Europeus revisam nível de resíduos de inseticidas em produtos agrícolas, medida que pode prejudicar produtos brasileiros. As exportações de suco de laranja concentrado do Brasil para a União Européia (UE) podem ser banidas do mercado comunitário a partir de janeiro de 2003 por conta de uma recente decisão de Bruxelas, segundo reclamação feita ontem pela delegação brasileira num comitê da Organização Mundial de Comércio (OMC).
A diretiva 2002/71/CE, de 19 de agosto, reduziu em 100 vezes os níveis máximos para resíduos de dimetoato (uma substancia ativa de inseticida) em cereais, alimentação de origem animal e outros produtos como frutas e vegetais.
Os exportadores de suco de laranja terão apenas as próximas seis semanas para se adaptarem à nova medida, que aumentou em 100 vezes a exigência fitossanitária.
Novas exigências
Mas esse caso é apenas o começo. As exportações agrícolas do Brasil e dos países em desenvolvimento em geral estão ameaçadas de serem cada vez mais bloqueadas nos 15 países da União Européia (UE) por conta de novas exigências sanitárias e fitossanitárias
A delegação brasileira exemplificou que a União Européia está revisando o nível de resíduos de 320 outros inseticidas, com alto potencial de prejudicar exportações de países como o Brasil.
O potencial de novos conflitos comerciais é enorme, quando se considera que o Brasil exportou US$ 8,9 bilhões de agronegócio para a União Européia e que a barreira mais crescente no comércio agrícola internacional é nas áreas sanitária e fitossanitária.
Ao trazer o tema ontem ao Comitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias, o Brasil deu o primeiro passo do que pode vir a ser uma enorme briga proximamente no Órgão de Solução de Controvérsias, onde são examinados os contenciosos. Basta ver que a medida européia vai afetar exportações de suco de laranja, que tem um impacto significativo na balança comercial brasileira.
O País é o principal exportador de suco de laranja concentrado do mundo, e maior parte vai para os 15 países membros da UE.
Ontem, o Brasil pediu para a UE revisar a diretiva que pode "proibir o suco de laranja brasileiro no mercado europeu", e que leve em conta todas as informações científicas disponíveis.
Cargas separadas
No documento apresentado na OMC, o Brasil diz que o estabelecimento do "Limit of Analytical Determination (LOD)", como estabelecido por Bruxelas para dimetoato, "terminará com exportações para a UE de todas as culturas tratadas com esse inseticida".
Além disso, como os produtores não podem separar as cargas de acordo com a destinação, vão ter de acabar com o uso do produto em todas as exportações de cítricos e maçãs para exportações, perdendo a eficácia do inseticida. Segundo o Brasil, não há produto alternativo no mercado hoje que pode ter a mesma proteção eficaz e econômica para as colheitas.
O dimetoato tem sido usado por mais de 40 anos no País e continua hoje a ser "extremamente importante" para os produtores em razão de sua eficácia contra virtualmente a maioria de insetos destruidores, principalmente nos cítricos.
O dimetoato é registrado no Brasil para uso em cítricos, maçã, algodão, tomate, trigo e ornamentos. O documento apresentado na OMC diz que o País importa 330 toneladas desse inseticida por ano. Cerca de 80% dessa quantidade é usada na plantação de cítricos, que recebem de duas a três aplicações por safra.
Mas o documento reitera que resíduos de dimetoato não trazem nenhum risco para os consumidores do suco produzido a partir de laranja tratada com esse inseticida.
Para o Brasil, a UE tem que provar que esse inseticida apresenta evidências científicas de potencial dano para a saúde humana, animal e para o meio ambiente.
O documento brasileiro informa que a diretiva européia vai contra o nível de tolerância usado no Brasil e nos Estados Unidos, os principais exportadores de suco de laranja, e também contra o Codex Alimentarius, mecanismo da Organização Mundial da Saúde e da FAO que estabelece as normas mundiais na área alimentar.
Barreira não tarifária
Brasília alimenta a suspeita de que suas exportações de suco são alvejados por barreira não tarifaria, quando examina a "incoerência" da medida européia: exigiu novo nível máximo de resíduos do inseticida para cítricos, mas impôs limites diferentes para outros produtos como cereja, azeitona e cebola.
A delegação apresentou uma lista de artigos do Acordo de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias que a UE teria violado e podem servir para denunciar Bruxelas mais tarde na OMC. Sete países apoiaram o Brasil: Uruguai, Argentina, Bolívia, República Dominica, Cuba, Jamaica e México.
Existe uma preocupação no governo brasileiro de evitar a impressão de que se pode entrar numa nova guerra comercial, inclusive por conta da disputa envolvendo açúcar. O fato é que o potencial de novas brigas é considerável.
Assis Moreira