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O estresse térmico Parte 7: Estratégias para amenizar seu efeito em bovinos leiteiros


Danielle Maria Machado Ribeiro Azevêdo

Parnaíba, 11 de dezembro de 2007. Objetivando aliviar os bovinos leiteiros dos efeitos do estresse pelo calor e, assim, melhorar a produção e desempenho reprodutivo destes animais, algumas estratégias de manejo ambiental podem ser utilizadas, dentre as quais estão inclusas provisão de sombra (natural ou artificial), resfriamento pela água, combinado ou não à ventilação forçada, utilização de lagoas de resfriamento e ar refrigerado em confinamento total.

Na escolha da prática a ser adotada na propriedade devem ser consideradas as necessidades dos animais (em muitos casos mutáveis durante o ano), o impacto das tecnologias escolhidas sobre as condições ambientais, o nível de gerenciamento da propriedade, o capital disponível e a relação custo-benefício da tecnologia escolhida. Algumas estratégias são discutidas a seguir.

A técnica mais utilizada por ser a mais simples e de menor custo é o sombreamento de pastagens. A melhor sombra, sem dúvida, é a provida por árvores, isoladas ou em grupos. As árvores devem, portanto, ser parte obrigatória dos pastos e piquetes para vacas leiteiras, a fim de que estas possam aliviar sua carga térmica radiante quando necessitarem.

As árvores têm maior eficiência em resfriamento ambiental que abrigos artificiais, pois sob árvores os animais estão expostos a uma maior área de céu aberto, que representa superfície fria em relação às demais fontes de radiação térmica (telhas, caibros, paredes). Somando-se a isto, a construção de abrigos implica em custos mais elevados.

As árvores mais indicadas são aquelas frondosas, de folhas perenes, com altura mínima de três metros para propiciar tanto uma boa sombra para os animais quanto uma boa ventilação, de modo o solo sombreado possa secar rapidamente, evitando o acúmulo de umidade e reduzindo a ocorrência de afecções nos cascos e a proliferação de microrganismos causadores de mastite e parasitas internos ou externos. As árvores utilizadas para sombreamento de pastagem não devem conter agentes tóxicos em folhas, frutos ou casca e nem raízes expostas que possam dificultar a acomodação das vacas. O tamanho dos frutos também deve ser considerado: frutos maiores que 5 cm de diâmetro devem ser evitados pois se ingeridos podem causar obstrução do esôfago com conseqüente timpanismo e morte do animal.

Na ausência de árvores nos pastos ou piquetes e na dependência do sistema de produção, o sombreamento artificial pode ser utilizado mediante a implantação de sombras portáteis ou abrigos permanentes. As sombras artificiais nem sempre são tão efetivas quanto as naturais e devem oferecer espaço suficiente para os animais manterem sua distância normal quando deitados ou em pé e como proteção contra o calor, permitir o máximo de movimentação do ar.

Uma unidade de sombra portátil é constituída por uma tela de fibra sintética (polipropileno) erguida sobre uma estrutura simples de metal ou madeira adquirida na propriedade para reduzir custos. Uma vantagem deste tipo de sombra é poder ser removida de um lugar para outro e, assim, permitir limpar e secar os diferentes locais de acordo com a necessidade. A tela é resistente aos raios ultravioleta podendo prover de 30 a 90% de sombra (de acordo com o espaçamento da rede) e tem boa durabilidade se mantida adequadamente estendida. Em geral, recomenda-se a tela para provisão de 80% de sombra.

O abrigo permanente tem custo elevado, na dependência do tipo de material a ser utilizado para a cobertura e sustentação. A escolha de um determinado material para o telhado ou para toda a instalação estará em função da relação custo-benefício esperada. Este tipo de abrigo deve ser aberto lateralmente com orientação preferencial leste-oeste no sentido do eixo longitudinal do telhado, principalmente quando as vacas são mantidas confinadas no interior da instalação nas horas mais quentes do dia. A altura mínima recomendada é de 3,5 m do ponto mais baixo do telhado ao solo e a largura não deve exceder 15 m, dimensões que, combinadas, permitem uma ventilação natural adequada. O telhado em forma de ¨A¨ (tipo duas-águas) é o mais indicado, com abertura ou lanternim ao longo do cume, o que favorece a circulação de ar de modo que o ar que entra na instalação, se aquece e, então, sobe, saindo através da abertura superior (efeito “chaminé”). Vários tipos de material podem ser utilizados para a cobertura do abrigo, sendo as telhas de barro as mais indicadas. Chapas galvanizadas devem ser pintadas de branco na parte superior, para permitir maior reflexão dos raios solares visto que metal é um bom condutor de energia (calor). Palhas, apesar de criarem um microclima bem favorável à permanência dos animais, apresentam risco de incêndios.

Qualquer que seja o sistema de manejo, em confinamento ou em produção a pasto (com ou sem sombreamento nos piquetes), o curral de espera (sala que antecede a sala de ordenha) deve ser sombreado, tendo em vista que a ordenha é o momento chave, durante o qual se produz uma série de alterações hormonais que levam a ejeção do leite.

