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Controle de cheias pela represa de Manso acabou com os peixes do Rio Cuiabá, diz empresário

Até a década de 80, a abundância era impressionante no local


A formação da represa da Usina Hidrelétrica de Manso, transformada depois em APM (Aproveitamento Múltiplo de Manso), cujas obras iniciadas em 1981 ficaram paradas por dez anos e foram concluídas em 2002, com o principal objetivo de controlar os períodos de cheias e secas do Rio Cuiabá e não para explorar o seu potencial energético de 210 megawatts em quatro turbinas, acabou com os peixes do Rio Cuiabá.

A opinião é do engenheiro civil Samir Saddi, desde 1972 vivendo às margens do Rio Cuiabá em Santo Antonio de Leverger, onde tem o Restaurante e Marina Gaivota, um dos mais antigos da cidade e muito frequentado, principalmente nos finais de semana.

Sua explicação para o sumiço dos peixes do Rio Cuiabá por culpa da represa de Manso: sem as cheias que ocorriam todos os anos no Pantanal Mato-grossense, em menor ou maior escalas, como as de 1942, 59, 74 e 94, os peixes que se refugiavam nos campos da maior planície alagadiça do mundo, com seus 52 mil km2, além de pequenos rios, riachos, lagos e baías, ficaram a mercê de todos os tipos de predadores.

A fartura de todas as espécies era tanta, inclusive de grandes bagres como pintado, cachara, jaú, barbado, que os ribeirinhos pantaneiros utilizavam flechas e pedaços de paus para “caçar” peixes nos campos alagados onde as espécies de maior porte ficavam protegidas de predadores e se alimentando de frutas dos cerrados. Esse tipo de “caça” ocorria geralmente quando as águas baixavam muito rápido e os peixes não conseguiam voltar para o canal dos rios.

Sem um lugar seguro, como a gigantesca planície pantaneira, para se proteger e crescer, os peixinhos que conseguem sobreviver à poluição do Rio Cuiabá, cujas águas estão altamente contaminadas por resíduos de agrotóxicos de lavouras de soja e algodão e dos esgotos que são despejados no curso d’água sem nenhum tratamento, acabam se transformando em presas fáceis de predadores do seu canal.

Até a década de 80, a abundância de peixes no Rio Cuiabá era impressionante. Tanto é que era considerado um dos mais piscosos do Brasil, conforme depoimento inclusive de um irmão de um ex presidente da República do período revolucionário e que almoçou no Gaivota faz muito tempo. Ele afirmou que já havia pescado em todos os rios brasileiros e em alguns dos quais o acesso só era possível de helicóptero, e em nenhum deles havia tanto peixe como no Cuiabá.

MUDANÇAS DE HÁBITOS ALIMENTARES DOS PEIXES DE ESCAMA

Atento as mutações que o Rio Cuiabá vem sofrendo nos últimos anos, Saddi tem notado, inclusive, mudanças nos hábitos alimentares das espécies de escama – piraputangas, pacus, piaus, piavuçus (a pesca do dourado está proibida por lei) etc. É que com a proliferação de pesqueiros nas duas margens do rio, a partir de Santo Antonio de Leverger, essas espécies passaram a comer milho e soja, que são colocados em sacos nas imediações de estrados construídos sobre tambores que avançam sobre as águas, fazendo as chamadas cevas, que atraem os peixes, tornando mais fácil a captura.

A concentração desses alimentos nas células das espécies de escamas está provocando mudanças no sabor de suas carnes. Resultado: os mesmos consumidores que antes não queriam nem saber de peixes criados em cativeiros, quando vou comer pacu no restaurante de Saddi querem saber se o peixe é de rio e ou de piscicultura. Se for de rio, ninguém quer.

"Eu nem me lembro quando foi a última vez que eu fiz um pacu de rio aqui. Mas faz muitos anos... ", diz Saddi.

Para o empresário, que faz a medição diária do curso d’água que passa por diversos municípios antes de desaguar no Pantanal Mato-grossense, a Eletronorte devia aumentar o volume de águas do Rio Cuiabá, a partir de novembro, quando começa o período de desova nos rios do Estado. Para Saddi, a retenção das águas na represa formada em 90% pelas águas dos rios Manso e da Casca em nada contribui para proporcionar condições favoráveis à reprodução e sobrevivência das espécies que vivem nos rios de Mato Grosso.

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