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Lixo: acelerar a PNRS


Arnaldo Calil Pereira Jardim
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) é um marco, como são a Política Nacional de Recursos Hídricos e a Política Nacional de Saneamento, que ainda não foram integralmente implantadas. E as Diretas Jáfoi um marco para a democratização do País, embora a democracia não esteja totalmente implementada. Considerado o movimento popular mais importante da história brasileira, a campanha que levou milhões de pessoas às ruas em 1984, foi tema de homenagem no Plenário do Senado no último dia 24 de fevereiro. Trinta anos depois, os participantes da sessão ressaltaram o caráter pacífico das manifestações da época, diferentemente do que tem marcado os recentes protestos populares, também originados na incapacidade do Estado em suprir direitos e serviços básicos à população.

Menciono este fato para estabelecer uma referência e assim verificar que é sempre um processo e a quem quer que a legislação realmente se fixe cabe uma permanente mobilização
As condições brasileiras ainda são precárias e dramáticas em muitos setores. E em geral os municípios estão desestruturados para atender às diversas demandas dos seus cidadãos.
No Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2012 (http://www.abrelpe.org.br/panorama_apresentacao.cfm), divulgado no final de maio do ano passado, a ABRELPE – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais constatou que “em 2012 mais de 3 mil cidades brasileiras enviaram quase 24 milhões de toneladas de resíduos para destinos considerados inadequados, o equivalente a 168 estádios do Maracanã lotados de lixo”.
Menos de 10% dos então 5.565 municípios brasileiros apresentaram seus planos para resíduos no prazo que expirou em 02 de agosto de 2012. Além disso, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, que foi objeto de audiências públicas em 2011, não foi promulgado pelo Executivo Federal. Os estados também se movimentaram lentamente na elaboração de seus planos de gestão, sem dar o bom exemplo ou incentivar os municípios à formulação de seus planejamentos.
Até agosto próximo, segundo a PNRS, todos os municípios brasileiros precisam eliminar os lixões. O Brasil tem hoje 5.570 municípios e é evidente o esforço necessário para cumprir a lei que enfrenta um problema antigo de afastamento e destinação do lixo, com origem no Brasil Colônia e séculos de falta de atenção, gradativamente agravado pelo processo de industrialização e desenvolvimento que desconsiderou a sustentabilidade, e pela concentração de 84% dos habitantes nas cidades.
A PNRS previu que a disposição ambientalmente adequada dos rejeitos deveria ser realizada em até quatro anos a partir da sua promulgação. Os prazos são importantes para a indispensável mudança de paradigma da gestão dos resíduos.
A PNRS levou quase 20 anos para ser aprovada no Congresso Nacional. É um tempo longo demais para um problema emergencial há séculos. De minha parte, fiz todo o esforço possível como presidente do Grupo de Trabalho que instituiu a política, aprovada por unanimidade e sancionada sem vetos se transformou na Lei 12.305/2010.
A PNRS conceitua de maneira moderna o que se costuma chamar de lixo, já separando no texto da lei dos resíduos sólidos – que podem ser reaproveitados para o bem da conservação ambiental e da economia – os rejeitos que tratados, devem merecer um destino final ambientalmente correto. A primeira intenção, porém, é evitar a produção de resíduos rejeitos: não gerar, reduzir, reutilizar, reciclar.
A responsabilidade sobre os resíduos deve ser compartilhada entre o poder público, as empresas e os cidadãos. A gestão deve ser integrada e compreender, por exemplo, a elaboração de planos de gestão (nacional, estaduais, municipais e empresariais), e a inclusão social por meio do fortalecimento das cooperativas de catadores.

Quando eleito deputado federal, em 2006, assumi o compromisso de elaborar, articular e cobrar a aprovação da PNRS, após a bem sucedida experiência com a lei estadual 12.300/2006, da qual fui o autor e com a qual disciplinamos a gestão dos resíduos sólidos no Estado de São Paulo, e assim conseguimos fazer.
A PNRS tem importantes repercussões sociais na área de saúde pública e na economia. Em 2012, por exemplo, a reciclagem de latas de alumínio para bebidas movimentou R$ 1,8 bilhão no País. Somente a etapa de coleta (a compra das latas usadas) fez circular R$ 645 milhões, o equivalente à geração de emprego e renda para 251 mil pessoas.
À PNRS devem se somar as outras políticas nacionais críticas para o desenvolvimento sustentável do País, como as de Saneamento, de Mudanças Climáticas, de Meio Ambiente e de Educação Ambiental. Aliás, sem educação continuada para a formação da cidadania como substância do desenvolvimento democrático, pouco se avançará na implantação da PNRS.
O Brasil desperdiça R$ 8 bilhões por ano ao não manejar adequadamente seus resíduos sólidos urbanos. Toneladas de embalagens e outros materiais remetidos ao “lixo” têm valor econômico destacado e podem basear o surgimento de novos e prósperos negócios oriundos da reciclagem, reuso e reaproveitamento de resíduos. Quem sabe não será por aí que as cidades brasileiras começarão a resolver o pagamento secular de uma das piores faturas das gestões municipais: a da coleta e destino final dos resíduos e rejeitos gerado pela sociedade nas áreas urbanas?

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