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Crise agrícola passa e deixa dívidas como herança

Agroconsult analisa fluxo de renda e estoque de dívidas agrícolas


A nova safra de grãos deverá revelar um quadro bem mais promissor que o dos últimos anos, segundo análise da Agroconsult. A forte queda nos custos de produção e a recente recuperação dos preços internacionais da maioria dos produtos agrícolas apontam para um ano de lucros. Nas regiões Sul e Sudeste, com logística privilegiada, as margens esperadas são alentadoras. Em boa parte do Centro-Oeste e nos Cerrados do Nordeste, os produtores de grãos também devem voltar a ter lucro.

No Mato Grosso, onde a logística precária e a ferrugem asiática prejudicam a competitividade da soja, espera-se que a maioria dos produtores alcance ao menos o equilíbrio. As perspectivas de que tenha se encerrado o processo de valorização do real, maior vilão da agricultura nos últimos anos, e de que tenha continuidade a trajetória de queda da taxa de juros ajudam a trazer a confiança de que o pior já passou.

A Agroconsult separou nesta análise o fluxo de renda e o estoque de dívidas. O fluxo de renda da agricultura brasileira, segundo a consultoria, vai melhorar bastante em 2007 e marcar o início de um novo ciclo de crescimento. Porém, o estoque de dívidas contraídas e o caminho escolhido para seu saneamento vão determinar a extensão e a intensidade da nova fase de crescimento e se, de fato, a crise e seus efeitos estarão superados.

Quando os preços internacionais de vários produtos agrícolas importantes, em especial a soja, começaram a ceder no segundo semestre de 2004, os termos de troca da agricultura brasileira passaram a se deteriorar rapidamente, pois a pressão de alta dos custos, em processo desde 2002, deixou de ser compensada por cotações generosas nas bolsas internacionais. Clima ruim e doenças minando a produtividade, de um lado, e preços em queda com custos em alta minando os termos de troca, de outro, impuseram uma retração sobre o poder de compra dos produtores de soja para um terço do registrado em 2004.

Não foi apenas a forte valorização do câmbio entre 2003 e 2006 que determinou a crise de renda de 2005 e 2006. Mas o que fez o câmbio ser apontado como o vilão da crise foi a ocorrência por dois anos consecutivos de forte valorização entre o período de compras de insumos, entre maio e outubro, e a época de liquidação dos compromissos após a colheita, entre março e junho.

Nos últimos dois anos, a área plantada com grãos caiu 3,9 milhões de hectares e os mercados de insumos entraram em marcha à ré. As vendas de fertilizantes, que alcançaram 22,8 milhões de toneladas em 2004, devem alcançar apenas 20,5 milhões de toneladas em 2006. O faturamento do setor de defensivos chegou a US$ 4,5 bilhões em 2004 e deve recuar para menos de US$ 3,5 bilhões em 2006.

O setor de máquinas agrícolas, que atingiu vendas de 29,2 mil tratores e 5,6 mil colheitadeiras em 2004, teve queda de 38,5% e 72,6%, respectivamente, em 2005. Em 2006, até outubro, houve crescimento de 8,4% na venda de tratores e nova queda, agora de 44,3%, na de colheitadeiras. O crescimento das vendas de tratores está concentrado em São Paulo, em função do boom no mercado sucroalcooleiro, e no Rio Grande do Sul, onde há fortes ações do governo em agricultura familiar. No Centro-Oeste, as vendas de tratores seguem caindo (-3,7%).

Vendas em declínio, queda no faturamento e margens achatadas não foram os únicos nem os maiores problemas das agroindústrias. As taxas de inadimplência atingiram níveis recordes. A incapacidade de saldar dívidas deflagrou uma crise nas regiões agrícolas do país que se estendeu aos demais setores da economia, com reflexos negativos sobre a indústria e o comércio.

Os produtores contraíram dívidas de diversas naturezas e com diversos credores. Segundo levantamento recente da Agroconsult realizado para a Associação Nacional de Difusão de Adubos e Corretivos (Anda), as dívidas dos produtores referentes às safras 2004/05 e 2005/06 junto as empresas fornecedoras de insumos e tradings, ainda não saldadas até 30 de setembro ou postergadas para serem pagas com as safras futuras, são de R$ 7,2 bilhões e estão concentradas nas regiões Centro-Oeste (57% do total) e Sul (23%), e nas lavouras de soja (71,1%), algodão (11,6%) e milho (9,6%).

As dívidas de custeio junto aos bancos foram prorrogadas por decisão do governo, sendo pagas pelos produtores apenas a partir de 2007, em até cinco anos. Isso deve significar a rolagem de pelo menos R$ 8,90 bilhões, a maior parte pelo Banco do Brasil. Até novembro, os produtores transferiram para o FAT-Giro Rural pelo menos R$ 2,0 bilhões de dívidas junto aos bancos.

Já as dívidas de investimentos, principalmente em máquinas e implementos agrícolas (atreladas aos convênios Mapa-BNDES) tiveram vencimentos prorrogados em 2005 e 2006, totalizando R$ 7,85 bilhões. Restam ainda dívidas dos produtores contraídas junto aos fundos constitucionais (FCO, FNE e FNO), cujas parcelas de 2005 e 2006 foram prorrogadas.

Um fato positivo para a safra 2006/07 foi a forte redução nos custos de produção, especialmente em fertilizantes e defensivos, em boa parte devido à retração da demanda. A restrição de crédito para vendas a prazo de defensivos, forçando descontos nas vendas à vista, a forte presença de genéricos e o avanço da soja transgênica fizeram os preços em dólar recuar mais de 30%. Os preços internacionais de grãos e oleaginosas estão em alta novamente, pressionados pelo impacto do crescimento da demanda por biocombustíveis.

A combinação entre queda de custos de produção e recuperação dos preços em curso vem melhorando as expectativas de rentabilidade para a safra 2006/07, conforme a Agroconsult. No entanto, há diferenças significativas no nível de rentabilidade a ser alcançado em diferentes regiões do país. Em 2007, para a média dos produtores de soja do Rio Grande do Sul, Paraná e Goiás, a geração de lucro voltará a ser significativa, mas no Mato Grosso ela acontece timidamente.

Além disso, o processo de recuperação do crescimento da agricultura se dará de forma diferenciada entre as diversas regiões do país, em função das dívidas acumuladas e postergadas em cada região nos próximos anos. Para a maioria dos estados, 2007 e 2008 devem representar anos de transição, em que as boas rentabilidades alcançadas permitirão colocar as contas em ordem e preparar o terreno para nova fase de investimentos e expansão a partir de 2009. As informações são da Agroconsult.

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