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Governo “santifica” a soja de MT e reduz a discussão ambiental


O produto soja está sendo “santificado” pelo Governo. A afirmação é do engenheiro Maurício Galinkin, ao contestar o levantamento realizado pelo Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea), orgão governamental, sobre a questão envolvendo o desmatamento, especialmente em Mato Grosso. O assunto suscitou em polêmica em torno do avanço do cultivo da soja sobre a floresta amazônica e o Cerrado brasileiro – e o impacto causado pela agroindústria no desmatamento de matas primárias. E chegou,evidentemente, ao Fórum Social Mundial.

O texto “Crescimento agrícola no período 1999-2004, explosão da área plantada com soja e meio ambiente no Brasil” produzido pelo Ipea, analisa, entre outros temas, o cenário agrícola nacional, mas fecha o foco na região Centro-Oeste, onde a área plantada com soja obteve um crescimento de mais de 66% entre 2001 e 2004. Em determinado trecho, os autores do estudo defendem a hipótese de que a expansão nos últimos três anos das áreas cultivadas com soja, que cresce a uma média anual de 13,8%, não provocou o aumento do desmatamento da floresta amazônica nem do cerrado.

O estudo do Ipea afirma que o cultivo do grão avançou principalmente sobre "pastagens degradadas" e não sobre "áreas virgens". Explica que há uma espécie de simbiose entre o setor sojicultor e o pecuarista, de modo que o último arrenda as terras para o primeiro em troca de sacas de grãos e o retorno das propriedades com melhora na qualidade do solo. O principal argumento apresentado para justificar a tese da soja no lugar do boi é o de que não haveria tempo hábil, pela ausência de recursos tecnológicos, para converter floresta primária em área de cultivo. Os autores do texto garantem que é impossível que uma nova área desmatada seja convertida em plantação de soja em menos de três anos.

Os técnicos do Ipea, ao concluírem que as plantações de soja avançam sobre áreas de pastagem degradadas e não sobre floresta, no entanto, não levam em conta a situação existente no Norte do estado do Mato Grosso. Epicentro do recente boom da soja na região Centro-Oeste, é em Mato Grosso, de acordo com dados do próprio Governo Federal, que o desmatamento atingiu índices recordes nos últimos anos. Detalhe: o Ipea não utiliza dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), uma das maiores referências no monitoramento por imagens de satélite do ritmo e rumo dos desmatamentos no Brasil.

"É importante ressaltar que o problema não é a soja em si, mas a forma ostensiva como ela está sendo cultivada na região Centro-Oeste. E, de fato, há plantações sobre pastagens, mas é uma tendência tímida que não vale como regra” – diz o engenheiro Maurício Galinkin, que trabalhou por 18 anos no Ipea. O especialista também aponta diversos equívocos no documento governamental, como a não distinção entre pasto natural e pasto plantado. “A maioria dos pastos no Mato Grosso é natural e precisa ser desmatada antes do cultivo da soja”, ressalva o presidente da Fundação Centro Brasileiro de Referência e Apoio Cultural (Cebrac).

A “santificação” da cultura da soja pelo Governo fica, contudo, evidente quando o documento do Ipea assinala que a soja não ameaça a floresta amazônica e defende ostensivamente o asfaltamento da BR-163 para escoar a produção de grãos das regiões Norte e Centro-Oeste. Os técnicos do Ipea sustentam que a soja na região da floresta amazônica aumenta o custo da terra e afasta da região os agricultores, madeireiros e pecuaristas que, sem recursos tecnológicos e infra-estrutura, são os verdadeiros responsáveis pela derrubada da mata. O que não está explicado é de que forma esta agricultura itinerante e de baixo nível tecnológico conseguiu, sozinha, desmatar 7 milhões de hectares de floresta amazônica no período analisado pelo documento.

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