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Citricultura: demanda por fertilizantes e defensivos agrícolas na era pósdesvalorização


Evaristo Marzabal Neves

O artigo “Laranja: impactos nos custos de produção” de A.A. Ghilardi, M.L. Maria e
J.D. de Negri (Revista Agroanalysis, FGV, v.25, n.3, março 2005, p.20-21) revela a
participação relativa de serviços e usos dos fatores de produção no custo
operacional/hectare (300 pés) de laranja para a indústria nas Regiões Norte e Sul do Estado
de São Paulo. No custo operacional efetivo são considerados os desembolsos relativos à
mão-de-obra, operações de máquinas, adubos e corretivos, defensivos, outros materiais e
colheita. Em termos relativos, desagregando por item no custo operacional efetivo, os
fertilizantes corresponderam a 20,8% e 22,4% das despesas nas regiões Norte e Sul,
respectivamente, enquanto que os defensivos agrícolas responderam por 34,5% e 30,5%.
Tem-se, portanto, que estes insumos representaram 55,3% e 52,9% do custo operacional
efetivo para a laranja nas regiões norte e sul do Estado de São Paulo, respectivamente.
Desta forma, se incluídas as operações de máquinas (adubação, pulverização, etc.),
denota-se que a citricultura paulista se caracteriza por ter sistemas de produção capital
intensivos, onde se destacam os gastos com defensivos e fertilizantes.
Neste sentido, é interessante verificar a demanda brasileira total por estes insumos e a
demanda relativa (consumo médio por hectare), em que se tem uma aproximação do uso de
fertilizantes e defensivos na citricultura brasileira. As considerações, a seguir, tratam de
uma aproximação, já que para a demanda relativa são efetuados o cruzamento e relação de
dados obtidos de fontes diferentes. Para a demanda total por fertilizantes tem-se como fonte
a Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA); para defensivos agrícolas, o
Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola (SINDAG) e para a área
com laranja se apóia no Levantamento Sistemático da Produção Agrícola do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A Tabela 1 mostra a demanda relativa (kg/ha) por fertilizantes para a laranja no
Brasil. Trata-se de valor médio que estaria evidenciando um uso mais intensivo de fertilizantes em anos recentes, visto que preços menos atrativos nos anos de 1999 e 2000
afastaram da citricultura um número significativo de produtores que se apoiavam em
sistemas de produção menos competitivos. Isto ocorreu no Estado de São Paulo, já que em
1999, a estimativa do número de propriedades citrícolas no cinturão citrícola era cerca de
24 mil, algo bem acima do número próximo de 15 mil propriedades estimado atualmente
(Estratégias para a laranja no Brasil, ed. Atlas, 2005, p.98-99). Denota-se que a redução na
área a partir de 1999 não foi acompanhada proporcionalmente pela redução no consumo de
fertilizantes. Tomando-se 2004 e comparando a 1999 (ano de ocorrência da pósdesvalorização
do Real em janeiro, onde os insumos importados foram penalizados pelos
acréscimos nos custos exigindo a troca de mais reais por unidade de dólar), a área
experimentou um decréscimo de 20,6% (caiu de 1,029 milhão de hectares para 818 mil
hectares) e o consumo total retraiu apenas 1,7% (de 400 mil t em 1999 para 393 mil t em
2004). Com estes números, calcula-se que a demanda relativa (consumo médio) que foi
estimada em 338,4 kg/ha em 1999 chegou aos 480,4 kg/ha em 2004.

Tabela 1. Laranja: área plantada, consumo total e demanda relativa por fertilizantes, 1999-
2004.

Anos          Área plantada                  Consumo                      kg/hectare
                      (mil ha)                           (mil t)
1999                1.029,8                           400                             388,4
2000                 857,5                             336                             391,9
2001                 825,2                             339                             410,8
2002                 825,1                             362                             438,7
2003                 822,0                             405                             492,7
2004                 818,0                             393                             480,4
Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados do IBGE e ANDA, 2005.

O mesmo ocorreu com o uso de defensivos agrícolas (Tabela 2), onde a quantidade
demandada por ingrediente ativo passa por um aumento no horizonte 1999-2004 (de 14,8
mil t em 1999 para 17,5 mil t em 2004), diante de uma redução na área com laranja no
Brasil e, conseqüentemente, com a retirada de inúmeras propriedades produtoras de laranja.

