Moinhos brasileiros acusam argentinos de adicionar sal para vender produto com taxa menor. Os moinhos de trigo da Argentina atuam de forma fraudulenta na exportação de farinha e de pré-misturas para o Brasil, segundo informam empresários brasileiros. Para driblar a taxa de 20%, imposta pelo governo argentino nos embarques de trigo em grão e farinha de trigo, os moinhos passaram a adicionar 0,3% de sal na composição da farinha. Com isso, as indústrias do país vizinho embarcam e vendem a farinha como se fosse pré-mistura (produto que contém farinha de trigo e fermento, para a elaboração de pães e massas), que possui imposto de apenas 5%.
Os indícios de que os moinhos de fato estão atuando de forma irregular podem ser observado nos volumes de farinha e pré-mistura que entraram no Brasil ao longo do ano. De janeiro a outubro de 2002, as exportações de pré-mistura argentina para o Brasil cresceram numa proporção de 1.600%, de 1,13 mil toneladas no primeiro mês do ano para 19,44 mil toneladas no mês passado. Já os embarques de farinha recuaram 96%, caindo de 15,71 mil toneladas em janeiro para apenas 634 toneladas em outubro.
"Tal medida faz com que haja concorrência desleal com nossos moinhos, já que os argentinos ampliam a oferta de farinha no mercado interno e conseguem vender a um preço inferior ao nosso, e de uma forma ilegal", diz Roland Guth, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Trigo (Abitrigo).
Guth informa que um produto como a pré-mistura, que tradicionalmente tem preço 30% superior ao da farinha, custava em fevereiro US$ 247,74 por tonelada, 40,8% superior aos US$ 175,92 por tonelada da farinha. Já em outubro, a tonelada da pré-mistura saía por US$ 215,74, preço 8,3% inferior aos US$ 235,02 por tonelada da farinha no mesmo período.
Medidas judiciais
Tal situação fez com que a Abitrigo entregasse ontem ao Ministério das Relações Exteriores um documento exigindo medidas para combater a atuação fraudulenta dos moinhos argentinos. "Nos reunimos com autoridades do Itamaraty e da Argentina solicitando que fosse corrigido o assunto." Segundo Guth, os representantes da Argentina só se comprometeram em estudar o assunto. As indústrias brasileiras informaram que procuram por medidas judiciais como forma de barrar as exportações nessas condições.
"O que espanta é o fato de o governo argentino permitir esse tipo de fraude e o governo brasileiro permanecer inerte à situação", diz Lawrence Pih, presidente do Moinho Pacífico. Segundo ele, a concorrência desleal faz com que moinhos brasileiros parem de operar e passem a afetar os produtores nacionais, já que "os moinhos argentinos não compram nosso trigo."
Fontes do mercado informaram que nas regiões Centro-Oeste e Nordeste, os moinhos já deixaram de processar o grão e estão comprando a farinha argentina e revendendo no mercado interno. "Fui oferecer trigo para um cliente e ele me disse que não iria comprar pois não valia mais a pena concorrer com o produto da Argentina", diz a fonte, ao lembrar que o percentual de sal adicionado na farinha é muito pequeno e não altera as propriedades do produto.
Preços em queda
As cotações do trigo argentino em novembro estão abaixo das estimativas do mercado. Em outubro, moinhos e traders brasileiros apostavam que a tonelada do grão do país vizinho fosse negociada a US$ 160. A média que vem sendo registrada em novembro, no entanto, é de US$ 150 a tonelada, com a possibilidade de cair até US$ 148.
Os preços elevados que marcaram o trigo nos últimos meses fez com que a Argentina enfrentasse a concorrência de países da Europa, como França, Ucrânia e Rússia em mercados como Oriente Médio e Egito. Tradicionalmente, a Argentina exportava para o Brasil cerca de 600 toneladas por mês e 200 toneladas para outros destinos.
Com a alta nos preços os embarques para moinhos brasileiros caíram para 500 toneladas enquanto outros países trocaram de fornecedor. "O Brasil passou a ser o único mercado da Argentina", diz Pih.
Alexandre Inacio