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OPINIÃO: soja transgênica ainda causa polêmica


É muito cabeluda essa questão dos transgênicos, contaminada pela tendência à polarização nos debates. No caso da soja - e por enquanto é principalmente dela que se trata no Brasil, pelo menos oficialmente - o que se vê é isso: agricultores de um lado (só no Rio Grande do Sul são 150 mil), cegos a tudo quanto não seja o lucro em dinheiro, o que é visto como “pragmatismo”; ambientalistas do outro, com discursos que prenunciam prejuízos ao meio ambiente, o que é visto como postura puramente ideológica.

Perdido nessa balbúrdia, um terceiro lado está sendo esquecido: o do consumidor. Para o neuropsiquiatra Juarez Calegaro, trata-se de algo mais do que esquecimento. Ele aponta: a CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) que cuida da questão da soja transgênica é formada por dois representantes da área da saúde, dois da agricultura, dois da tecnologia e outros dois do empresariado.

Na opinião do médico isso permite que se conclua: a saúde “é voto vencido” dentro da comissão. No campo, a resistência dos produtores diante do termo que os obriga a rotular o produto transgênico destinado ao consumo é intrigante, provocando a suspeita de que existe aí uma tentativa de empurrar o produto goela abaixo do consumidor. Os produtores reivindicam liberdade para plantar, colher e vender - isso lhes foi garantido através da MP 131 para a próxima safra - mas não querem o direito de escolha para quem consome.

Há cúmplices involuntários desse comportamento na população. São as pessoas abertas a tudo quanto surge de novo no horizonte, como pode ser observado nos supermercados. Quando abordadas por algum demonstrador que oferece “um suco derivado da soja”, nem lhes ocorre perguntar de que soja se trata.

Mas também há os que, embora minoria, preferem a cautela devido à falta de informações sobre como o consumo do produto geneticamente modificado é absorvido pelo organismo e o que poderá produzir nele. Estes querem uma resposta clara e sem rodeios a uma pergunta também clara e sem rodeios: a soja transgênica faz mal ou não ao corpo humano? A resposta não vem.

Quem deveria esclarecer a opinião pública, até porque lida diretamente com a pesquisa, produz mais confusão. Em grande parte isso acontece porque as autoridades em biossegurança do País não descem do pedestal técnico-científico em suas entrevistas aos meios de comunicação. Parece que baniram de vez a linguagem acessível ao leigo, que, ou passa batido, ou fica com um nó na cabeça, tentando encontrar o significado de explicações que defendem, por exemplo, o fortalecimento do “mamão contra o vírus fatal do mosaico” através da “capa protéica da mancha anelar”. Afinal, que diabo de coisa é isso?

Faz algumas semanas, a revista Dinheiro (da Editora Três) publicou matéria sobre a manipulação genética que a Embrapa vem fazendo, há alguns anos, com feijão, mamão e tabaco. Otimistas, os pesquisadores contam que têm na estufa um tipo de soja transgênica que pode liquidar o câncer de mama com o anticorpo SCFU. Maravilha!! Mas o entusiasmo do leitor morre nas próximas linhas e se defronta com a controvérsia no final da matéria.

O problema é que a eficácia da descoberta ainda não foi testada, o que só vai acontecer a partir de janeiro de 2004, tendo o camundongo como cobaia. Além disso, o último parágrafo da reportagem traz uma advertência atribuída a Maria José Amstalden Sampaio, “maior especialista em biossegurança do País” e também funcionária da Embrapa.

Segundo a revista, ela “acha que a produção de medicamentos não deveria ser feita com alimentos ingeridos pelo homem, mas com plantas fora da cadeia alimentar, como o tabaco”. E textualmente: “Há muita histeria sobre produtos inofensivos e nenhuma atenção sobre o verdadeiro perigo”.

De que perigo ela está falando? Maria José Sampaio se encontra nos Estados Unidos onde participa da reunião do programa Harvest Plus que procurará aumentar o teor de ferro, zinco e beta caroteno nos alimentos dos mais pobres da África, Ásia e América Latina.

Advertências que devem ser consideradas

As pessoas que se preocupam com sua alimentação e que não freqüentam os laboratórios de pesquisa sentem, diante da novidade, um medo que se alimenta de lições do passado. Temem, por exemplo, que se repita o que aconteceu com os agrotóxicos.

Extremamente eficientes na lavoura, eles viraram tema de livros como Primavera Silenciosa, de Rachel Carson, e O Futuro Roubado, de Theo Colborn e John Peterson Myers (da L&PM e à venda na Feira do Livro), que denunciam conseqüências ao ser humano - entre elas anomalias estruturais e redução do número de espermatozóides -, causadas pelos agentes químicos.

Os cautelosos perguntam: o quê e quem pode garantir que o alimento transgênico não faz mal? Esta semana o diretor da Monsanto no Brasil, Rodrigo Lopes de Almeida, admitiu que a empresa errou “pois esqueceu do consumidor” quando desenvolveu seus alimentos transgênicos. “Estamos aqui fazendo mea-culpa”, disse.

Segundo o neuropsiquiatra Juarez Calegaro, em ocasião anterior, “a Monsanto admitiu que a variedade de soja transgênica plantada pela empresa no Brasil, conhecida como RR” (Roundup Ready), “produz uma deficiência de 30% em tripsina”. E ele decodifica: “A tripsina é uma enzima que faz a digestão do glúten, proteína do pão, e da caseína, proteína do leite, que a gente encontra no cérebro dos esquizofrênicos”.

O médico explica que o acúmulo do glúten e da caseína no cérebro causa agitação noturna, “porque à noite predomina um derivado do glúten e da caseína que funciona como anfetamina. A pessoa fica como se estivesse drogada, com insônia, com agitação psicomotora, ansiosa e agressiva”. Calegaro acrescenta que “é esse tipo de gente que se vê à noite fazendo barulho, brigando, aumentando o número de acidentes de trânsito e, no dia seguinte, aumentando o índice de depressão suicida”, entre outros problemas.

Em rápido contato pelo telefone, a cientista Helena Zanettini, do Departamento de Genética da UFRGS (Universidade Fedral do Rio Grande do Sul), reitera que a manipulação genética de plantas não é coisa nova no mundo. Aliás, quem deu o primeiro passo nessa direção foi o monge austríaco Gregor Mendel, com ervilhas, em 1860. De qualquer forma, o avanço que se verifica hoje traz algumas preocupações. Uma delas é até que ponto uma banana que contenha vacina contra doenças infantis, por exemplo, pode ser liberada para o consumo sem controle.

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