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Fim da cláusula da paz exige cautela


O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, disse na sexta-feira que a posição do governo brasileiro sobre a cláusula da paz é clara: "ela é muito importante para nós e só é possível negociá-la se houver muita vantagem para o Brasil que permita esse tipo de abertura. Mas, em princípio, é essencial que a cláusula da paz termine para que possamos ter muito mais poder de negociar daqui para a frente".

A cláusula da paz ou artigo 13 do Acordo sobre Agricultura da Organização Mundial do Comércio (OMC), que permite aos países liberdade para aplicar subsídios sem que possam ser questionados no mecanismo de solução de controvérsias da entidade, expira em 31 de dezembro deste ano. Há indicações de que os países que subsidiam - EUA, Coréia, Japão e União Européia - deverão pedir uma prorrogação do prazo porque terminará para eles a garantia jurídica assegurada pela cláusula da paz. Uma ocasião propícia para os países pedirem a sua prorrogação é a 5ª reunião ministerial da OMC em Cancún (México), de 10 a 14 de setembro, que fará uma revisão da Rodada de Doha. Reuniões ministeriais da OMC acontecem a cada dois anos e uma eventual prorrogação da cláusula da paz terá de ser decidida no mais alto nível político da organização.

Na semana passada, em Genebra, o chanceler Celso Amorim disse que o Brasil não excluiria a prorrogação da cláusula da paz se ela viesse acompanhada de propostas concretas de abertura de mercados para os produtos agrícolas brasileiros. Até agora, os países que subsidiam não colocaram sobre a mesa medidas concretas para serem consideradas em "trade off" (barganha) no caso da prorrogação da cláusula da paz, mas sabem que uma extensão do prazo não lhes sairá de graça. Para o Grupo de Cairns, de países exportadores agrícolas, do qual o Brasil faz parte, medidas que satisfariam, por exemplo, são as que eles defendem como um pacote de reforma de política agrícola - tarifas até no máximo de 25%, cotas tarifárias até 20% do comércio, dependendo do produto, e eliminação dos subsídios à exportação em três anos.

"Só depois que pedirem - se pedirem, e se houver uma efetiva contrapartida positiva -, podemos pensar na negociação da prorrogação da cláusula da paz. A negociação só pode ser pensada na hipótese de grandes vantagens", destacou Rodrigues. Em sua avaliação, o Brasil não deve "negociar a cláusula da paz" na 5ª reunião ministerial da OMC em Cancún. "Devemos negociar antes as aberturas importantes para o Brasil, o que é relevante para a agricultura brasileira. Dependendo dos avanços, podemos pensar na flexibilização da cláusula da paz, mas para nós é um ponto da maior importância que ela termine. É um grande instrumento de barganha para nós. Com o fim da cláusula da paz vão se criar "n" contenciosos", diz o ministro da Agricultura. Mas em alguns setores do governo existe a percepção de que não se deve exagerar a força do instrumento de barganha da cláusula da paz porque a ninguém interessaria uma guerra comercial. Se houver uma deflagração de contenciosos, os países afetados - os que subsidiam - certamente reagirão com bastante poder de fogo, retaliando comercialmente aqueles que os ameaçarem.

O Brasil pôde acionar os EUA e a UE na OMC, no caso do algodão e do açúcar, respectivamente (devido a subsídios), porque ambos ultrapassaram os limites permitidos pela cláusula da paz.

Posição da Sociedade Rural

Para o responsável pela área internacional da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Pedro de Camargo Neto, "a pressão da cláusula da paz precisa ser bem utilizada. Trata-se de algo concreto, pago na Rodada Uruguai (do antigo GATT), que só pode ser trocado por algo também concreto, por exemplo, um cronograma de eliminação de subsídios à exportação. O direito de iniciar contenciosos não pode ser trocado pela simples aprovação de um texto de modalidades de negociação, mesmo que razoável, pois só representa uma promessa de eventual futuro acordo".

O texto de modalidades, ao qual se refere Pedro de Camargo Neto, é o que deverá sair da reunião de Cancún. Deverá haver, portanto, um acordo sobre as modalidades de negociação agrícola, na verdade, um pré-acordo. Seriam definidos, por exemplo: como atacar os subsídios à exportação, como aumentar o acesso a mercados, qual, enfim, o nível de ambição da Rodada de Doha no que se refere à questão agrícola.

Roberto Rodrigues diz que está "menos cético" em relação ao cenário de Doha em Cancún por três razões: o anúncio pela UE de que flexibilizará a sua política agrícola comum (PAC), o documento Harbinson, que "administrou bem o nível de descontentamento" entre países ricos e pobres, e a expectativa de que o presidente dos EUA, George W. Bush, suavize a política agrícola americana. "Há um arejamento do processo, um pouco menos de ceticismo", diz o ministro da Agricultura.

Mas para o representante da Sociedade Rural Brasileira, até agora "não houve progresso no horizonte. Uma reforma da PAC tímida, uma Farm Bill (lei agrícola dos EUA) retrocedendo".

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