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O estresse térmico Parte 4: Principais efeitos em bovinos leiteiros


Danielle Maria Machado Ribeiro Azevêdo


Parnaíba, 11 de dezembro de 2007. Os bovinos sob estresse térmico têm suas atividades comprometidas, o que ocasiona alterações sobre o consumo de alimento e água, crescimento/desenvolvimento, produção de leite e reprodução, bem como afetam seu comportamento no que concerne à postura corporal e à busca por sombra. A seguir, estes efeitos serão detalhados, separadamente.

Consumo de Alimento

O objetivo primário de todos os animais é se alimentar e estes respondem de forma diversa a vários tipos de alimentos e dietas. Os conceitos básicos de alimentação, aliados ao conhecimento do comportamento dos animais, podem ser utilizados para melhorar o seu bem-estar e produtividade.

O consumo dos alimentos é determinado pelo número de refeições diárias, pela duração de cada refeição e pela taxa de ingestão. Esses fatores dependem das características físicas e químicas do alimento, da disponibilidade de água, da qualidade e quantidade dos nutrientes, da temperatura ambiente e dos próprios animais (idade, tamanho e nível de produção), dos efeitos de distúrbios provocados por predadores, ataque de insetos, enfermidades e parasitas e da competição com outros membros do grupo.

Uma das características do comportamento alimentar de ruminantes é o seu padrão diurno com distribuição dos períodos de pastejo relacionados com o ciclo claro-escuro. Os episódios de maior atividade do comportamento ingestivo, em um período de 24 h, ocorrem logo antes de amanhecer, no meio da manhã, no início da tarde e próximo ao crepúsculo. Dentre esses períodos, as horas próximas ao nascer e ao pôr-do-sol são as de pastejo mais longo e contínuo. No restante do dia, o pastejo é intermitente e os animais descansam ou ruminam.

O comportamento alimentar é fortemente afetado pelo clima e, em geral, o consumo de alimento diminui quando a temperatura ambiente ultrapassa 26oC e, em situação de pastejo, esse efeito é mais pronunciado. Uma vaca em lactação necessita de 10h de pastejo diário para consumir o necessário para produzir 12 litros de leite/dia, mas esse tempo é reduzido, principalmente durante o dia, caso a temperatura máxima exceda 27oC. Portanto, o que se observa nos meses mais quentes do ano é, além da redução da atividade de alimentação, uma inversão dos hábitos alimentares, isto é, com temperatura ambiente superior a 32oC os animais interrompem o pastejo, entre a ordenha da manhã e a da tarde, reduzindo o tempo de pastejo diário.

A produção de calor no corpo e sua temperatura são mais elevadas quando há um consumo predominante de forragens do que quando as dietas contam com níveis mais elevados de concentrados. Entretanto, o teor de gordura do leite diminui e distúrbios digestivos aumentam, durante as condições quentes de verão, quando o consumo de forragens é severamente limitado, voluntariamente ou através de restrição. Geralmente as vacas limitam voluntariamente o consumo de forragens durante os períodos quentes do ano.

As exigências de manutenção de vacas em produção aumentam cerca de 30% em temperaturas ambientais acima de 35oC pelo período de 6 horas por dia e o consumo de matéria seca diminui cerca de 50% em relação àquele de vacas mantidas na zona de termoneutralidade. Como conseqüência, a produção de leite também é reduzida.

Em dias muito nublados os bovinos podem atrasar o início do pastejo pela manhã e parar mais cedo ao anoitecer. Os animais ficam mais agitados, pastejam com menor intensidade e caminham mais, em dias com muitas nuvens e vento. A chuva só altera o comportamento dos animais se for muito forte. Chuva com rajada de vento altera a direção do pastejo, isto é, os animais tomam a direção contrária ao vento, e quando a chuva está muito forte e persistente os bovinos interrompem o pastejo e permanecem imóveis com o pescoço estendido. Se o tempo de interrupção for superior a uma hora, os animais podem reiniciar o pastejo, apesar da chuva forte. Os bovinos tendem a pastejar na mesma direção do vento, mas, no calor, tomam a direção contrária para maximizar a troca de calor radiante.

Consumo de água

A função da água, além de nutriente essencial, é promover o resfriamento do corpo e suprir as necessidades aumentadas do organismo em conseqüência das perdas pelo suor e vias aéreas superiores durante o estresse pelo calor.

A freqüência de ingestão de água depende da temperatura ambiente, da qualidade do alimento e da distribuição da água. Em pastagens verdes e abundantes, os bovinos não bebem muita água; no entanto, quando o alimento é mais seco, necessitam de água regularmente. O consumo é maior quando aumenta a temperatura ambiente e a disponibilidade. Outros fatores também influenciam o consumo de água, como: produção de leite, consumo de alimentos, peso do animal, nível de atividade, estado fisiológico, raça, composição e forma física da dieta, precipitação pluviométrica, qualidade, acessibilidade e temperatura da água.

