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"Sem logística, MT deixa de ser competitivo na produção"

Carlos Fávaro, da Aprosoja, defende desoneração do setor, mas União tem que pagar a conta



Carlos Fávaro, da Aprosoja, defende desoneração do setor, mas União tem que pagar a conta

A produção de soja em Mato Grosso vem batendo seguidos recordes, safra após safra, e ajudando a manter positiva a balança comercial brasileira. O presidente da Associação dos Produtores de Soja do Estado de Mato Grosso (Aprosoja), Carlos Henrique Fávaro, listou os avanços obtidos pelo setor e as dificuldades enfrentadas.


Na avaliação de Fávaro, a falta de infraestrutura ainda é o maior gargalo para aumentar a competitividade dos produtores mato-grossenses.

Ele defende a desoneração sobre o setor, mas critica a forma como o Governo Federal conduz a questão, causando prejuízos ao Estado. O dirigente não cobra políticas públicas relacionadas à produção da soja, mas tem uma visão bastante direta do papel do Estado no suporte à produção agrícola: para ele, o Governo tem que prover infraestrutura, e não cobrar impostos do setor.

Em entrevista exclusiva ao MidiaNews, o produtor sobre temas polêmicos, como a isenção de impostos, defendeu o uso de agrotóxicos e criticou o consumo de alimentos orgânicos. “Nós não somos bandidos do agrotóxico, que querem matar todo mundo na cidade com uma dosinha de veneno na ração”, declarou.

O dirigente explicou, ainda, sobre o trabalho da associação para dar suporte ao produtor. O Circuito Aprosoja, que foi lançado no último dia 12 e começará nesta segunda (16) a percorrer 23 municípios, num total de 6 mil quilômetros, em 40 dias, servirá para ouvir o empresário do campo e levar informação.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista de Carlos Fávaro ao MidiaNews:

MidiaNews - A produção de soja bateu recordes em Mato Grosso, nas duas últimas safras. A tendência é continuar batendo recordes, ou estacionar o volume de produção?

Carlos Fávaro
- A produção vem batendo sucessivos recordes, em alguns anos seguidos. Mato Grosso vem desempenhando um papel fundamental para a balança comercial brasileira, apesar de todas as nossas dificuldades. O Estado tem um grande potencial de avançar em número de produção, sem fazer novos desmatamentos, só avançando sobre áreas de baixa produção pecuária.

Pode-se integrar a lavoura e a pecuária, produzir carnes, grãos, fibras. Mas isso só vai acontecer de forma mais intensa quando tiver resolvido os problemas de infraestrutura e logística. Mas, com a estrutura que temos hoje, vamos batendo recordes enquanto o mercado internacional estiver comprando a níveis satisfatórios. Está dando lucro por isso. Quando se tem lucro, mesmo na contramão da logística, é possível avançar e fazer mais investimentos, comprar mais fertilizante, mais calcário, ou pegar um pasto que está rendendo pouco e transformar em agricultura. Isso custa dinheiro. Claro que isso vai criando um gargalo insuportável. O mais grave é que, ao menor sinal de que o mercado internacional vai esfriar um pouco esses preços, a qualquer crise internacional mais grave, como essa que a Europa está passando, o mercado retrai um pouquinho e os preços cedem, já inviabiliza essa expansão de área. Consequentemente, esses recordes não continuarão acontecendo.

MidiaNews - Quais as principais dificuldades para o produtor mato-grossense?

Carlos Fávaro
- Sem querer ser ‘chorão’, a principal delas é logística. Nós estamos no centro do país, com vias de escoamento terríveis. Já estamos vendo, nas estradas de Mato Grosso, verdadeiros trens sobre rodas, caminhões bitrem um atrás do outro, quilômetros e quilômetros. Isso chega a um colapso, com toda a certeza.

MidiaNews - Os recordes têm sido em cima do aumento de produtividade ou expansão de área cultivada?

