores no campo, como: profundidade de sangria, consumo de casca, avanço à geratriz, controle de fungos de painel, presença de ferimentos, declive de sangria, perda de produção, e etc. Além da planilha de avaliação de sangria, com a qual podemos avaliar a qualidade de sangria dos nossos colaboradores, recomenda-se que sejam elaboradas outras planilhas contento informações sobre as atividades diárias dentro do seringal, que envolvem: sangria, controle de fungo de painel, aplicação de ethrel, reposição de sangria, número de plantas com secamento de painel em cada tarefa, coleta de borracha, controle de pragas e doenças de folhas.

A análise e acompanhamento de todas estas informações é que vão servir de base para futuras mudanças dentro do seringal, e para garantir boas produções durante a vida útil do seringal. Atualmente, temos visto vários seringais serem explorados de maneira inadequada, com excessivas estimulações (não respeitando as frequências estipuladas para cada sistema de sangria, não respeitando as condições fisiológicas das plantas, as dosagens recomendadas por planta, nem a concentração recomendada do produto). Estas aplicações descontroladas têm ocasionado secamento de plantas ao longo dos anos e diminuição da vida útil dos seringais. 

É de extrema importância o gerenciamento e o acompanhamento técnico das atividades de sangria para obtenção de maiores produtividades e garantia de maior vida útil dos seringais.

Portal Agrolink: a sustentabilidade produtiva pode agregar valor ao produto? 
Elaine Gonçalves: a sustentabilidade consiste em levar em conta: preservação ambiental, fim do desmatamento, geração de emprego e renda através do desenvolvimento econômico das regiões. Dentre os indicadores sustentáveis empresariais mais utilizados para avaliação dos processos industriais e para enquadramento da empresa no quesito sustentabilidade, os mais observados são: poluição, desmatamento, desigualdade social e trabalho infantil. Atualmente, o respeito às sociedades e à preservação natural têm sido cobrados e ações de responsabilidade social e sustentável empresarial, já chegaram nos mercados financeiros. Este novo modelo, e esta nova proposta demandada pelo mercado consumidor, exige que haja uma reestruturação na forma de produção e na forma de pagamento dos produtos produzidos de maneira ambientalmente correta e socialmente justa.

Neste cenário, a borracha natural produzida no Brasil, se enquadra perfeitamente em todas as exigências. Produzimos em áreas que não foram desmatadas, é uma cultura que não se utiliza de muitos defensivos agrícolas para ser produzida, gera emprego e renda para diversas famílias, fixa o homem no campo evitando o êxodo rural e o custo do mesmo, para o Governo. É uma das culturas que mais emprega no campo, só no estado de São Paulo, são mais de 25 mil empregos diretos. Além disto, deve-se lembrar que os salários pagos aos sangradores são bem maiores, do que eles ganhariam se tivessem trabalhando nas cidades ou nas indústrias, pois o setor emprega pessoas sem qualificação técnica ou “estudo”, e garante salários superiores aos que eles ganhariam na cidade, com a qualificação que possuem.

O MAPA (Ministério da Agricultura e Pecuária) publicou as Normas de produção integrada para borracha natural este ano, e a adesão é voluntária. Com relação às Certificadoras, vai haver um treinamento e credenciamento que está sendo programado. Embora exista esta crescente demanda pelo mercado comprador, como produzimos somente 40% da borracha que consumimos e assim, não exportamos produto, não sei informar se o mercado interno, e as Pneumáticas que compram nossa matéria prima pagariam pelo produto que produzimos. Hoje, a produção de borracha natural no Brasil está desestimulada e, em risco. O produtor embora produza um produto sustentável, concorre com os países Asiáticos, que produzem em condições muito diferentes das nossas tanto no aspecto ambiental, como social. Os heveicultores brasileiros apresentam um custo de produção muito maior quando comparado aos Asiáticos e ele não recebe pelo custo de produção Brasil e sim, por um índice publicado, que leva em consideração quanto custa para colocar a borracha natural da Ásia no Brasil. 