Em condições termoneutras as vacas necessitam de cerca de três litros de água bebida para produzir 1 kg de leite e a ingestão de água aumenta com o aumento do consumo de matéria seca. No entanto, sob condições de estresse pelo calor a ingestão de água aumenta enquanto o consumo de alimentos diminui. Conforme McDowell (1975) uma vaca de 500 kg, em lactação, mantida a uma temperatura de 21oC, beberá em torno de 50 litros de água/dia, mas a 32oC aumentará o consumo em 25 a 100%.

O aumento da ingestão de água em condições de estresse calórico visa a reposição das perdas sudativa e respiratória, além de ocasionar um possível resfriamento corporal, através do contato da água, mais fria que o corpo, com as mucosas do trato digestivo. Para maximizar a utilização da água, os bovinos ao invés de reduzirem o volume urinário, eliminam urina mais concentrada e fezes mais secas.

A disponibilidade de água determina o padrão de pastejo especialmente em regiões secas. A área em torno do bebedouro tende a ser super-pastejada, com conseqüente erosão, podendo ocorrer uma maior carga de parasitos neste local. Os animais geralmente se aproximam dos pontos de água uma a duas horas depois do amanhecer, porém em dias quentes essa aproximação pode ocorrer mais cedo.

Os horários de ingestão de água estão relacionados com os padrões diurnos de pastejo e descanso, e a freqüência de ingestão, para vacas, está em torno de cinco vezes ao dia, variando de uma a seis vezes. Em sistemas extensivos esse padrão apresenta pouca variação, com a primeira ingestão ocorrendo depois do principal período de pastejo pela manhã. As vacas vão ao bebedouro entre 7 e 8 horas, não permanecendo no local, mas no retorno do pastejo, em torno das 11 horas, elas permanecem descansando próximo do bebedouro por várias horas.

Postura corporal

Os animais podem ajustar-se ao ambiente térmico alterando sua postura. Em ambientes quentes, os bovinos tendem a assumir uma postura de relaxamento e minimizar as atividades físicas, reduzindo ou cessando a atividade de alimentação e procurando uma superfície fria para se deitarem.

Os bovinos podem permanecer de pé na água ou espojar-se na lama ou excreta quando estão em condições de estresse calórico. Permanecer de pé na água facilita a perda de calor por condução a partir dos apêndices e peito, enquanto no espojamento aplicam água na superfície corporal que se evapora, resfriando o animal, quando esse deixa a área úmida. Vacas com estresse calórico freqüentemente borrifam água sobre seus corpos.

Busca por sombra

Nos dias com temperatura elevada e intensa radiação solar, as vacas pastam principalmente no início da manhã, fim da tarde e à noite, e nas horas mais quentes procuram manter-se à sombra ou entram na água para se refrescar.

A vaca leiteira é muito sensível aos altos níveis de radiação solar, que pode superar em 2 a 3 vezes o calor interno produzido pela vaca durante as cerca de 8 horas em que fica diretamente exposta aos raios solares. Nos pastos que dispõem de árvores as vacas abrigam-se sob sua sombra, principalmente nas horas mais quentes do dia (10 às 16 horas). Não havendo árvores, aproveitam o mínimo de sombra disponível, como a provida por mourões das cercas ou outros objetos, protegendo principalmente a cabeça.

Os animais procuram localizar-se em ambientes termoneutros. Algumas vezes buscar locais sombreados é a única opção para os animais em condições de estresse calórico. As vacas param de pastejar e se encaminham para a sombra, quando a temperatura retal aumenta acima do normal. No entanto, esse comportamento não afeta o tempo total de alimentação. A procura de sombra é, portanto, uma resposta óbvia ao estresse calórico e ocorre devido tanto à temperatura e à umidade quanto ao genótipo do animal. Raças européias podem permanecer até 11 horas por dia na sombra.

Vacas, embora livres para se movimentarem, podem permanecer sob a sombra durante o dia, desde que com alimento e água disponíveis, se locomovendo para uma área de pasto adjacente ao entardecer e à noite. Os animais que não têm acesso à sombra usualmente deitam no pasto ou em locais úmidos durante as horas quentes do dia e preferem alimentar-se no final da tarde e à noite. As vacas com acesso a sombra apresentam freqüência respiratória e temperatura corporal mais baixas, além de produzirem mais leite, apresentarem maior taxa de concepção e menor incidência de mastite que aquelas sem acesso à sombra.

Nas pastagens sem sombra, os animais apresentam sintomas de estresse calórico que se manifestam por movimentação excessiva, agrupamento nos extremos do piquete, ingestão freqüente de água e de descanso na posição deitada. Caminhar excessivamente visa otimizar o resfriamento através da evaporação. Essas vacas podem então se mostrar exaustas para pastejar e se deitar nas horas frescas do final da tarde, quando vacas com acesso à sombra começam a pastar. Através do agrupamento com as companheiras do rebanho, os animais tentam reduzir a área da superfície corporal exposta ao ambiente. Esta reação tem sido chamada de termorregulação social.

Danielle Azevêdo (pesquisadora da Embrapa Meio-Norte)

Émones Santos Souza (aluna do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal/UFPI)

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