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O FIAGRO e as perspectivas para o seu uso como fonte alternativa de financiamento do agronegócio


Opinião Livre

Instituído pela Lei nº 14.130, de 29 de março de 2021, o Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (FIAGRO) nasceu com o objeto de servir como fonte alternativa de financiamento do agronegócio.

Embora o agronegócio represente parcela relevante do PIB (aproximadamente 26,6% em 20201) e seja o maior responsável pelo superavit na balança comercial, com saldo de US$87,7 bilhões no último ano2, até a publicação dessa lei não havia na legislação nenhum fundo direcionado ao agronegócio.

O FIAGRO é uma comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio de natureza especial, aberto ou fechado, e destinado à aplicação em ativos do agronegócio, incluindo imóveis rurais, participação em sociedades que exploram atividades integrantes da cadeia produtiva agroindustrial, ativos financeiros, títulos de crédito, valores mobiliários emitidos por integrantes da cadeia produtiva agroindustrial, direitos creditórios e títulos de securitização emitidos com lastro em direitos creditórios do agronegócio, direitos creditórios imobiliários relativos a imóveis rurais e títulos de securitização emitidos com lastro nesses direitos creditórios, e cotas de fundos que apliquem majoritariamente seus recursos em ativos que façam parte da cadeia produtiva agroindustrial.

Trata-se de novidade relevante e que deveria ser celebrada por investidores, pelo mercado financeiro e pelo agronegócio. No entanto, o segmento foi pego de surpresa com o veto a dispositivos relevantes que, na prática, desincentivarão o uso do FIAGRO.

Primeiramente, vetou-se dispositivo que garantia a isenção do imposto de renda aos rendimentos oriundos de aplicações, realizadas pelo FIAGRO, em Certificado de Depósito Agropecuário (CDA), Warrant Agropecuário (WA), Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA), Letra de Crédito do Agronegócio (LCA), Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e Cédula de Produto Rural (CPR).

Em segundo lugar, foi vetado dispositivo que previa a isenção dos rendimentos distribuídos pelo FIAGRO, com cotas admitidas à negociação em bolsa de valores ou mercado de balcão organizado, com no mínimo 50 cotistas, aos seus cotistas (pessoas físicas) com menos de 10% da totalidade das cotas emitidas (ou representativas de menos de até 10% da totalidade dos rendimentos auferidos) pelo fundo.

Tais isenções estão disponíveis e se aplicam aos Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs). Se o objetivo, ao instituir o FIAGRO, era estimular o seu uso como fonte alternativa de financiamento do agronegócio, não há razão para colocá-lo em situação desfavorável se comparado aos FIIs.

Esse foi o objetivo do legislador ao equiparar, sob a ótica tributária, o tratamento aplicável ao FIAGRO àquele aplicável aos FIIs. A intenção do legislador é evidenciada pela inclusão da constituição do FIAGRO e de seu tratamento tributário do FIAGRO na Lei nº 8.668, de 25 de junho de 1993, que igualmente disciplina os FIIs.

Há inúmeros casos de benefícios fiscais que poderiam deixar de existir por trazerem pouco ou nenhum benefício ao ambiente de negócios.

Esse definitivamente não é o caso do FIAGRO, que se configura como mais um veículo para financiamento privado a um setor estratégico da economia brasileira. O curioso é que ao eliminar os incentivos fiscais, cria-se tratamento anti-isonômico (se comparado aos FIIs), fomenta-se uma assimetria no desenvolvimento urbano/rural e, ainda, impede o próprio Estado de direcionar seus recursos financeiros à agricultura nacional de forma mais eficiente, na medida em que perde um instrumento valioso para compartilhar o peso dos investimentos no agronegócio brasileiro. 

O suposto equilíbrio de receita e despesa buscado pelos vetos resulta em perda na alocação eficiente de recursos públicos e, no médio e longo prazo, pode inclusive ter como efeito a perda de arrecadação.

Por fim e, não menos relevante, vetou-se dispositivo que permitia o diferimento do imposto de renda sobre o ganho de capital apurado por ocasião da integralização das cotas do FIAGRO, por pessoa física ou jurídica, para o momento de sua efetiva realização, quando da alienação, da amortização ou do resgate de suas cotas (diferimento).

Além de questionável, por violar os princípios da capacidade contributiva e da realização da renda, a exigência de que a integralização se dê pelo valor de mercado de tais ativos, com base em avaliação preparada por profissional ou empresa especializada, retira o incentivo ao uso do FIAGRO.

Isso ocorre pois, nesses casos, exige-se do proprietário do imóvel rural o recolhimento do imposto de renda sobre o ganho de capital auferido, em momento anterior e dissociado do recebimento de recursos financeiros, e com base em um valor estimado de valor de mercado que pode, inclusive, vir a não se confirmar no futuro. 

Caso os vetos presidenciais sejam mantidos, por todos os motivos anteriormente elencados é provável que o uso do FIAGRO não decole, com risco de um instrumento tão relevante ao agronegócio se transformar em um verdadeiro “fiasco”.
Assim, espera-se que o governo federal reveja os vetos ao projeto ou, ainda, que o legislativo derrube os vetos e que o FIAGRO volte a se tornar uma importante fonte alternativa de financiamento ao agronegócio brasileiro.

* Por Luís Felipe Aguiar de Andrade e Bruno Habib N. Barbosa, respectivamente, sócio da prática de agronegócios e associado sênior da prática tributária do Veirano Advogados.

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