Carlos Fávaro
- As duas coisas. Neste ano foi, basicamente, sobre a expansão de área. Porque a produtividade não foi boa, em função da ferrugem asiática. Estamos fazendo um amplo debate dentro da Aprosoja para discutir os principais problemas, e transformarmos em orientações aos produtores para que isso não ocorra mais. O plantio de soja safrinha, ou seja, soja em cima de soja, propaga muitas doenças; pode haver resistência dos fungos às moléculas dos produtos químicos que estão sendo usados para combater a ferrugem, talvez precise avançar nas pesquisas; até mesmo os órgãos governamentais, com liberação de pesquisas em época que não pode, no vazio sanitário. Tudo isso está sendo debatido para que não ocorra o que aconteceu este ano.

MidiaNews - Qual o percentual da produção é exportada?

Carlos Fávaro
- Hoje, cerca de 60% da produção é exportada. O Estado fez um acordo para manter a isenção, desde que 40% fosse vendido para o mercado interno, dentro do Brasil. Porque o que é vendido no mercado interno tem tributação. São Paulo, por exemplo, produz pouca soja, mas tem milhares de granjas, fábricas de óleo, e vem buscar a soja aqui em Mato Grosso. Quando ele compra aqui, cobra imposto. A maior parte do que é exportado, é in natura, porque existe uma política inteligente do outro lado. Nosso maior comprador é a China, que criou indústrias, para comprar os grãos aqui e processar lá, gerar emprego lá. Mas o Brasil pode e deve avançar na industrialização. Esse processo de industrialização é o ideal, tanto para a população quanto para o Estado, porque vai agregar valor e arrecadar mais. Em vez de sair milhares de toneladas de soja em grãos, podia sair tudo beneficiado. A parte que é processada aqui, vira óleo que vai para biodiesel, ou para consumo humano, e farelo com valor agregado. Mas a Aprosoja corresponde ao primeiro elo da cadeia, que é a produção.

MidiaNews - Existe dificuldade dessas indústrias que utilizam a soja como matéria-prima, de se instalarem aqui no Estado?

Carlos Fávaro
- Tinha mais. Houve um grande programa de expansão, e hoje 50% da nossa produção é processada aqui. Foi um grande avanço porque Mato Grosso produzir 11 ou 12 milhões de toneladas e só industrializava 4 ou 5 milhões de toneladas. Ai houve um grande programa de incentivos, e se instalaram aqui indústrias de processamento de óleo e farelo. Também vieram companhias para processar o farelo em ração. Hoje a capacidade instalada é de 10 ou 11 milhões de toneladas, então praticamente dobrou. Por outro lado, nossa produção também dobrou, então ficamos nos 50% de beneficiamento. Mas houve um avanço muito grande. Lógico que ainda não é o ideal.

MidiaNews - Para os produtores, a desoneração de impostos é interessante, mas o Governo do Estado reclama do pouco retorno proporcionado pelo Governo Federal. Qual a visão da Aprosoja sobre a Lei Kandir?

Carlos Fávaro
- Nós temos uma visão muito clara quanto a isso. A lei precisa incentivar o Brasil a ser exportador. Veja todos os recordes que o agronegócio proporciona na balança comercial. Se ele for onerado com impostos, certamente vai paralisar. Mas quem tem que desonerar é o governo federal. O governo federal criou a lei de desoneração e está mandando o governo estadual pagar a conta. É inadmissível. Portanto, nós temos um pacto com o governo do Estado de trabalhar em prol da restituição das perdas geradas pela Lei Kandir para Mato Grosso.

MidiaNews - O que o setor produtivo pode fazer quanto a isso?

Carlos Fávaro
- Existe a frente parlamentar da agropecuária – e temos um grande acesso a eles –, que já está fazendo reuniões com secretários estaduais. Inclusive o secretário adjunto [de Receita Pública, da Secretaria de Fazenda], o Marcel Cursi, já esteve lá. Existe um projeto de lei do deputado Sandro Mabel (PR-GO) prevê a criação de um fundo para resgatar essa restituição. Vamos trabalhar para que isso tramite rápido no Congresso, para que Mato Grosso e os outros estados produtores recebam da União aquilo que lhes é devido por conta da Lei Kandir. Assim, permitindo que o Estado mantenha sua sanidade financeira, e que os produtores continuem produzindo, exportando, e gerando excedentes para a balança comercial. Se for diferente, se tiver imposto, a produção para.


MidiaNews - É impossível exportar sem desoneração?