Uma outra forma de permitir a redução da temperatura corporal do animal permitindo o seu conforto térmico, é a utilização de água e/ou ventilação, visto que a água é um excelente agente resfriador devido à sua alta capacidade calórica (calor específico = 1) e os ventos agem por convecção, reduzindo a temperatura da superfície do corpo do animal.

Neste sentido, é interessante observar que durante as épocas quentes do ano, além da sombra, as vacas procuram água para se refrescar e, assim, entram na água de lagos, naturais ou artificiais. Em condições extremas, colocam suas patas dentro dos bebedouros comuns ou deitam-se em poças de lama, na ânsia de reduzir o estresse calórico.

É importante ressaltar que quanto maior o grau de sangue europeu, mais o animal sente a elevação da temperatura, em decorrência do menor número de glândulas sudoríparas em relação aos zebuínos. Estes, por sua vez, são capazes de suportar melhor o calor, pois suam com mais eficiência. Assim, é necessário dar aos animais mais especializados em produção de leite, mas menos adaptados ao calor, um mecanismo artificial de sudorese, promovendo o resfriamento evaporativo a partir da pele (a água evapora e rouba calor do organismo), levando à diminuição da temperatura corporal e estimulando o centro do apetite no hipotálamo. Em conseqüência o animal ingere maior quantidade de alimentos e a produção de leite será maior. O sistema de aspersão direta de água sobre o corpo do animal - a água penetra bem nos pelos do animal permite que a água penetre bem nos pelos do animal, umedecendo a pelagem e a pele, permitindo assim o resfriamento por condução e evaporação. 

Em alguns sistemas de produção de leite usa-se a aspersão de água combinada à ventilação forçada, mediante ventiladores. Em outros é utilizada a passagem de água sobre o telhado das instalações; em outros ainda, a aplicação de água pela utilização de nebulizadores. De modo geral, a aplicação de água de diferentes formas, é recomendada nas horas mais quentes do dia, à sombra, e quando a temperatura do ar ultrapassa 26-27o C e a umidade relativa do ar não é muito elevada (abaixo de 70%). O número de vezes a ser praticada é variável e deve ser economicamente viável. Deve-se atentar, no entanto, que embora a água doce seja um recurso natural renovável (ciclo hidrológico), está se tornando escasso pela crescente demanda de consumo em nível mundial e pela poluição. Assim, seu uso deve ser controlado, evitando-se o desperdício.

É importante ressaltar ainda que, tradicionalmente, o uso de lagoas não era recomendado devido à sua associação com o aparecimento de mastites. Estudos recentes, no entanto, mostram que a carga microbiana da lagoa é muito menor que a necessária para iniciar uma infecção da glândula mamária quando as lagoas são manejadas adequadamente para evitar o acúmulo excessivo de matéria orgânica e elevação da carga bacteriana, como, por exemplo, mantendo-se o fluxo contínuo de água. Estes estudos também mostram que o número de células somáticas no leite é menor em propriedades com lagoas, quando comparado com àquele de propriedades que não as possuem.

Considerando que uma das primeiras reações do animal ao desconforto térmico é reduzir o consumo de alimentos, deve-se elevar a concentração de nutrientes (energia, proteína, minerais e vitaminas) na dieta. O manejo nutricional para as épocas mais quentes do ano deve incluir o fornecimento de dietas “frias”, ou seja, dieta que gera uma alta proporção de nutrientes para a síntese e diminui o incremento calórico oriundo da fermentação e metabolismo dos alimentos.

As características da dieta fria são: maior teor de energia, fibra de alta fermentação, menor degradabilidade de proteínas e alto conteúdo de nutrientes protegidos. Estão incluídos nesta categoria as pastagens tenras, silagem com alto conteúdo de grãos e concentrados ricos em gordura.

Algumas estratégias nutricionais para minimizar o desconforto térmico são: 1. fornecer alimentos nas horas mais frescas do dia (e lembre-se: bovinos alimentam-se sim à noite); 2. aumentar a freqüência das refeições (mínimo de 3 vezes) e evitar sempre os cochos vazios; 3. fornecer alimentos fermentados (silagens) logo após a retirada do silo, evitando aquecimentos; 4. utilizar ração total imediatamente após a ordenha; 5. espaço no cocho de no mínimo 0,7 m/vaca (para evitar estresse adicional por luta por alimento); e, 6. colocar cochos e bebedouros na sombra.

O estresse térmico afeta negativamente a produção de leite, o desempenho reprodutivo, a saúde da glândula mamária e a qualidade do leite. Desta forma, os produtores devem considerar a incorporação de medidas que reduzam estes efeitos negativos através do planejamento correto das instalações, de modificações do ambiente de tal forma que proporcione resfriamento das vacas nos períodos mais quentes do ano e adequação do manejo nutricional. Desta forma será bem mais fácil e econômico produzir leite bovino em condições tropicais.

Danielle Azevedo, pesquisadora da Embrapa Meio-Norte

Émones Santos Souza (aluna do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal/UFPI)

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