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Limites do arrendamento por grandes produtores


Fábio Lamônica Pereira
Sabe-se que em caso de venda de imóvel rural arrendado, o arrendatário (quem aluga a terra) tem preferência na aquisição em iguais condições oferecidas a terceiros.
A Lei tem por finalidade certa proteção econômica e social, considerando que o arrendatário já dedicou significativa quantidade de tempo na exploração da área, estabeleceu-se socialmente no local de exploração, causou impacto na economia local, realizou investimentos, etc.
Analisando a questão de forma mais técnica, verifica-se que o Estatuto da Terra (Lei n. 4505/64) trata da questão do direito de preferência sem fazer qualquer ressalva ou limitação quanto a tratar-se de pessoa física ou jurídica ou quanto ao porte do arrendatário, se pequeno, médio ou grande. Pela leitura da Lei o arrendatário tem direito de preferência na aquisição da propriedade nas mesmas condições oferecidas a terceiro. E ponto.
Mas, o Estatuto da Terra tem um regulamento, Decreto n. 59566/66, que em grande parte praticamente repete o que diz a Lei. Trata de pormenores de forma mais detalhada, é verdade. Contudo, em regra, o regulamento de uma Lei não pode restringir direitos, por exemplo, no campo em que a Lei não o fez.
Em recente decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, houve surpresa quanto à interpretação e aplicação do Estatuto da Terra e seu regulamento justamente em caso envolvendo direito de preferência em virtude de arrendamento de imóvel rural.
A situação envolveu uma empresa do agronegócio considerada de grande porte e que figurou como arrendatária de determinada área rural.
O imóvel arrendado foi vendido para um terceiro sem que fosse oportunizado à empresa arrendatária exercer o direito de preferência na aquisição, conforme prevê a Lei.
A empresa arrendatária, então, propôs uma ação fundamentada no Estatuto da Terra de forma que depositou o preço da venda em juízo a fim de que lhe fosse dado o direito à aquisição, seguindo as determinações da Lei.
O Tribunal do Estado que julgou o caso entendeu pelo direito da empresa em adquirir a propriedade, aplicando as determinações do Estatuto da Terra.
O STJ, contudo, reformou a decisão do referido Tribunal e determinou a aplicação da redação do regulamento do Estatuto da Terra que restringe o direito de preferência para o produtor que explore a área de forma direta e pessoal, que não era o caso da referida empresa considerada de grande porte.
E a questão se complica um pouco mais na medida em que o referido Decreto define a exploração direta e pessoal “na qual o proprietário, ou arrendatário ou o parceiro, e seu conjunto familiar, residindo no imóvel e vivendo em mútua dependência, utilizam assalariados em número que não ultrapassa o número de membros ativos daquele conjunto”.
Nesse caso foi discutido especificamente o direito de preferência, mas todos os demais benefícios estabelecidos pelo Decreto exigem, dentre outras coisas, a exploração direta e pessoal por parte do arrendatário segundo a citada definição.
Trata-se de um precedente e não obriga (ao menos por ora) que o entendimento seja adotado em todas as instâncias e em todos os tribunais. Mas decisões dessa natureza tem grande peso e costumam nortear as demais instâncias, sendo que com o passar do tempo tendem a se consolidar.
Por isso, os contratos agrários devem ser ajustados minuciosamente e de acordo com a lei (e respeito regulamento) que melhor reflita o interesse das partes de forma a evitar surpresas com interpretações inesperadas como no citado entendimento adotado pelo STJ que pode causar insegurança no agronegócio.

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