Carlos Fávaro
- O mundo inteiro não paga imposto na base da cadeia, é primário. Daí para cima, começa a gerar imposto. Veja bem, não é que não queremos pagar, é que se pagar imposto na base da cadeia, o alimento fica mais caro. A carne, o frango, o arroz, o feijão, o leite. Aí já começa mais caro na base, então, à medida que vai industrializando, vai pagando imposto e vai subindo o preço. Por isso o Brasil tem a Lei Kandir, de não cobrar na base da cadeia. Mas quem tem que pagar a conta é o governo federal, e eles não estão cumprindo esse compromisso. Segundo relatos do governador [Silval Barbosa], em 2011, Mato Grosso precisaria receber R$ 1 bilhão de retorno, e recebeu R$ 280 milhões. Se o governo decidir taxar o agronegócio para que Mato Grosso não perca, vai parar a produção. Então a nossa bandeira, junto com os estados exportadores, é cobrar do governo federal.

MidiaNews - Que impacto tem a cultura de soja no desenvolvimento das regiões vizinhas?

Carlos Fávaro
- É importante ressaltar que os IDHs [Índice de Desenvolvimento Humano] das regiões produtoras são comparáveis aos melhores IDHs do Brasil, e alguns aos melhores do mundo. Há uma ampla distribuição de renda onde está o setor produtivo. A soja gerou em 2010 para o Brasil um total de 1,8 milhão de empregos, contando os empregos diretos, os indiretos e os induzidos. A média salarial paga no campo é de R$ 980, enquanto no comércio é de R$ 900. No caso dos empregos nas indústrias, a média salarial é de R$ 921 e nas indústrias do gronegócio o valor médio do salário pago é de R$ 1,1 mil.

MidiaNews - Existe uma política agrícola em Mato Grosso? O Estado dá suporte aos produtores?

Carlos Fávaro
- Basicamente, não existe uma política estadual de incentivo nem aqui, nem em nenhum outro Estado da Federação.

MidiaNews - O que poderia ser feito pelo governo estadual nesse sentido?

Carlos Fávaro
- O que o Estado pode, e deve fazer, é ajudar na infraestrutura. Essa é a obrigação do Estado. Deve fazer manutenção de estradas, corredores de escoamento viáveis, para não inibir o avanço da produção.

MidiaNews - Que tipo de benefícios trariam para a produção mato-grossense vias de escoamento diferenciadas, como ferrovias e hidrovias?

Carlos Fávaro
- Eu considero essas vias a carta de alforria do Mato Grosso. O Estado vai se consolidar como o maior produtor brasileiro e até mundial. Um grande Estado produtor, eficiente. Nós vamos sair da dependência dos portos do Sul. Isso vai proporcionar, até mesmo, que eles sejam mais eficientes, porque a nossa safra entope e tumultua os portos do Sul do Brasil.

MidiaNews - Para qual porto vai a maior parte da produção?

Carlos Fávaro
- Para Santos, por rodovia e ferrovia. Mas uma parte, cerca de 17%, vai por hidrovia para o Norte. Nossa vocação é exportar pelos portos do Arco Norte, de São Luiz (MA) até Itacoatiara (AM). Passando por Vila do Conde (PA), Santarém (PA), Santana (AP). Quando isso acontecer, nós seremos muito mais competitivos. Vamos melhorar a renda do setor e do cidadão nesses estados por onde passaremos com a safra, e vamos desafogar os portos do sul.

MidiaNews - Qual a dificuldade de exportar pelos portos do Arco Norte? É muito caro chegar?

Carlos Fávaro
- O que falta hoje são vias de acesso. Agora é que os corredores estão chegando: BR-163, BR-158. BR-242, a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico). E não podemos perder a oportunidade da verdadeira vocação de transporte de Mato Grosso, que é a hidrovia. Nós temos duas coisas fundamentais para consolidar as hidrovias: rios navegáveis, e a produção, lado a lado com os rios. O rio Teles-Pires, Juruena, Araguaia, do ladinho da produção.

MidiaNews - Qual a dificuldade de implantar essas hidrovias?

