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Manejo e tecnologia contra o La Niña

Em ano de pouca chuva, produtores se protegem como podem para amenizar o impacto das adversidades climáticas


Em ano de pouca chuva, produtores se protegem como podem para amenizar o impacto das adversidades climáticas. Tem até quem “faça chover”, com a reativação dos pivôs de irrigação, pouco comuns na Região Sul

Mesmo cientes da ameaça que o La Niña representa para a produção de grãos nesta safra, os agricultores do Sul brasileiro decidiram não recuar. Mantiveram investimentos em tecnologia de produção, estão aproveitando cada chuva para o plantio e de­­monstram confiança nas estratégias de redução do risco climático. A região mais suscetível do país à falta de chuva neste verão está concretizando suas apostas – com a soja tomando área do milho pelo segundo ano consecutivo – e espera alcançar índices de produtividade próximos dos registrados no ano passado nas duas culturas.

Com sementes mais resistentes à seca e maior conhecimento sobre técnicas e época de plantio, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul mostram-se mais preparados do que nunca para enfrentar o clima desfavorável à agricultura, constatou a Expedição Safra Gazeta do Povo na última semana. Em duas equipes, técnicos e jornalistas percorreram 4,6 mil quilômetros na Região Sul, visitando cooperativas, consultorias e 55 produtores de diferentes zonas agrícolas. Agricultores e especialistas afirmam que, se realmente houver seca, a produtividade deve ficar abaixo dos recordes dos últimos anos, mas dizem que o potencial é de superação.

O plantio do milho está chegando ao final perto de duas semanas mais tarde do que em 2009 em toda a região. A soja tem quadro inverso. As plantadeiras recuperaram o tempo perdido no Paraná e já percorreram perto de metade da área reservada à cultura. Em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, a semeadura da oleaginosa, concentrada em novembro, segue perto dos 10%. Em ambas as culturas, o zoneamento climático vem sendo cumprido, apesar de nem sempre o produtor conseguir semear na melhor época da janela de plantio.

Cruz Alta, no Noroeste gaúcho, é um caso emblemático. Os produtores contam que, sempre que há seca, recebem ainda menos chuva que em cidades agrícolas vizinhas. Não à toa, ampliam gradualmente as áreas irrigadas. Os pivôs, no entanto, são reservados normalmente ao milho, que alcança índices de produtividade acima de 11 mil quilos por hectare na região. Mesmo assim, há previsão de bom rendimento de soja (sem irrigação). Na comparação com outros anos de La Niña, como 2007/08 e 1998/99, hoje o campo está mais preparado, afirma Romilton de Bortoli, que cultiva 4,8 mil hectares com a oleaginosa. Ele espera atingir 2,7 mil quilos por hectare, ante 2,52 mil registrados na última temporada. Com os preços da soja melhores, o milho teve a área reduzida. “Se não contasse com irrigação, não plantaria um pé de milho este ano”, disse o agricultor Airton Becker. Ele dedica 220 hectares com irrigação ao cereal e outros 739 hectares (50 ha irrigados) para a oleaginosa.

As estratégias que reduzem o impacto da falta de chuva começam na semente. Materiais que recebem tratamento desenvolvem raízes mais profundas, relatam os técnicos. As sementes são plantadas com maior profundidade. Assim, podem até demorar mais para emergir, mas resistem no solo sem muita umidade por mais tempo. Na fase de de­­senvolvimento, adubação bem dosada e mais profunda aumenta a resistência das plantas.

O manejo também é decisivo. A semeadura vem sendo escalonada onde ocorre chuva bem distribuída. Assim, há menos risco de todos os talhões estarem em fase crítica justamente num período de estiagem. Boa parte das regiões, contudo, não está contando com chuva regularmente, com previsão de concentração das atividades também na colheita. A cooperativa Coamo, de Campo Mourão (Centro-Oeste do Paraná), por exemplo, prevê que vai receber 70% da safra de milho e soja entre 15 de fevereiro e 15 de março.

No entanto, o escalonamento se dá também com a diversificação dos ciclos produtivos na mesma propriedade. Os produtores esperam que os lotes cultivados com sementes superprecoces estejam bem desenvolvidos no final de dezembro, e que os de ciclos médio e longo ainda tenham tempo de se recuperar, a partir de janeiro, de uma eventual estiagem no final do ano.

O escalonamento dificulta o controle de pragas, aponta José Renato Bouças Farias, chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Soja, com sede em Londrina (Norte do Paraná). “Cada produtor precisa avaliar sua condição. Há casos em que é melhor enfrentar o risco climático. A rentabilidade e a sustentabilidade da produção são mais importantes do que um pequeno incremento na produtividade.”

Há regiões em que uma certa quebra, mesmo com todas as precauções, é dada como certa. “O La Niña afeta o milho bem na floração em nossa região”, afirma Valério Sernajoto, técnico da cooperativa Coacer, de Campos Novos, região catarinense que atinge de 9 mil quilos do cereal por hectare.

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