A conscientização ambiental e a exigência do mercado consumidor é que poderão garantir que a Cadeia da Borracha Natural no Brasil volte a crescer. Se o produtor receber um valor maior pela produção sustentável, a certificação e a rastreabilidade conseguirão ser implantadas na Cadeia.

Portal Agrolink: sistemas agroflorestais ou ILPF podem funcionar com a heveicultura, viabilizando sua sustentação econômica?
Elaine Gonçalves: sim, funcionam muito bem quando bem planejados. Devido aos sérios problemas de preços baixos que o setor vinha enfrentando nos últimos anos e ao longo período de imaturidade da cultura, muitos produtores buscaram alternativas para viabilizar a manutenção dos novos plantios. Em várias propriedades agrícolas, visando o aproveitando da área, da mão de obra existente, a diversificação de renda e retorno antecipado do capital investido, fez-se uso de culturas intercalares com a cultura da seringueira e em alguns casos optou-se pela integração lavoura (seringueira) com pecuária leiteira, com intuito de aproveitamento da área, e diminuição do gasto com herbicidas e operações para controle do capim presente em plantios de seringueira em pequenas propriedades.

Nos primeiros anos de implantação da cultura, há possibilidade de plantar culturas anuais nas entre linhas do plantio de seringueira. Na região de Barretos alguns heveicultores plantaram soja e milho nos três primeiros anos de cultivo da seringueira e obtiveram bons resultados em termos de produtividade, lucratividade e ocupação da terra. Outros investiram no plantio de seringueira consorciado com banana (na região de Araçatuba) e com o cacau (na região de Olímpia), utilizando-se da mão de obra disponível na propriedade e adquirindo mudas à baixo custo, o que viabilizou o investimento e garantiu uma fonte de renda alternativa e antecipada que tem ajudado a pagar a manutenção dos seringais até a entrada em sangria. A diversificação de culturas, além das vantagens econômicas, apresenta várias vantagens ambientais e sociais.

Para escolha da cultura que será utilizada para consórcio com a seringueira, deve-se levar em consideração alguns fatores: 

- Espaçamento utilizado no plantio de seringueira: plantios mais adensados não permitem o uso da área além de 3 anos, devendo-se optar pelo plantio de culturas anuais; Espaçamentos maiores, já pode-se pensar no plantio de culturas com um ciclo maior;

- Região do plantio: para escolha da cultura a ser implantada em consórcio com a seringueira temos que tomar o cuidado de observar se existe demanda local para comercialização do produto proveniente da cultura que será consorciada com a seringueira;

Nos dois exemplos de SAF citados acima, as culturas plantadas no meio da floresta de seringueira, foram implantadas com baixo custo (mudas de banana adquiridas de vizinhos à baixos valores e mudas feitas através de sementes de frutos trazidos do Pará (cacau) utilizando-se a própria mão de obra já existente nas propriedades para plantio, adubação e condução destas culturas, e da seringueira. Os sistemas utilizados estão proporcionando renda extra para as propriedades e melhor ocupação da área, a banana começou a produzir 11 meses após o plantio e o cacau aos 18 meses após plantio, e o produtor está fazendo testes para processar o produto e tirar as amêndoas, visando obter maior rentabilidade. Este tipo de SAF com a cultura da seringueira, permite obter renda nos 7 primeiros anos, onde ainda não se consegue iniciar a produção de látex.

O caso de integração lavoura (seringueira), pecuária leiteira, se deu na região de Campina Verde/MG, onde optou-se por fazer um sistema de integração num seringal com 3,5 anos de idade, com gado caracu leiteiro. Optou-se por não gastar com herbicidas no controle de plantas daninhas e nem com roçagens na área em questão, sendo que o pastejo do gado é que manteve o capim sob controle, de forma a garantir o desenvolvimento da seringueira. Duas vezes ao ano era feito controle das plantas daninhas nas linhas de plantio da seringueira, reduzindo-se desta forma, os gastos com controle do mato, no período de imaturidade da cultura. Por ser um gado calmo, manso e por ser adotado manejo adequado, não foram observados estragos na seringueira (quebra de plantas e/ou machucados no tronco das plantas).

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