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TERCEIRIDADE OU FALSIDADE


Paulo Lot Calixto Lemos

Eufemismo é uma palavra de origem grega que quer dizer, segundo o dicionário Aurélio “Ato de suavizar a expressão de uma idéia, substituindo a palavra ou expressão por outra mais agradável, mais polida”. Ou seja, a maneira politicamente correta, ou ainda melhor, o modo falso de dizer alguma coisa sem ofender a quem pode se sentir ofendido por aquilo que se quer dizer.

Outro dia uma jovem, filha de um amigo recente, que deve ter nascido quando eu atingia a idade mínima para ser candidato a senador, disse-me bem ao modo de quem jamais desagrada: “Você não é velho, é jovem há mais tempo”. Ora, ora... Que jeitinho hábil o daquela mocinha! Claro, qualquer um que tenha idade superior à do mais velho de seus pais é, para ela, velho. É assim que as crianças e os jovens delimitam as faixas etárias. Isso quer dizer que, a cada aniversário desse pai ou mãe o conceito de velhice é empurrado para um limite imediatamente além daquele que se tinha antes.

Eufemismo é isso – um modo delicado de dizer uma verdade. Um modo gentil com que alguém se refere aos nossos possíveis defeitos ou problemas, sem nos ofender. Como diria meu concunhado Cláudio: “Não veja nisso um defeito dela, mas antes, uma virtude”. Muito bom, bem diferente daquela do refrigerante, que insinua que depois dos 40 qualquer homem é “tio”, “sukita”, e que por isso, e apenas por isso é considerado um bobo. Ou como dizem: um “Bill”.

Por um lado, principalmente de uns tempos pra cá, é isso que a hipócrita mídia ocidental, a publicidade em geral, vem ensinando aos nossos jovens e adolescentes. E por outro lado, os politicamente corretos, ou os eternos oradores das salas de aulas vem tentando encontrar um substituto para a palavra “velho”: Idoso é muito formal; ancião é pejorativo (insinua alguém em decrepitude, dizem); vetusto é vernacular; provecto, senil, gagá, esclerosado, pé na cova... Putz, aí é bravo!

Criaram então a tal de “terceiridade” para os aposentados ou para os que aos poucos vão deixando de ser “produtivos”. Só que, ao agirem assim, procuram sempre um limite, e esse limite tem variado na razão direta do conceito de cada um, e não raramente vemos referências a uma pessoa na faixa dos cinqüenta, ou mesmo dos quarenta anos, como sendo de “terceiridade”. Ora, gente! Entre os 40 e 60 anos de idade é quando o sujeito encontra o apogeu de sua produtividade, é só aí que o ponto de equilíbrio é atingido, aquele que alia, como dizem os caipiras, a prática com a gramática. A isso, soma-se o fato de que a idade mediana em todo o mundo vem sendo empurrada para números cada vez maiores diante dos avanços da medicina e do próprio comportamento das pessoas, que se mantêm jovens nas atitudes em geral, na linguagem, no modo de vestirem, de divertirem, e mesmo de se relacionarem com pessoas de outras faixas etárias.

Que medo é esse que as pessoas tem da proximidade do fim? E neste caso, com a proximidade do fim natural! Porque ao saltar de pára-quedas, fumar 2 maços de cigarro por dia, flutuar no ar numa asa-delta, namorar mulher (ou homem) promiscuamente, beber uma garrafa de wisky numa noite, pular num abismo amarrado a num elástico, desafiar tubarões sobre uma prancha, fazer um passeio turístico no Rio de Janeiro, dirigir como se estivesse numa pista de formula 1 – tudo isso é afrontar o fim, é também estar próximo da morte – mas, estranhamente, o que se teme é a morte ao término natural das funções biológicas...

Para mim, nosso percurso nessa vida deve ser dividido em apenas 5 fases: a fase do lactente, da criança, do adolescente, do jovem e a partir dos 35 ou 40 anos a fase madura. Para esta não deveria existir um limite pré-determinado por ninguém nem por nada, a não ser o limite estabelecido pela própria pessoa. Muitos “partem” sem nunca adentrarem a tal terceira-idade. Conheço muitas pessoas, nascidos bem antes de mim, que ostentam rugas ou cirurgias plásticas, cabelos brancos ou tingidos, carecas ou implantados, e muitas histórias para contar, que ao contrário daqueles que se resignam aos quintais e aos pijamas, vivem intensamente tudo de bom e de novo que a vida lhes dá.

Não bastasse chamar a velhice – ou o que a antecede – de terceiridade, inventaram, depois, a “melhor idade” e a “feliz idade”. Uma vez mais, digo: Ser feliz independe da idade, depende antes, do que se sente por dentro. Sim, se recebermos os anos a nós destinados com sabedoria e por que não dizer, com orgulho e vaidade, pois até porque, no conceito oficial, é difícil ser feliz com o compromisso de cumprir dietas e ingerir quilos e mais quilos de remédios contra o entupimento de veias, contra a presença de açúcar no sangue, ou mesmo contra o travamento das juntas. Então quando ou se já formos velhos e mesmo assim pudermos dizer: sou feliz! O peso dessas duas palavrinhas se tornará elefântico, aos olhos dos jovens e principalmente de Deus.

No fundo e na verdade, o problema está no preconceito que se cria contra certas palavras. Está passando da hora de mostrarmos aos jovens – às crianças, principalmente – que ser velho é um ideal, uma façanha que nem todos conseguem, é da natureza e deve ser natural, é a própria vida.

O resto é eufemismo, é falsa educação.

Paulo Lot Calixto Lemos

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