Foi publicada a Resolução nº 5.247, de 19 de setembro de 2025, do Conselho Monetário Nacional (CMN), que regulamenta a Medida Provisória n. 1.314/2025. Este normativo estabelece condições especiais para a contratação de novas operações de crédito rural destinadas à liquidação ou amortização de dívidas decorrentes de perdas climáticas.
Esta análise detalha as disposições da resolução, categorizando os beneficiários em dois grupos distintos e explorando os requisitos e condições aplicáveis, visando oferecer um panorama jurídico e operacional para a tomada de decisões estratégicas.
Estrutura de Acesso ao Crédito: Dois Grupos de Enquadramento
A resolução estabelece um sistema de acesso ao crédito diferenciado, segmentando os produtores em dois grupos principais, cada um com requisitos e modalidades de financiamento específicas.
1. Grupo com Recursos Controlados
Este primeiro grupo é elegível a linhas de crédito com recursos subsidiados, caracterizadas por taxas de juros reduzidas e prazos favoráveis.
Operações Abrangidas: Estão enquadradas operações de crédito de custeio e de investimento, ainda que já tenham sido objeto de renegociação ou de prorrogação, bem como as Cédulas de Produto Rural (CPRs), desde que as operações tenham sido emitidas até 30 de junho de 2024 e em situação de adimplência até esta data.
A elegibilidade a este grupo demanda o atendimento simultâneo das seguintes condições:
a) O empreendimento objeto das operações deve estar localizado em municípios que “tenham decretado estado de calamidade pública ou situação de emergência em pelo menos dois anos no período de 1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2024, em decorrência de enxurradas, alagamentos, inundações, chuva de granizo, chuvas intensas, tornados, onda de frio, geada, vendaval, seca ou estiagem, com reconhecimento do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional”. Adicionalmente, no período de 1º de julho de 2020 a 30 de junho de 2025, é obrigatória a comprovação de duas perdas de, no mínimo, “20% (vinte por cento) do rendimento médio da produção, em pelo menos duas das três principais atividades agrícolas, conforme informação disponibilizada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária”, segundo critérios específicos da normativa.
b) O beneficiário deve comprovar perdas em duas ou mais safras no período de 1º de julho de 2020 a 30 de junho de 2025 de, no mínimo, “30% (trinta por cento) da produção das atividades financiadas que terão o saldo devedor liquidado ou amortizado com a nova linha de crédito, em decorrência dos eventos climáticos adversos” referidos anteriormente.
c) O beneficiário deve “apresentar dificuldades no fluxo de caixa devido ao impacto acumulado de perdas de safra decorrentes dos eventos climáticos adversos”, que “causaram aumento do endividamento no Sistema Nacional de Crédito Rural – SNCR e impossibilitaram o reembolso integral das operações de crédito rural, cabendo à instituição financeira analisar o conjunto das atividades e a capacidade econômica do mutuário”.
Condições Financeiras:
- Limites de Crédito: A resolução estabelece limite de crédito, sendo Pronaf até R$ 250.000,00, Pronamp até R$ 1.500.000,00 e demais produtores: até R$ 3.000.000,00.
- Prazo de Reembolso: Até 09 (nove) anos, incluindo 01 (um) ano de carência.
- Taxas de Juros: De 6% (seis por cento) a 10% (dez por cento) ao ano, conforme o enquadramento.
- Prazo Final: As operações devem ser contratadas até 10 de fevereiro de 2026.
2. Grupo com Recursos Livres
Este grupo abrange os produtores que, embora enfrentem dificuldades, não se enquadram nos requisitos estritos do primeiro grupo, tendo acesso a linhas de crédito com recursos livres das instituições financeiras, ou seja, sem subsídio governamental direto.
Operações Abrangidas: Neste caso, é permitida a contratação de operação para liquidação ou amortização de:
a) Parcela ou a totalidade de operações de custeio e investimento ao amparo do Pronaf, Pronamp e pelos demais produtores;
b) CPRs emitidas em favor de instituições financeiras;
c) CPRs emitidas em favor de cooperativas e fornecedores de insumos, desde que as operações de crédito rural de custeio e investimento e as CPRs tenham sido originalmente contratadas ou emitidas até 30 de junho de 2024, estivessem em situação de adimplência em 30 de junho de 2024 e que: “I - estavam em situação de inadimplência em 5 de setembro de 2025; ou II - tenham sido renegociadas ou prorrogadas com vencimento da parcela ou da operação previsto para o período de 5 de setembro de 2025 a 31 de dezembro de 2027 e estejam em situação de adimplência na data de contratação desta linha de crédito”;
d) Operações adimplentes em 05 de setembro de 2025, desde que os recursos sejam utilizados para amortização ou liquidação de operações que o beneficiário comprove perdas em duas ou mais safras no período de 1º de julho de 2020 a 30 de junho de 2025 de, no mínimo, “30% (trinta por cento) da produção das atividades financiadas que terão o saldo devedor liquidado ou amortizado com a nova linha de crédito, em decorrência dos eventos climáticos adversos” referidos anteriormente;
Esta linha de crédito (Com origem em Recursos Livres) somente será concedida ao beneficiário que “apresente dificuldades no fluxo de caixa devido ao impacto acumulado de perdas de safra decorrentes dos eventos climáticos adversos”, conforme consta da própria resolução, “que causaram aumento do endividamento no Sistema Nacional de Crédito Rural – SNCR e impossibilitaram o reembolso integral das operações de crédito rural, cabendo à instituição financeira analisar o conjunto das atividades e a capacidade econômica do mutuário”.
Condições Financeiras:
- Prazo de Reembolso: Até 09 (nove) anos, incluindo até um ano de carência (conforme capacidade de pagamento do mutuário).
- Taxas de Juros: Devem ser negociadas livremente entre as partes.
- Garantias: As garantias admitidas são as usuais para operações de crédito rural.
- Prazo Final: As operações devem ser contratadas até 15 de dezembro de 2026.
Crítica e Perspectivas da Resolução CMN nº 5.247/2025
A normativa, no que tange aos recursos subsidiados do crédito rural, apresenta critérios bem restritivos, o que deve limitar, em muito, sua abrangência. Para o segundo grupo, a negociação com instituições financeiras a partir de recursos livres tende a resultar em taxas de juros que podem ser inviáveis (e até mesmo ilegais) para muitos produtores.
Adicionalmente, a exigência de garantias pode comprometer o patrimônio do devedor, fundamental para a continuidade da atividade produtiva e sua subsistência.
O Mecanismo do Manual de Crédito Rural (MCR) como Alternativa
É fundamental ressaltar que o produtor ainda pode recorrer ao tradicional mecanismo previsto no Manual de Crédito Rural (MCR). Este permite a manutenção da operação original, ajustada à nova capacidade de pagamento do produtor, mantendo-se as mesmas taxas e as mesmas garantias, desde que preenchidos os requisitos legais. Esta via representa uma alternativa jurídica consolidada e passível de ser explorada.
Recomendações e Ações Estratégicas
Cabe ao produtor rural analisar sua situação financeira e produtiva, verificando o enquadramento nos termos da Resolução CMN nº 5.247/2025. Havendo elegibilidade, é imperativo requerer os benefícios formalmente ao credor o quanto antes, dada a natureza limitada dos recursos e prazos.
Em qualquer situação de negativa indevida por parte do credor, o acesso ao judiciário para fazer valer o direito assegurado em lei é uma prerrogativa, visando a manutenção da produção agropecuária. A busca por assessoria jurídica especializada é crucial para a defesa dos interesses do produtor.
Fábio Lamonica Pereira
Advogado em Direito Bancário e do Agronegócio