Carlos Fávaro
- Boa vontade. Porque não é nem tão caro. Com R$ 9 bilhões é possível fazer o Centro-Oeste brasileiro ser competitivo. É muito mais barato implantar hidrovia que ferrovia, disparado. É claro que todos os modais se completam. Porque não tem como ter hidrovia sem rodovia. Você produz aqui, e como é que leva a produção até o rio? O problema é que nós fazemos verdadeiros trens sobre rodas, é comboio mesmo. Esse é o pior de todos os modais. Não é necessário acabar com as rodovias, pois precisamos delas para sair da fazenda. O interessante é os três modais juntos. Isso que vai dar eficiência para Mato Grosso.

MidiaNews - Existem também dificuldades com as licenças ambientais?

Carlos Fávaro
- Sem dúvida nenhuma. Os grandes gargalos não são financeiros, porque se o governo federal não tem o dinheiro para fazer as obras, o mundo tem. Nossos parceiros internacionais, como os chineses, têm. Os chineses querem fazer obras aqui porque se formos eficientes, eles vão comprar um pouquinho mais barato. Então é bom para eles, também. O grande problema é a burocracia das licenças. É muito ideológico. O Brasil perde a oportunidade de ser eficiente por excesso de burocracia.

MidiaNews - E quais os problemas com as estradas?

Carlos Fávaro
- Nós temos uma malha viária que melhorou, tanto estadual quanto federal, nos últimos dez anos. Muitos quilômetros de rodovias foram feitas, que já precisam de manutenção. Mas muitos quilômetros ainda precisam ser feitos. As rodovias ainda são muito deficientes. As estradas vicinais... existem MTs [rodovias estaduais] sem pavimentação asfáltica, muito mal-cuidadas. Até por isso, a Aprosoja, de forma pró-ativa, está fazendo um amplo estudo, de cada trecho de rodovia, de cada rota de escoamento. Estamos avaliando minuciosamente onde precisa de manutenção, de pavimentação, de acordo com a demanda, tanto de cidadãos como da carga que passa. Existem algumas que são viáveis mesmo sendo de terra, desde que faça bueiros, cascalhamento. Vamos apresentar esse grande estudo ainda em maio ao governo do Estado, para que usem esse banco de dados que o setor produtivo tem, para saber onde atacar os principais problemas. Às vezes gasta dinheiro em uma rodovia aqui, e ela não é tão fundamental como essa aqui do lado.

MidiaNews - Ainda existe a prática de os produtores se unirem e eles mesmos asfaltarem as estradas?

Carlos Fávaro
- São os consórcios. Eles vinham em um ritmo muito mais acelerado, diminuiu, mas esse foi o grande avanço do Estado. Mas chega num limite. O produtor passou por momentos muito difíceis, e não tinha mais capacidade financeira de fazer. Veio crises internacionais e isso foi desmobilizado. Mas acho que é uma proposta ainda a se fazer para o governo do Estado, porque o Estado tem muitos equipamentos que não estão dando manutenção. Que o Estado então faça parceria com produtores, e coloque esse maquinário à disposição.

MidiaNews - Mesmo diante de todas essas dificuldades, podemos esperar que Mato Grosso continue sendo o ‘celeiro’ do Brasil, o grande produtor de alimentos?

Carlos Fávaro
- É a nossa vocação. Já houve tempos em que ficávamos disputando com o Paraná, mas já há alguns anos, Mato Grosso vem sendo o maior produtor. Imagine então quando essas obras de infraestrutura acontecerem, e incorporarmos mais hectares. A previsão para 2013 é plantar soja em uma área de 7,4 milhões de hectares. Sem desmatamento, só transformando pastagens, temos outros 7,7 milhões de hectares que podem ser incorporados.

MidiaNews - São pastagens abandonadas?

Carlos Fávaro
- Não, elas estão em uso. Mas são pastagens que estão sendo usadas de forma extensiva, uma cabeça por hectare por exemplo. Se transformar isso em agricultura, dá para dobrar o tamanho na nossa produção. Hoje nós temos uma área um pouco maior que o Paraná, que é o segundo colocado, e eles não têm essa capacidade de expansão. Com a expansão, a diferença será gigantesca, nós vamos nos consolidar como o grande produtor de alimentos. E isso sem nenhum desmatamento.


MidiaNews - Mas, se a soja avançar sobre a pecuária, os pecuaristas não vão avançar sobre a vegetação e abrir novas pastagens?

