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Guia orienta produção sustentável no Cerrado

O Guia de Conduta Ambiental tem como objetivo servir como referência para o desenvolvimento de mecanismos financeiros


Foto: Marcel Oliveira

Para auxiliar que a expansão de soja aconteça de forma livre de desmatamento no Cerrado e facilitar o desenvolvimento de produtos financeiros com este foco, a organização ambiental The Nature Conservancy (TNC) anuncia hoje o lançamento do Guia de Conduta Ambiental (Environmental Framework), que visa harmonizar critérios ambientais em instrumentos financeiros, servindo de referência aos financiadores e investidores da cadeia de soja que queiram criar ou adaptar seus mecanismos financeiros com impacto positivo no bioma.

Credores e financiadores passam a contar com o Guia para impulsionar a agenda de investimentos e negócios sustentáveis, podendo aumentar o acesso a novas fontes de financiamento, como fundos catalíticos e de mitigação de risco (de-risking), desenvolver novas oportunidades de negócios, além de contar com os benefícios reputacionais associados à conservação do bioma.  O Guia de Conduta Ambiental também busca gerar benefícios aos produtores, como a redução das perdas de produtividade atribuídas aos efeitos do desmatamento, melhores condições de financiamento e a possibilidade de acesso a mercados com requisitos ambientais mais exigentes.

“As mudanças climáticas causadas pela ação humana impactam o meio ambiente, influenciando a probabilidade e a severidade de eventos climáticos extremos, como secas, chuvas intensas, ondas de calor e outros”, afirma Rodrigo Spuri, diretor de conservação da The Nature Conservancy (TNC) Brasil. O especialista explica que aliar a natureza à produção é o caminho para benefícios de longo prazo. “Apenas neste cenário, com a valorização da natureza, é que o Brasil será uma potência sustentável e exemplo para o mundo”, conclui.

“Instrumentos financeiros customizados, como financiamentos de menor custo e maior prazo, podem incentivar o modelo de expansão livre de desmatamento, ou seja, preservando a vegetação nativa, ao mesmo tempo que e respondem à crescente demanda por práticas produtivas mais sustentáveis”, afirma Anna Lucia Horta, gerente de negócios e investimentos na TNC Brasil.

Para isso, o Guia oferece, de maneira clara e objetiva, a harmonização dos critérios ambientais obrigatórios e desejáveis que irão possibilitar a produção de soja sem desmatamento, além de ferramentas de apoio para identificação de regiões prioritárias para expansão da soja sem desmatamento, e uma calculadora de carbono que estima o desmatamento esperado e as emissões evitadas associadas à ele para cada município do Cerrado.

“O Guia de Conduta Ambiental não é uma certificação ou uma fonte de recursos para investimentos ou financiamentos”, esclarece Anna Lúcia. “Ao harmonizar os critérios associáveis às boas práticas ambientais, buscamos facilitar a adoção de produtos ambientalmente adequados por financiadores e investidores, o que também beneficia os produtores, que saberão qual é a demanda do mercado financeiro”, completa.

Os três critérios obrigatórios são:

Conformidade legal: é necessário que todas as propriedades do produtor estejam de acordo com a legislação, trabalhista e ambiental, e também com o Código Florestal - não se limitando apenas à fazenda que está sendo financiada;

Data de referência para conversão zero: nenhum registro de desmatamento ou conversão (legal ou ilegal) depois de janeiro de 2018 e até o final da vigência do empréstimo ou investimento, na propriedade financiada;

Irrigação: se existente ou previsto, o sistema de irrigação deve considerar o estresse hídrico crescente em diferentes localidades do Cerrado.

O Guia ainda considera cinco requisitos adicionais que os credores podem incorporar de diferentes formas nas suas linhas de crédito, possibilitando metas ambientais ainda mais ambiciosas. Os critérios extras incluem:

Data referência para todas as propriedades: nenhum registro de conversão de vegetação nativa em todas as propriedades do produtor, o que possibilita menor exposição a riscos e também expande o mecanismo para outras áreas livres de desmatamento;

Priorização espacial: o requisito incentiva investimentos e empréstimos em áreas do Cerrado que estão mais ameaçadas de conversão futura, aliados ao estoque de pastagem apto para soja em cada município e o potencial produtivo em cada região. O Guia inclui uma lista de referência de municípios onde a conservação terá impacto ainda maior, considerando esses critérios;

Boas práticas agrícolas: é fortemente recomendado que os mecanismos financeiros considerem a adoção de boas práticas agrícolas no seu escopo e cálculo do investimento. Esses procedimentos trazem benefícios ambientais (como conservação de solo, aumento da infiltração da água, entre outros), além do aumento na produtividade e na rentabilidade. Investidores ou os credores podem pedir certificados ou outras evidências fornecidas pelo produtor;

·         Conflito de terra: além da exigência legal de título de terra e/ou contrato arrendamento, é recomendável que se verifique conflitos de terra extra-judiciais e que podem ser identificados em lista publicada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e em publicações na imprensa;

·         IFC Performance Standards (IFC PS): os financiadores também podem optar por seguir os IFC PS, padrões internacionais para avaliação e gestão de risco socioambiental frequentemente usados por investidores e credores para promover as melhores práticas. A conformidade com os itens anteriores já completa em grande parte dos IFC PS, sendo sua completude opcional.

A conformidade legal, em adição ao requisito de não desmatamento e uma combinação customizada dos elementos adicionais atuam ainda como fatores mitigadores de risco para os financiadores, por exemplo, minimizando a quebra de safra relacionada a efeitos climáticos regionais e a consequente inadimplência. “Desta forma, o documento busca estimular um ciclo virtuoso de rentabilidade e conservação, ao permitir que o financiador possa, eventualmente, oferecer condições ainda mais vantajosas para os produtores que adotarem melhores práticas ambientais”, declara Anna Lúcia.

 

O Guia de Conduta Ambiental foi desenvolvido pela TNC e, com apoio da SITAWI, passou por um extenso processo de consulta com mais de 120 profissionais de quase 40 instituições, representantes de diversos setores interessados na cadeia de soja, como empresas, bancos, produtores, instituições financeiras, academia e outras ONGs.

 

Cenário do setor

O Brasil é o maior produtor e exportador de soja do mundo. Para atender à crescente demanda global para os próximos dez anos estima-se que a área de cultivo de soja deve expandir em 7,3 milhões de hectares no Cerrado, segundo análises da Agroicone. Dados da TNC mostram que o bioma tem mais de 18,5 milhões de hectares já abertos adequados à produção de soja, área mais do que suficiente para abarcar o crescimento esperado sem a necessidade de conversão adicional de vegetação nativa.

 

“Não há necessidade de derrubar uma única árvore para expandir a produção de soja no Brasil, já que o Cerrado tem uma área aberta que corresponde a mais que o dobro do necessário para atender à crescente demanda do mercado. A expansão sobre áreas abertas, além dos benefícios ambientais, não deve acontecer sobre áreas ocupadas por comunidades locais e tradicionais, mas sim respeitando a diversidade cultural e social dos territórios”, afirma Spuri. “A agricultura e a natureza estão diretamente relacionadas e está cada vez mais claro que os diversos atores da cadeia, como produtores, traders, setor financeiro e compradores internacionais, precisam trabalhar juntos para encontrar mecanismos e incentivos que permitam conciliar a produção agrícola com a conservação da natureza”, conclui.

 

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