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Sementes comestíveis

Entrevista com Paulo César Tavares de Melo, professor da USP/ESALQ


Diante de um prato tipicamente brasileiro temos, essencialmente, duas sementes comestíveis – o arroz e o feijão. Porém, o consumo de sementes diretamente na alimentação é de uso muito amplo e ocorre não só por meio da semente seca, como também de forma imatura. Paulo César Tavares de Melo, professor do Departamento de Produção Vegetal (LPV), da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (USP/ESALQ), destaca quais são essas sementes e aponta a classificação das mesmas.
 
Quais são as partes das diversas espécies das plantas que podem ser consumidas e quais são as mais importantes?

(Paulo Cesar Tavares de Matos) Das seis partes das plantas (raízes, caules, folhas, flores, frutas e sementes) que são consumidas, as sementes são a fonte mais importante na alimentação humana. Desde há 11 mil anos, quando o homem passou a cultivar espécies provedoras de alimento, as sementes de cereais constituem a fonte de alimento mais importante, seguidas pelas de leguminosas e nozes. Três espécies (trigo, milho e arroz) são consideradas os alicerces para a civilização e, até os tempos atuais, continuam sendo à base da alimentação humana.
 
Qual a diferença entre grãos e sementes?

(Tavares de Matos) A diferença básica entre semente e grão é que a semente precisa estar viva, ou seja, capaz de germinar e produzir uma nova planta quando proporcionadas às condições favoráveis, enquanto o grão é destinado ao consumo como alimento ou matéria-prima para a indústria. Dessa forma, a qualidade da semente é medida por seu estado fisiológico, ao passo que a qualidade do grão é aferida por sua aparência e pelas propriedades físico-químicas que caracterizam sua aptidão para consumo de mesa ou transformação industrial.
 
Como as sementes se agrupam?

(Tavares de Matos) Existem várias maneiras de agrupar as sementes utilizadas como recurso alimentar. Em geral, as classificações de chefes de cozinha ou gastrônomos contem equívocos e informações desprovidas de fundamentação científica. Costumo adotar essa classificação de sementes comestíveis da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations):

Sementes de leguminosas – são consideradas também como sementes protéicas porque têm predominância de aminoácidos em sua composição. São consumidas predominantemente secas, mas em algumas espécies as sementes são consumidas também na fase imatura (feijão-verde ou cowpea, ervilha verde, favas, soja verde). Nessa categoria estão incluídas as seguintes culturas: feijões de todos os tipos, favas, ervilha, lentilha, soja, grão-de-bico, amendoim. 

Sementes de cereais – Botanicamente, os cereais pertencem à família das poáceas ou das gramíneas. As sementes são colhidas secas para serem utilizadas na alimentação humana. Fornecem a metade de todas as calorias consumidas no mundo. As sementes de cereais são a matéria-prima de farinhas usadas na panificação, na pastelaria, na indústria de massas bem como de outros alimentos, óleos de cozinha, bebidas (cerveja). Essa categoria compreende as seguintes espécies: arroz, trigo, milho, cevada, triticale, centeio, milheto, sorgo e aveia.

Nozes – botanicamente as nozes são um tipo específico de fruto, mas o termo é também aplicado a muitas sementes comestíveis que não são sob o ponto de vista botânico nozes. De acordo com a definição botânica, nozes compreendem um tipo particular de sementes.  Castanhas e avelãs são exemplos de nozes segundo essa definição. Em termos culinários, no entanto, o termo é empregado mais amplamente por incluir frutos que não são botanicamente qualificados como nozes, mas que tem a aparência e o uso culinário similares aos das nozes. Estão incluídas nas nozes: côco, castanha do Pará, castanha de caju, avelã, noz-pecã, macadamia, pistachio entre outras.
 
Como são classificadas as sementes que oferecem predominância de elementos oleosos em sua composição como a soja, girassol, amendoin e outras com a mesma peculiaridade?

(Tavares de Melo) Na classificação das sementes comestíveis da FAO, as sementes de oleaginosas como a soja, girassol, gergelim, linhaça, amendoim, mostarda, colza, algodão etc., não compreendem uma categoria à parte. Na verdade, algumas dessas espécies de plantas estão incluídas nas categorias das sementes de leguminosas e de cereais. O problema surge quando sementes oleaginosas não estão incluídas nem na categoria das leguminosas nem na dos cereais (colza, mostarda, algodão, girassol). Do meu ponto de vista, a FAO não considera as sementes de oleaginosas um recurso alimentar de consumo direto nas formas seca ou fresca (ao natural), sendo, na verdade, matéria-prima para a extração de óleos comestíveis.
 
E as sementes de especiarias são contempladas pela FAO? 

(Tavares de Melo) Da mesma forma, a classificação da FAO não contempla as sementes de especiarias que compreendem sementes secas de coentro, cominho, urucum, pimenta-do-reino, pimenta-da-jamaica, cardomomo, erva-doce, papoula, urucum/colorau entre outras. Para a FAO, ninguém usa especiarias, ervas aromáticas, condimentos ou temperos como alimento, mas tão somente como um aditivo de sabor, aroma e cor no preparo de comidas das mais diferentes etnias.
 
Em alguns países existem as tradições locais de consumo. O senhor pode dar um exemplo de uma relacionada à saúde?

(Tavares de Melo) Falamos muito da soja que vai se transformar em óleo, farelo, mas existe a soja hortaliça, um grão verde muito utilizado na cultura oriental. Eles dizem que as mulheres orientais não sofrem os efeitos da menopausa porque desde pequenininas a consomem.
 
E como se dá a utilização das sementes na gastronomia?

(Tavares de Melo) Os grandes chefs exploram o exotismo e o paladar de coisas que são estranhas para nós. A chia, por exemplo, é uma semente que elimina gordura e por isso hoje está na moda. Também existem sementes caríssimas que são importadas para restaurantes estrelados e, muitas vezes, quem frequenta esses espaços não tem ideia de como é rica a nossa disponibilidade de recursos alimentares. Não é um fruto como o tomate ou uma vagem como a ervilha torta. Não são folhas como as alfaces ou como o repolho. É simplesmente semente seca ou em sua fase imatura que enriquece a culinária mundial.
 
Os pesquisadores trabalham no sentido de divulgar ou resgatar recursos outrora utilizados?

(Tavares de Melo) Sim, principalmente em relação às hortaliças subutilizadas como, por exemplo, o feijão fava (Phaseolus lunatus), leguminosa riquíssima em proteína e carboidratos e muito saborosa.
         
É importante que a população conheça essa variedade enorme de sementes?

(Tavares de Melo) Temos nas sementes um recurso alimentar secular desde que o homem passou a praticar a agricultura. Elas são, portanto, o esteio da humanidade. Muitas vezes, o consumidor quando está diante dessa diversidade de alimentos não avalia que aquele produto que está consumindo é o mesmo que o agricultor utiliza para instalar seus cultivos.

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