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Manga brasileira ainda está longe do Japão


No shopping Mitsukoshi de Ganzi, no centro de Tóquio, os consumidores que se apertam no setor de frutas parecem habituados aos mesmos produtos e ao preço caro: uma manga bonita e grande da Austrália é vendida a US$ 16, outra menor e quase enrugada das Filipinas custa US$ 4, uma papaia do Havaí está fixado em US$ 12, um abacate do México ou a laranja da Califórnia têm o mesmo preço de US$ 2,5. A grapefruit de Cuba é vendida a US$ 3,3 a unidade. Nas prateleiras de frutas japonesas, o famoso melão local é campeão da carestia e dos desejos: custa a fortuna de 10 mil yens, equivalente a US$ 83, que geralmente é oferecido como presente numa elegante caixa de madeira.

Aqui só não tem frutas brasileiras, apesar de o Brasil ser o maior produtor mundial tropical. Faz 20 anos que o Pais tenta exportar manga ao mercado japonês. Mas as autoridades em Tóquio postergam a decisão de dar ao produto brasileiro o Japan Agricultural Standard (JAS).

Portas abertas

O Japão importa US$ 36 bilhões de alimentos/ano. As importações de frutas ficam por volta de US$ 2,6 bilhões. No caso das mangas, as compras no estrangeiro chegam a US$ 25 milhões anuais, com as Filipinas fornecendo 60% e o México 27%. Para o Brasil, porém, a briga da manga é um caso-chave que vai bem além do valor de exportação.

O País quer aumentar a exportação de frutas, que hoje fica em apenas US$ 240 milhões, cinco vezes menor do que os US$ 1,2 bilhão exportados pelo Chile. Se um dia a manga brasileira receber sinal verde no Japão, a significação é mais ampla: abrirá a porta a outras frutas no mercado mais exigente do mundo em termos de defesa sanitária, e por tabela no resto da Ásia.

Para fontes japonesas, está na hora de o Brasil mudar de estratégia e fazer campanha junto aos importadores e não ao governo. Além disso, se um dia puder exportar, seus produtores não deve alimentar ilusões de obter preços compatíveis com os cobrados nos supermercados. O que se vê nas lojas é resultado de uma rede gigantesca de intermediários, que o governo japonês tenta combater.

Anos de tentativas

A tentativa brasileira para exportar frutas para o Japão é uma novela que começou há 27 anos. O plano em 1976 era de exportar papaia. Mas logo os exportadores bateram de frente com as restrições sanitárias japonesas, que se diziam inquietas com a existência no Brasil da "mosca do mediterrâneo" como é chamado o popular "bicho de goiaba". Essa praga levou o Japão a banir a entrada de todas as frutas brasileiras, com exceção de banana e de abacaxi.

Na época, o Japão permitia importação proveniente de países que tratavam a fruta com um gás chamado etileno. A fruta passava pela câmara de fumigação para matar larvas do bicho da goiaba.

O Ministério da Agricultura do Brasil chegou a fazer uma instalação-piloto de fumigação de frutas no Aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP). Mas logo os Estados Unidos baniram esse tipo de tratamento e os japoneses copiaram a restrição americana.

A partir daí, quem quisesse exportar frutas para o Japão precisava cumprir a exigência de tratamento por imersão em água quente. Surgiu para os exportadores brasileiros uma dificuldade adicional: como a distância é muito grande entre o Brasil e o Japão, a imersão reduzia a longevidade da fruta, que apodrecia rapidamente.

A Defesa Sanitária do Brasil se debruçou então na busca de uma tecnologia de tratamento das frutas. E quis imitar o tratamento de esterilização dos machos da "mosca do mediterrâneo". Nova recusa japonesa, alegando que a esterilização era feita através de radiação. Isso é algo que não suportam ouvir, e menos ainda envolvendo alimentos.

Entretempos, México, Tailândia e Filipinas adotaram todas as exigências nipônicas e começaram a exportar papaia, conquistando fatias crescentes do mercado japonês.

A partir de 1992, o Brasil mudou sua prioridade exportadora: ao invés da papaia, focalizou os esforços para exportar manga. Isso por duas razões: o País produzia manga o ano inteiro, com as safras do Sul e do Nordeste, e tinha qualidade indiscutível. Para evitar os mesmos problemas enfrentados com o papaia, o Ministério da Agricultura resolveu se submeter ao sistema de imersão da fruta exigido pelos japoneses.

Audiência pública

A Universidade de São Paulo (USP) fez todos testes sanitários exigidas pelas autoridades de Tóquio. Há mais de 10 anos que foram cumpridas todas exigências nipônicas. Mas a manga brasileira continua proibida de entrar no Japão.

A explicação oficial em Tóquio é que falta o governo japonês fazer uma "audiência pública" sobre a importação da fruta brasileira. É quando ouvem a sociedade civil, importadores, consumidores para discutir se o Brasil cumpriu com as exigências ou não e decidir então sobre o sinal verde.

Mensagem idêntica

Na semana passada, ao visitar Tóquio, o ministro brasileiro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Roberto Rodrigues, recebeu a mesma mensagem de sempre: a autorização para a exportação pode estar próxima.

As postergações japonesas geram histórias curiosas. Quando assumiu a embaixada brasileira em Tóquio, o primeiro telegrama diplomático que o embaixador Ivan Canabrava recebeu foi sobre o caso da manga. Curiosamente, era quase idêntico ao último telegrama que ele mesmo redigira vinte anos atrás, na sua primeira passagem pela embaixada em Tóquio.

"Mas o Brasil precisa mudar sua estratégia", diz uma fonte japonesa. "Os brasileiros estão fazendo do caso da manga um cavalo de batalha e há constrangimentos oficiais. É preciso que a briga seja feita pelo setor privado para impulsionar os importadores japoneses a pressionarem internamente. É assim que funciona no Japão."

Hoje, o Brasil só pode exportar banana e abacaxi. No caso da banana, não compensa, porque leva 40 dias para chegar. Além disso, o Brasil é um dos maiores produtores, mas consome muito e sobra pouco para exportar.

Quanto ao abacaxi, um empresário brasileiro teve a idéia de mandar o abacaxi em caixa para ser oferecido como presente e tem sido bem-sucedido, mas as exportações da fruta ainda estão limitadas ao período natalino.

kicker: Receita do País com exportações de frutas atinge US$ 240 milhões, inferior à renda obtida pelo Chile.

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