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Rui Prado alerta para desequilíbrio por trás dos bons resultados do agronegócio

“Os números vão bem, mas as pessoas que geram boa parte desses números, não”, alerta presidente da Famato


À frente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato), o médico veterinário Rui Ottoni Prado tem sido persistente na tentativa de mostrar à sociedade a importância da atividade agropecuária e os impactos sociais por ela causados. Presidindo a entidade representativa com maior poder de mobilização em Mato Grosso, estado destaque no agronegócio nacional e internacional, Prado divide sua agenda entre as articulações políticas
em Brasília e os encontros técnicos com órgãos públicos. Na pauta, temas estratégicos como questão fundiária, custos de produção, logística e renda agrícola – esta última eleita o tema central da terceira edição da Bienal dos Negócios da Agricultura, evento realizado pela Famato de 19 a 21 de agosto em Cuiabá.

Nesta entrevista, Rui Prado – que planta soja e milho e é pecuarista em Campo Novo do Parecis – explicita as bases do trabalho feito frente à Famato e destaca a atenção dada aos aspectos “gerenciáveis pelo produtor”, como é o caso da gestão da propriedade. E alerta: “as pessoas que geram os bons números da agricultura é que estão em dificuldade”.

Bienal: O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) recentemente divulgou um estudo que detalha o crescimento da agricultura brasileira de 1975 a 2008. A expansão dessa atividade econômica se deve ao aumento da abertura de áreas ou ao aumento da produtividade?

Rui Prado: Sem dúvida se trata de aumento de produtividade. Hoje somos bem mais eficientes. Mesmo em termos mundiais o Brasil está na liderança com a maior taxa de crescimento de produtividade, que foi de 3,66% ao ano, ao passo em que na China a taxa foi de 3,2% e nos Estados Unidos, de 1,95%. E isso só foi possível porque a agricultura brasileira, e a mato-grossense mais especificamente, é baseada na adoção de inovações tecnológicas. Tanto que na safra 07/08 Mato Grosso respondeu por 20% da produção nacional de grãos, enquanto esse percentual foi de 9% no ciclo 94/95. Usamos muita pesquisa, vamos atrás de melhoramento genético, buscamos novas cultivares. Isso fez com que esse aumento de produtividade mantivesse baixos os preços dos alimentos que chegaram ao consumidor nos últimos 15 anos.

Bienal: Então o cenário atual é mais positivo?

Rui Prado: Sim, houve ganhos, a agricultura brasileira se diversificou, conseguiu se posicionar no mercado internacional e hoje segura as contas nacionais. Não há dúvida quanto a isso. É uma atividade essencial para a economia brasileira. Somos os maiores produtores de soja, algodão, milho safrinha e girassol, os segundos em sorgo e os terceiros na produção de arroz. Mas não só: onde houve expansão agrícola, houve abertura de cidades, houve urbanização e melhoria na qualidade de vida. A agricultura como atividade econômica está consolidada. O que nos chama atenção hoje, o que nos leva para o debate é a situação do agricultor. O que vemos é que famílias tradicionais no cultivo estão largando o campo e mudando de área. Muitos fazendeiros estão abrindo mão de suas propriedades, e arrendando suas terras para grupos comerciais nacionais e até mesmo internacionais. Os números vão bem, mas as pessoas que geram boa parte desses números, não.

Bienal: Qual a razão para isso?

Rui Prado: Bem, temos um bom clima, usamos tecnologia de primeiro mundo e, via de regra, temos vocação e paixão pela terra. Com a safra 08/09, ultrapassamos o Paraná e nos tornamos o maior produtor de grãos e fibras do país, com mais de 27 mil toneladas produzidas. Mas há alguns anos a cadeia produtiva revela um desequilíbrio em um dos seus elos. O produtor mato-grossense, que hoje responde pela maior safra de soja e algodão do país, está acumulando prejuízos ao longo dos anos, por questões conjunturais principalmente. Na maioria dos casos, aquilo que é possível gerenciar, o produtor consegue equilibrar. Mas questões não controláveis, como o câmbio e a macroeconomia, interferem diretamente nos nossos negócios. Hoje, a atividade de ‘plantar’, está cada dia menos atrativa. E a tendência, contra a qual a nossa entidade luta diariamente, é de que, reduzindo-se o volume de hectares cultivados, a produção venha a encolher. Isso pode significar a médio prazo menor oferta dos produtos agrícola, e conseqüentemente maiores
preços.

Bienal: E o que as entidades de classe, como a Famato, estão fazendo para superar esse cenário? Ou essa é uma situação irreversível?

Rui Prado: Uma de nossas bandeiras é a busca por mais renda no campo. E restaurar a renda no campo, veja bem, não tem nada a ver com inflacionar preços. O aumento da renda no campo passa por levar a informação necessária ao produtor para que ele possa gerir bem sua fazenda. É dar as ferramentas para que o agricultor saiba como, de quem e quando comprar seus insumos. É tentar melhorar ao máximo aquela parte que podemos gerenciar, para que os efeitos do que não podemos controlar sejam mínimos. É por isso que queremos discutir as formas de financiamento da produção, é por isso que queremos ser ouvidos sobre as leis ambientais. É por isso que nos preocupamos com a questão fundiária. Acredito que estamos fazendo nossa lição de casa dentro da porteira. Mas ainda há muitos aspectos fora da propriedade que não dependem exclusivamente de nossa atuação. Aí entra a atuação política das entidades, no sentido de levar o ponto de vista do produtor e tentar se fazer ouvir.

Bienal: E que tipo de impacto se pode esperar de eventos como a Bienal dos Negócios da Agricultura?

Rui Prado: Este evento, em especial, pauta muitas das nossas ações futuras. Neste ano, em que o tema é “renda agrícola”, vamos agregar todas as vertentes que levam a atividade à obtenção de mais rentabilidade. Os assuntos que serão debatidos aqui, que vão de mercado à logística, têm razão de ser em qualquer parte do país, e é por isso que a Bienal vem conseguindo reunir produtores e especialistas não apenas de Mato Grosso, mas do Centro-Oeste, do Brasil e até de fora. A Bienal, mesmo antes de começar, já cria um clima de expectativa por mais aprendizado. Em 2007, já víamos que era um evento consolidado, porque atende a demanda por informação e qualificação. Afinal, aquela imagem antiga do produtor rural não casa mais no contexto atual: o agricultor mato-grossense é moderno, está informatizado e acompanha as tendências do mercado. Mas isto só não basta. A linha tênue que separa a boa renda do prejuízo depende de uma gestão adequada da propriedade, mas também de outros fatores sobre os quais os produtor sozinho não consegue interferir. É aí que entra o trabalho das entidades representativas, promovendo eventos como a Bienal para que estes assuntos possam ser discutidos num âmbito globalizado e com quem interessa, com quem pode decidir.

As informações são da assessoria de imprensa da Bienal dos Negócios da Agricultura.

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