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Cresce a concentração na produção agropecuária no MT

Nas próximas safras, outros 1 milhão de hectares em mãos de médios produtores podem mudar de donos


Principal produtor de grãos e fibras do país, Mato Grosso experimenta um momento de aprofundamento da concentração da produção agropecuária. Grandes produtores foram levados a deixar o processo produtivo por causa do recente período de crise de renda no segmento de grãos. Nos últimos três anos, os mega-produtores do Estado avançaram sobre 1,3 milhão de hectares de terras produtivas, segundo analistas do mercado financeiro e de agentes locais ouvidos pelo Valor. Nas próximas safras, outros 1 milhão de hectares em mãos de médios produtores podem mudar de donos.

A elevação nos custos de captação do dinheiro, o atraso na entrega de insumos e a redução do volume de crédito levaram cerca de 500 grandes e médios produtores de Mato Grosso a sair da atividade. O agravamento das dificuldades na gestão das propriedades transferiu pelo menos 600 mil hectares a outros produtores. Em Primavera do Leste, no sul do Estado, apenas seis produtores detêm metade dos 320 mil hectares de lavouras. "Em dez anos, Mato Grosso vai estar nas mãos de 15 ou 20 mega-produtores", prevê o produtor José Nardes, presidente do sindicato rural do município, que arrendou 6 mil de seus 7,5 mil hectares a outros colegas.

Os investimentos pesados em maquinários e a abertura de novas áreas de produção geraram uma dívida em reais, mas na quitação dos débitos houve frustração de safra, sem a devida cobertura de hedge cambial. "Vamos fazer caixa e pagar os credores que faltam", diz o empresário e prefeito de Rondonópolis, Adilton Sachetti. Dona de um dos maiores empreendimentos rurais do Estado até 2005, a família planta hoje apenas 3 mil dos 70 mil hectares outrora cultivados. Foram arrendados, por meio de parcerias, 22 mil hectares.

A procura por mais terras não pára, e os preços têm subido. Um hectare custa hoje até R$ 5 mil em áreas mais cobiçadas. Antes, havia negócios entre R$ 2 mil e R$ 3 mil. O movimento beneficia os tradicionais arrendamentos e o novo sistema de parcerias, onde quem tinha mais capital fez um acordo para tocar as operações e dividir os lucros. "Mas até agora os resultados não têm chegado para quem cedeu a terra", critica Carlos Ernesto Augustin, grande produtor da Serra da Petrovina, que não aderiu às parcerias. "É um modelo insustentável a médio prazo. Quem fez parceria dificilmente volta a produzir novamente", reforça o produtor Rogério Salles, de Rondonópolis, outro crítico do processo.

Mesmo com a melhora na situação financeira do setor, a concentração deve continuar. No mercado local, estima-se que uma parte dos 5 mil médios produtores de soja no Estado, cujas fazendas têm entre 500 e 2 mil hectares, ainda corre risco de deixar a atividade nas próximas safras.

A "classe média" segue pressionada pelo menor poder de barganha com tradings, multinacionais de defensivos e fertilizantes, além de bancos. A situação é agravada pela demora do governo em fazer chegar ao campo a ajuda anunciada. "A burocracia complica ainda mais a reversão dessa tendência", diz o produtor Gilberto Goellner. Há 300 grandes produtores, que plantam de 10 mil a 15 mil hectares, prontos para arrebatar as terras dos menores. "Sem dúvida, esse movimento preocupa muito", diz Olímpio Vasconcelos, gerente de Mercado de Agronegócios do Banco do Brasil em Mato Grosso.

Os problemas decorrem, sobretudo, de complicações cambiais e climáticas. Nas últimas três safras, os produtores plantaram com a cotação de dólar em alta e colheram na baixa. Até 2004, quando começou a crise de renda, os produtores administravam seus passivos com a abertura de novas áreas. Com demanda em alta e a margens crescentes, havia ânimo para ampliar as operações. Mas os custos de produção dispararam. Atreladas ao real, mão-de-obra e óleo diesel desequilibraram ainda mais as finanças.

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