Tabela 2. Defensivos: valor e volume demandado pelas frutas cítricas, 1999-2004.

Anos                          Valor                              Volume
                              (milhão US$)                        (mil t)*
1999                           128,6                                14,8
2000                           101,5                                14,5
2001                           108,5                                16,0
2002                           115,8                                17,6
2003                           133,1                                16,8
2004                           144,4                                17,5
* t de ingrediente ativo
Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados SINDAG e IBGE, 2005.

A Tabela 3 mostra a demanda relativa (kg de ingrediente ativo/ha) por classe de
defensivos agrícolas. Novamente, tomando-se um comparativo entre os anos 1999 e 2004,
denota-se um crescimento no consumo de herbicidas (passa de 1,8 kg de ingrediente
ativo/ha em 1999 para 2,8 kg/ha em 2004), de fungicidas (de 2,4 kg/hectare para 3,8
kg/hectare), de acaricidas (de 8,9 kg/ha em 1999 para 11,3 kg/ha em 2004) e em outros
(óleo mineral, espalhante adesivo, antibrotantes e reguladores de crescimento) passando de
0,3 kg/ha em 1999 para 2,5 kg/ha. Somente a demanda relativa por inseticidas mostrou
pequena retração, de 1,1 kg/ha em 1999 para 0,9 kg/ha em 2004, e com leve recuperação no
comparativo com 2002 (0,7 kg/ha) e 2003 (0,7 kg/ha). No caso de inseticidas, é esperado
um crescimento no seu uso, após a detecção de mais focos de greening (huanglongbing) em
municípios paulistas que chega a 65, após o diagnóstico da ocorrência em Cordeirópolis,
segundo a Fundecitrus (informação colhida em meados de agosto). Como é sabido, o
greening é causado pela bactéria Candidatus liberibacter e transmitido por um inseto
(Diaphorina Citris). Segundo especialistas, por ora, “a doença não tem cura, mata a arvore
e os frutos e torna os pomares inviáveis, comercialmente”. Segundo a Fundecitrus “a
erradicação de plantas é obrigatória e são sugeridos no controle da doença, o plantio de
mudas certificadas e controle químico do inseto”, aumentando a demanda por inseticidas e,
conseqüentemente, seu uso e os custos de aplicação.
Com a devida cautela de interpretação, estas estatísticas para o consumo relativo
médio brasileiro podem estar, como nos fertilizantes, evidenciando que no horizonte pósdesvalorização
do Real, os produtores que permaneceram na citricultura a enxergam como
uma cultura competitiva e tomam maiores cuidados em termos de manejo e aplicação em
nutrição mineral e fitossanidade, clara evidência de que a retração na área de laranja não foi
acompanhada na mesma proporção pela queda na demanda por fertilizantes (no caso de
defensivos ocorreu o contrário, com o aumento no consumo relativo de ingrediente ativo).

Tabela 3. Citricultura: demanda relativa por classe de defensivos agrícolas, 1999-2004,
kg/ha de ingrediente ativo.

                1999             2000               2001                 2002                  2003                 2004
Herbicida   1,8               1,7                  2,5                    2,6                    3,4                   2,8
Inseticida    1,1              1,0                  0,9                    0,7                    0,7                   0,9
Fungicida   2,4              2,5                  2,9                    3,0                    3,6                   3,8
Acaricida   8,9              9,9                 10,8                  12,3                  10,8                  11,3
Outros       0,3             1,8                   2,3                   2,7                    2,0                    2,5
Total         14,4           16,9                  19,3                 21,3                  20,5                   21,3
Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados do SINDAG e IBGE, 2005.

Em artigo anterior (Efeito dominó, Rev. Agroanalysis, v.24, n.11, novembro 2004,
p.30 dos autores) ficou evidenciado a resposta do citricultor diante de preços atrativos em
termos de tratos culturais, de manejo e fitossanidade, representado por maiores cuidados e
maiores dispêndios em anos que vigoraram bons preços do suco no mercado internacional
e, conseqüente transmissão para os preços domésticos recebidos pelos citricultores para a
caixa de laranja. Ficou comprovado um uso mais intensivo de insumos na citricultura em
função da resposta nos termos de troca (preço de paridade) favoráveis ao citricultor em
relação aos custos provenientes do uso de fertilizantes e defensivos agrícolas.

 

Evaristo Marzabal Neves e Luciano Rodrigues

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