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Liberação de milho OGM depende agora de consultas públicas

A CTNBio havia se reunido em novembro para votar a liberação do milho, mas adiou a decisão em virtude de pedido de diligência


Pedido de diligências feito por cientistas do CTNBio já havia adiado votação do processo no dia 23 de novembro. Lançado no mercado em 1995, o milho LibertyLink (T25), variedade transgênica desenvolvida pela Bayer CropScience, está em análise para aprovação no Brasil há quase dez anos. A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) havia se reunido no dia 23 de novembro, em Brasília, para votar a solicitação da empresa, mas adiou a decisão em virtude de pedido de diligência feito por cientistas do órgão.

No dia 5 último, entretanto, acatando ação civil pública impetrada em outubro conjuntamente pelas ONGs Terra de Direitos e AS-PTA, pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e pela Associação Nacional de Pequenos Agricultores (ANPA), que congrega cerca de 80 mil associados em todo o País, o Tribunal Regional Federal da 4 Região (Curitiba, PR) suspendeu qualquer decisão da CTNBio sobre o assunto até que se proceda a audiências públicas.

A ação se baseou no princípio constitucional segundo o qual não se pode negar ao cidadão o direito de participar de decisões que o afetem diretamente, sobretudo no que se refere a questões ambientais.

Durante a reunião realizada em Brasília, a decisão do CTNBio de não realizar audiência pública a respeito da liberação do LibertyLink não agradou ao Greenpeace. "Não é aceitável que uma variedade transgênica seja liberada para consumo humano sem que exista uma consulta à população. Essa é uma decisão que afeta a vida de todos os brasileiros, sejam eles agricultores ou consumidores, e a sociedade civil deve ter o direito de opinar", protestou, na ocasião, Gabriela Vuolo, coordenadora da campanha de engenharia genética da ONG ambientalista.

A coordenadora institucional do Idec, Marilena Lazzarini, acredita que não há justificativa para que a CTNBio não amplie o debate sobre o tema, o que só contribuiria para uma decisão mais abalizada por parte do órgão. "Há diversos aspectos no processo de liberação comercial do milho transgênico que precisam ser mais bem discutidos pelos cientistas que não participam da CTNBio e pela sociedade em geral", diz.

Gabriel Fernandes, integrante da AS-PTA, ressalta a insistência de alguns membros da CTNBio em não demonstrar transparência nas suas decisões como fator determinante para que as entidades recorressem à Justiça. "Eles resistiram a mecanismos legais como a presença do Ministério Público e a realização de audiências públicas", ressalta.

Segundo o Greenpeace, que no dia 21 de novembro realizou um protesto em frente à sede da Bayer CropScience, em São Paulo, com o objetivo de "pressionar a empresa a retirar o pedido de liberação comercial do seu milho transgênico resistente ao agrotóxico glufosinato de amônio, que pode causar náusea, diarréias e até aborto", agora a empresa deverá prestar esclarecimentos, respondendo a cerca de 40 perguntas formuladas pelos cientistas. "A CTNBio também solicitou, pela terceira vez, que a Bayer CropScience traduza todos os documentos que fazem parte do seu pedido, conforme determina a legislação brasileira."

Gabriela Vuolo destaca o fato de que algumas questões levantadas pela CTNBio são bastante semelhantes às que o Greenpeace encaminhou para a empresa. "A Bayer CropScience não respondeu ao Greenpeace, mas terá de esclarecer à CTNBio todos os detalhes sobre os riscos dessa modalidade de milho transgênico." Para Vuolo, a CTNBio, em relação à diligência, adotou o princípio da precaução e do bom senso: "Esperamos que isso continue guiando as decisões do órgão".

O Greenpeace encaminhou à CTNBio três documentos sobre os possíveis conseqüências para a saúde e para o meio ambiente da liberação do LibertyLink. O primeiro é um relatório publicado em outubro pelo Ministério da Saúde da Áustria, onde o milho transgênico resistente ao glufosinato de amônio está proibido desde 1999. O segundo documento é um relatório elaborado em 2001 pela ONG Amigos da Terra no Reino Unido, onde a liberação comercial havia sido solicitada e foi retirada pela própria empresa. O terceiro, produzido pela European Food Safety Authority (EFSA), relata os impactos dos resíduos do agrotóxico.

Os documentos informam que a quantidade de resíduos de agrotóxico no LibertyLink é muito maior que no milho convencional, podendo causar sérios riscos à saúde. Mais dois dados relevantes: a possibilidade do surgimento de plantas daninhas resistentes ao agrotóxico e da contaminação de lavouras convencionais pelo milho transgênico.

Ventura Barbeiro, integrante da campanha de engenharia genética do Greenpeace, diz que a ONG está solicitando ao CTNBio e ao governo federal que levem em conta as evidências apresentadas e sigam o princípio da precaução. "O que está em jogo é a saúde do povo brasileiro, a segurança do nosso meio ambiente e a agricultura familiar", diz.

Rotina

Em entrevista a este jornal, o gerente de tecnologia da área de ciências da Bayer CropScience, André Abreu, ressaltou, em face da diligência solicitada, que o processo de decisão comercial baseia-se em aspectos técnicos e envolve várias rodadas de esclarecimento do órgão regulador. "Isto é rotina natural para submissão de produtos à aprovação, o que ocorre também em outros países. Questões complementares são um indicador positivo de que o processo está em análise e progredindo", diz.

Abreu informa que foram solicitadas explicações mais detalhadas que recaem basicamente sobre dois aspectos: a caracterização da seqüência genética no milho e o manejo de plantas daninhas com a tecnologia. "Este último item é o mais evidenciado; busca-se compreender as práticas de uso para longevidade e sustentabilidade da tecnologia, caso seja aprovada", destaca.

Ele mostra otimismo com relação à liberação do milho transgênico da empresa, manifestando, contudo, incerteza no que se refere à possibilidade de haver ainda uma outra rodada de esclarecimento solicitada pela CTNBio. Quanto aos benefícios ao consumidor, Abreu ressalta o fato de que o milho transgênico, se comparado ao milho tradicional, tem o mesmo valor nutricional, sabor e textura. "Atualmente, o consumidor deseja cada vez mais produtos manejados de forma ambientalmente sustentável e acreditamos que nosso produto pode atender essa demanda."

Ele aponta pesquisa recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais, segundo a qual o fator que mais assegura a manutenção dos preços acessíveis dos alimentos tem sido o melhoramento genético das sementes utilizadas na lavoura. Elas aumentam a produção por hectare e requerem menos terra nova para abastecer a crescente demanda.

A questão ambiental, segundo Abreu, também foi levada em consideração quando do desenvolvimento da tecnologia. "Note que o produto é uma variedade de milho que cresce e produz como centenas de outras variedades cultivadas; a diferença é que dá ao agricultor a opção de eliminar plantas daninhas, substituindo herbicidas antigos por um produto moderno, altamente biodegradável e que não deixa resíduo no solo ou na água."

A empresa ressalta que o milho LibertyLink "foi reconhecido como seguro por várias autoridades regulatórias no mundo e aprovado pelos mais rigorosos órgãos internacionais; o cultivo e o consumo do milho LibertyLink são autorizados na Europa, nos EUA, no Canadá, no Japão e na Argentina, entre outros países".

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