Carlos Fávaro
- Não é assim, porque hoje está mapeado onde é possível de incorporar. E à medida que se faz a renovação da fertilidade, vamos trazendo a pecuária para um novo modelo. Você pode consorciar agricultura com a pecuária. Você reserva um pedaço da área para ter pecuária. E o pasto, depois de corrigido, depois de calcariado, com mais fertilidade, sai de menos de uma cabeça por hectare para 4 ou 5. Com uma integração com granjas, chega a 10 cabeças por hectare.

MidiaNews - Tudo isso mantendo o boi verde, que come só pasto?

Carlos Fávaro
- Com certeza, pois essa é a nossa vocação. O gado comendo pasto e, talvez, suplementos com grãos produzido nessa própria terra. Esse é o consórcio: parte dos grãos que eu produzo, uso para fazer ração e suplementar o gado.

MidiaNews - Isso já está sendo aplicado aqui no Estado?

Carlos Fávaro
- Claro, essa é integração lavoura-pecuária que já existe. A propriedade passa a ser mais eficiente.

MidiaNews - Na visão da Aprosoja, a produção de soja, hoje, em Mato Grosso, é ambientalmente sustentável, ou mesmo está próxima disso?

Carlos Fávaro
- Com toda a certeza. Não existe produtor no mundo mais sustentável que o brasileiro, ou especificamente o mato-grossense. Apenas 7% da nossa área está ocupada com agricultura. Outros 23%, é com a pecuária. E mais de 60% do nosso território é completamente fechado com vegetação nativa. Além disso, temos o plantio direto, que não movimenta a terra com arado. Você deixa o resquício de plantações anteriores dessecando, e vira uma palha, então vem com a plantadeira em cima, coloca adubo, e não mexe no solo. Com a terra gradeada, em essa proteção, você tira a vegetação natural e deixa o solo vulnerável às chuvas e à erosão. Quando você faz o plantio direto, não mexe no solo, e mantém uma proteção natural com a palhada. O próprio abandono do trator para gradear a terra, que queimaria combustível e emite gás carbônico, já faz diferença. Mais de 95% da plantação de Mato Grosso é plantio direto. Além disso, temos a devolução de embalagens de agrotóxico, que é 100% reciclada em Mato Grosso. Somos o líder mundial.

MidiaNews - Os agrotóxicos são pulverizados sobre a plantação?

Carlos Fávaro - Eles são pulverizados com equipamento específico. Antigamente era tratorizado, hoje são equipamentos auto-propelidos, aqueles ‘gafanhotos’ que vão passando com uma barra grande. A aviação agrícola é feita se houver alguma má condição de tempo, e precisa ser feito de forma rápida.

MidiaNews - Existem estudos do impacto desses agrotóxicos no lençol freático, na contaminação da água que vai alimentar a própria fazenda?

Carlos Fávaro - Não existe, no mundo, produto químico com maior dificuldade de licença que no Brasil. Aqui, precisa passar por três crivos, na esfera federal, para ter a licença: Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis], Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] e Ministério da Agricultura. Se não tiver essas três chancelas, o produto não é liberado para ser comercializado. Nos Estados Unidos, precisa de uma chancela só. Depois disso, vem o receituário agronômico, o responsável técnico diz a dose, a velocidade, a condição de clima. Aliado a isso, as obrigatoriedades das leis trabalhistas, como equipamentos de segurança. É altamente prevenido. Se acontecer alguma coisa, se houver algum erro nesse processo, a culpa não é do produtor. Ele passa a ser vítima, no nosso entendimento. Porque ele só compra um produto que foi licenciado por três órgãos federais, depois ele só aplica com receituário agronômico. Se, ainda assim, houver dano ambiental, o produtor é vítima. Ele está sendo conduzido. Não é querer passar de coitadinho, é que o Brasil é muito bem regulamentado nesse sentido. Por isso que essa questão de contaminação, certamente, é mais folclore que realidade. Até porque não é você que está na cidade que vai ser contaminado. É meu filho, meu irmão, meu sobrinho que está na fazenda. A primeira vítima seria minha família. Nós não somos bandidos do agrotóxico, que querem matar todo mundo na cidade com uma dosinha de veneno na ração.

MidiaNews - Qual sua avaliação sobre os produtos orgânicos?

