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O PORTEIRO


Paulo Lot Calixto Lemos

Uberlândia é hoje uma bela de uma cidade, um comércio de fazer inveja, grandes industrias e uma agricultura que exala vigor e prosperidade. Mas naqueles tempos quando não passava de uma vila, o único local movimentado e onde se podia encontrar algum emprego era o cabaré de “dona Branca”. Alem das damas, cozinheiros, garçons existia o porteiro, cargo considerado o mais baixo e de menor valor do quadro de funcionários, cujo ocupante invariavelmente era um analfabeto que não tinha outra opção a não ser sujeitar-se ao misero salário oferecido.

Certa vez, dizem, que dona Branca se apaixonou por um almofadinha da cidade grande, e no calor da paixão deu corda ao individuo que cheio de idéias novas convenceu a cafetina a modernizar o estabelecimento. Começou então pelo porteiro, que há vários anos era um tal de Toninho:

- Toninho, a partir de hoje, alem do serviço de porteiro quero que você preencha, diariamente, este relatório. Onde deve registrar o numero de pessoas que entraram e saíram, seus comentários e reclamações. Entendido?

- Mas seu Plínio, como que eu vou fazer isso? – balbuciou o infeliz – eu não sei ler nem escrever!

- Ah! Sinto muito Antonio, você então está despedido!

- Mas seo Plínio, o senhor não pode fazer isso comigo, eu trabalho aqui há tantos anos! Eu não sei fazer outra coisa seo Plínio!

- Sinto muito – repetiu o jovem – mas eu não posso fazer nada... Passe no meu escritório hoje à tarde para apanhar seu salário.

Com a cabeça zoando, Toninho viu o mundo desmoronar, onde iria arrumar dinheiro para dar o de comer a sua esposa e sua filhinha? Nunca havia aprendido nenhum outro oficio! – pensava – lembrou-se então, que no cabaré, quando quebrava alguma cadeira ou mesa, quando algum encanamento entupia ou estourava, era ele que arrumava. Sim, ele tinha habilidade para essas coisas... Pensou então que essa podia ser uma boa ocupação, enquanto tentava arrumar outro serviço. Porém para isso precisava de algumas ferramentas, e no povoado não existia nenhuma loja de ferragens... Decidiu então, que deveria viajar até a capital para comprar, com seu salário, pelo menos uma caixa de ferramentas.

Pois bem, dois dias depois estava de volta com o equipamento quando um vizinho bate em sua porta:

- Bom dia Toninho, cê tem um martelo ai pra me emprestar?

- Sim, acabo de comprar um... Mas preciso dele pra trabalhar!

- Ora Toninho é por pouco tempo... Amanhã cedinho eu te devolvo.

Na manhã seguinte, conforme prometido, estava lá o vizinho novamente:

- Ôh Toninho, eu ainda preciso do martelo. Vende ele pra mim!

- Ah, isso eu não posso fazer, como é que eu vou trabalhar sem ele?

- Vamos fazer o seguinte: eu pago o martelo, seus dias de serviço e a despesa da viagem pr’ocê ir à cidade comprar outro!

Assim sendo, Toninho concordou. Mas logo que chegou novamente da viagem, estava lá, esperando na porta de sua casa, um amigo do seu vizinho:

- Boa tarde ouvi dizer que você que vendeu um martelo pro seu Chico. Sabe, estou precisando de um alicate e algumas chaves de fenda. Como não tenho tempo pra ir eu mesmo comprar isso, queria fazer o mesmo negocio que você fez com o seu Chico e ainda lhe dou um lucrinho no preço das ferramentas...

O ex-porteiro, que de bobo não tinha nada, guardou aquelas palavras: “não tenho tempo”. Se isso fosse certo era possível que muita gente podia ter essa mesma dificuldade... Arriscou então, e com o lucro comprou mais ferramentas do que havia vendido. A noticia começou a se espalhar pela vila, e em pouco tempo Toninho não fazia pras encomendas. Logo precisou alugar um galpão pra estocar as ferragens, e mais alguns meses uma vitrine, um balcão, e assim o galpão se transformou na primeira loja de ferragens do povoado.

Agora, não precisava mais viajar, sua loja era visitada por todos os viajantes do ramo. Como era um bom cliente, que levava seus pagamentos em dia, se tornou muito assediado. De simples loja de ferragens logo passou a vender também, maquinas, tratores e implementos agrícolas. E em poucos anos, nosso amigo, se tornou em um rico e prospero homem de negócios.

Recentemente, o agora senhor Antonio Varela, foi agraciado com um titulo de mérito empresarial do estado. No dia da honraria, o prefeito ao discursar disse:

- É com grande orgulho que nós, conterrâneos do senhor Antonio Varela, lhe solicitamos a honra de assinar o livro de ouro do nosso município!

- Senhor prefeito – disse Toninho – a honra seria toda minha, mas infelizmente não tive oportunidade, e a luta do dia a dia me impediu de aprender a ler ou escrever. Sou analfabeto!

Vermelho como um peru, frente à tamanha gafe, o prefeito ainda tentou:

- O senhor??!! Se o senhor construiu um império empresarial com esse sendo analfabeto, então o que teria feito se soubesse ler e escrever???

- Ora senhor prefeito! Se fosse assim eu ainda seria o porteiro do cabaré da dona Branca, uai!

Paulo Lot Calixto Lemos

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