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Bunge e Cargill ainda sem solução


O julgamento pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) de três operações realizadas pelas multinacionais Bunge e Cargill no mercado nacional de fertilizantes está ganhando ares de novela, com a apresentação de pedidos de vista a cada voto proferido. Até agora, três conselheiros - dos sete que compõem o plenário do tribunal da concorrência - votaram, defendendo restrições mais brandas do que as sugeridas pelas secretarias de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça e de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda.

Em pareceres divulgados em 2002, SDE e Seae recomendaram que parte dos ativos negociados fosse revendida a outros concorrentes do setor e apontaram como possíveis compradores a norueguesa Norsk Hydro e a francesa Defer-Roullier, que já atuam nas regiões Nordeste e Sul do País. Além de incrementar a competição, as restrições impediriam que Bunge e Cargill controlem oito das nove cadeiras e as decisões do conselho de administração do Consórcio Fertifós, controlador da Fosfértil e da Ultrafértil e principal produtor brasileiro de matérias-primas e de fertilizantes básicos fosfatados e nitrogenados.

"Bunge e Cargill têm a possibilidade de impedir a entrada de novos concorrentes no mercado de produção de fosfatados e de misturas NPK", diz o parecer da SDE. "A Fosfértil e Ultrafértil vêm aumentado o percentual de vendas dos produtos fosfatados básicos aos seus acionistas, em detrimento de outros possíveis compradores não representados na composição acionária do consórcio. Isso mostra que, ainda que no setor de misturas NPK a possibilidade de exercício de poder de mercado seja bem menor que na produção de fosfatados básicos, a integração vertical com ela tende a dificultar também a entrada de novos concorrentes na região central do País", acrescenta.

Votos

No dia 19 de novembro, o relator dos três casos, conselheiro Thompson Andrade, votou pela aprovação das operações mediante a eliminação de qualquer exigência aos clientes das controladas do Consórcio Fertifós de fornecer informações relativas às importações por eles realizadas ou previstas como condição para a concessão do prêmio fidelidade. Tal prêmio prevê um desconto de 2% sobre o valor das compras anuais de uma misturadora apenas se ela recorrer ao próprio consórcio para comprar insumos adicionais aos estipulados no contrato entre as partes. Importação, só se autorizada pela Fertifós, caso contrário nada de desconto.

"Outros incentivos podem ser encontrados para otimizar o escoamento da produção sem que se imponha à clientela a abertura de informações sensíveis como quando, onde, de quem e a que preço importar, dado que o livre acesso às importações representa o único mecanismo garantidor das condições competitivas no mercado de fertilizantes básicos e finais. Considerando as reduzidas margens auferidas pelas misturadoras no competitivo mercado de fertilizantes finais, a retirada deste desconto para concorrentes mais aguerridos enfraquece o dinamismo da concorrência neste mercado", disse o relator.

Em 26 de novembro, o conselheiro Fernando de Oliveira Marques ratificou o voto de Andrade, mas defendeu a necessidade de assinatura de um Termo de Compromisso de Desempenho (TCD) entre Cade, Associação de Misturadores de Adubo (AMA), Bunge e Cargill a fim de garantir acesso à política de descontos por quantidade de insumo a pools de pequenos e médios misturadores. Na última quarta-feira, o conselheiro Roberto Pfeiffer acompanhou o relator, aceitou a sugestão de Marques, mas votou pela exclusão da AMA entre os signatários do TCD. O processo foi suspenso em razão de pedido de vista do conselheiro Cleveland Prates Teixeira.

As operações

Todas as operações em análise repercutem no Consórcio Fertifós. Na primeira delas, realizada em dezembro de 1999, a Serrana S/A, subsidiária do grupo Bunge, comprou as ações ordinárias que a Nevada Woods Sociedad Anônima detinha na Ouro Verde S/A, correspondentes a um terço do capital social da empresa. Os outros dois terços pertenciam à época à Serrana Participações S/A (Serranapar), também controlada pela Bunge, e à Manah S/A. Na segunda operação, a mesma Serrana, em março de 2000, adquiriu a parte da Manah na Ouro Verde.

Com as duas transações, a Bunge conquistou mais 23,07% do capital social da Fertifós, elevando sua participação para cerca de 52%, e ampliou de dois para cinco o número de cadeiras sob seu controle no conselho de administração do consórcio, em um total de nove. Na terceira operação, a Cargill, em maio de 2000, comprou o controle acionário da Fertinal Administração Empreendimentos e Participações Ltda (Fertiza). E passou a deter 33,07% de participação no Consórcio Fertifós, além de três vagas no seu conselho de administração.

A SDE sugeriu aos conselheiros que só aprovem a transação que resultou no controle total da Ouro Verde pela Bunge caso esta aliene 100% das ações ordinárias pertencentes à Manah antes da operação, o que implicaria a perda de três cadeiras no Conselho de Administração do Consórcio Fertifós. E defendeu que o comprador dos ativos não pode ser "evidentemente" nem a Cargill, nem subsidiária da Bunge, nem empresa com participação acionária superior a 10% na Fertifós. A SDE também recomendou a venda pela Cargill de 50% da participação ordinária com direito a voto na Fertifós que anteriormente pertenciam a Fertiza, suficiente para perda de um membro no conselho de administração do consórcio.

Para a secretaria, a diminuição no número de integrantes indicados pela Bunge e pela Cargill no Conselho de Administração da Fertifós é necessária para impedir que os grupos, atuando em parceria, decidam sozinhos sobre as incursões de mercado do consórcio – qualquer deliberação depende do aval de sete dos noves membros, ou seja, um a menos do que a soma das cadeiras das duas empresas.

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