Carlos Fávaro - A qualidade dos produtos orgânicos é um mito. Orgânico é o alimento cultivado sem nenhum tipo de defensivo nem fertilizante químico. Um alimento orgânico de verdade acaba sendo um tomatinho raquítico, uma cenoura menor. Tem gente que acha uma delícia, porque é livre de qualquer química. Eu sou contra orgânico mesmo. Na minha família, eu não quero isso. Porque eu quero que a minha família consuma o melhor alimento. Se aquela cenoura, aquele tomate é assim, porque não teve adubação química, é porque faltou alguma coisa para ele, e está faltando algum nutriente. Sem defensivos, não tem condições de cultivar aqui. Eu nunca vi ninguém morrer por isso.

MidiaNews - O solo daqui é mais suscetível a pragas?

Carlos Fávaro - Não é isso, não. Sem defensivos não se cultiva em lugar nenhum. Mas talvez a questão climática, como temos um clima muito quente e muito úmido... nos Estados Unidos, do Meio-Oeste para o Norte, não tem ferrugem asiática. Porque lá geia, neva, acaba com tudo. Aqui, passa esse calorzão o ano inteiro, e quando vem a chuva, fica propício para o fungo se procriar. E isso precisa ser combatido com químicos. Se não houvesse produtos químicos, certamente sairíamos dessa produtividade máxima de cerca de 65 sacas por hectare, e cairia para 15 sacas por hectare. Já imaginou quanto seria o preço da soja e, consequentemente, o preço da carne? Por que os animais se alimentam de ração.

MidiaNews - Qual a importância do circuito Aprosoja, que começa na segunda-feira (16)?

Carlos Fávaro - No circuito, debatemos o planejamento da próxima safra. Se houve um problema de ferrugem asiática, por exemplo, debatemos que práticas podemos tomar a partir de agora para que a ferrugem não nos cause prejuízo. Levantamos qual o percentual da safra está comercializada, os preços. Informamos os produtores se é um momento bom para vender antecipado. Aconselhamos sobre planejamento e organização para preparar o novo plantio. E temos sempre, no Circuito Aprosoja, um segundo tema, que é de atualidades.

Por exemplo, em 2010, que foi um ano de eleição, nós debatemos a eleição. Não era um debate partidário, dizendo para votar na Dilma Rousseff (PT) ou no José Serra (PSDB) para a Presidência. Mas fizemos um esclarecimento, explicamos qual o perfil deles e as tendências de como seria a política agrícola de cada um. Informamos o que eles pensavam sobre o agronegócio, que políticos estavam apoiando cada um. Em 2011, falamos sobre a comunicação com a sociedade urbana. Este ano, o tema escolhido pela base foi a sucessão familiar.

MidiaNews - Por que esse tema foi escolhido?

Carlos Fávaro - Fazemos pesquisas com os produtores para saber o que eles querem ouvir, e levamos as palestras. Esse tema de sucessão familiar é muito recorrente hoje em Mato Grosso. Aqueles jovenzinhos que vieram para cá cheios de ideais, há cerca de 30 anos, hoje não são mais tão jovens. Muitos continuam na ativa, no comando dos negócios, mas já têm filhos, sobrinhos, alguns têm netos. Entre esses, alguns têm vocação para o negócio, gostam de lidar com a terra, outros não. Existe um modelo de gestão que pode ser feito para o negócio continuar sem brigas familiares, sem trauma, e é isso que vamos levar nessas palestras. Quem gosta do negócio, vai tocar, e receber um salário por isso. Mas os dividendos, os lucros, têm que ser rateados por todos os sócios, mesmo aquele que saiu da fazenda e virou dentista ou jornalista.

MidiaNews - Profissionalizar a propriedade rural?

Carlos Fávaro - Isso. Levar gestão.

MidiaNews - A Aprosoja também visita as propriedades, verifica in loco a situação do produtor?

Carlos Fávaro - Fazemos isso no Circuito Tecnológico, que ocorre em outubro e novembro. Vamos percorrer as propriedades e acompanhar o que está sendo utilizado pelo produtor, fazemos um comparativo e depois indicamos as melhores práticas. Nós vamos com pesquisadores, técnicos, alunos de faculdade, engenheiros agrônomos. Tabulamos os produtores que estiverem com práticas erradas, para saber qual o percentual de produtores que utilizam aquela prática, que não é a ideal. Aí soltamos uma recomendação.
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