CI

Recursos Forrageiros para o Estabelecimento de Pastagens


Newton de Lucena Costa

Na Amazônia, a pecuária de corte e/ou de leite vem nos últimos anos apresentando um acelerado crescimento. Na Amazônia Legal, o rebanho saltou de 8,5 milhões em 1974 para 93 milhões de animais em 2020, o que representa quase 43% do rebanho nacional. Atualmente, é uma das atividades de maior expressão econômica na região. Deste modo, os tradicionais processos extensivos de exploração vem sendo gradativamente substituídos por outros mais racionais e modernos, onde a formação, recuperação e melhoramento das pastagens, com espécies mais adequadas (alto rendimento e bom valor nutritivo da forragem), vem sendo observado com maior interesse pelos criadores, por se tratar de um fator de elevada importância para a obtenção de maiores produções de carne e/ou leite. O suporte alimentar dos rebanhos é constituído, basicamente, por pastagens cultivadas, as quais apresentam como principal componente florístico as gramíneas forrageiras. No entanto, face a utilização de práticas de manejo inadequadas (germoplasma pouco adaptado a região, sistema de pastejo continuo, pressões de pastejo elevadas, ausência de fertilizações de manutenção etc.), além de serem estabelecidas em solos de baixa fertilidade natural ou exauridos por sucessivos cultivos anuais, estas pastagens tem apresentado limitações quanto a produtividade, qualidade da forragem e persistência. Ademais, a formação de extensas áreas de pastagens monoespecíficas se contrapõe a diversidade dos ecossistemas naturais das florestas tropicais úmidas, já que, uma vez rompido o equilíbrio ecológico, há o favorecimento para a proliferação da população de diversos organismos (insetos, fungos, bactérias, vírus, nematóides e plantas invasoras), que se constituem em fatores que contribuem para a instabilidade e degradação destas áreas de pastagens. Deste modo, a diversificação das pastagens, através da utilização de gramíneas e leguminosas forrageiras pertencentes a gêneros e espécies diversas, tanto em pastagens puras quanto em consorciadas, surge como uma opção ambiental e economicamente viável para a formação, recuperação e/ou renovação de pastagens. Nesse contexto, torna-se necessário a intensificação dos estudos de introdução e avaliação de germoplasma forrageiro nativo ou exótico, a fim de obter-se um maior numero de opções para a formação, recuperação e/ou renovação de ecossistemas diversificados de pastagens. Como conseqüência natural de um ativo e extenso programa de melhoramento genético, introdução e avaliação de germoplasma forrageiro, novos materiais são selecionados continuamente como promissores, os quais devem ser testados em diferentes condições ecológicas, visando aumentar a oferta de novas cultivares no mercado, alem de solucionar os dois maiores problemas que limitam a produção animal, ou seja, a qualidade e a quantidade de forragem disponível.

A predominância de pastagens estabelecidas com um numero reduzido de espécies contribui para aumentar acentuadamente o risco de fracasso das atividades agropecuárias na região, em função, principalmente, da possibilidade de ocorrência de agentes bióticos (pragas e doenças) que venham a afetar, de forma, irreversível, a produtividade e persistência destas pastagens. Deste modo, uma das alternativas para minimizar tais efeitos, consiste na identificação e seleção de gramíneas e leguminosas forrageiras bem adaptadas as condições ecológicas da região e que apresentem alta produtividade, persistência e composição química compatível com as exigências dos animais. Este mecanismo representa o primeiro estagio para a implantação de uma pecuária de índices zootécnicos satisfatórios e uma das opções mais prática e econômica para o melhoramento das pastagens cultivadas. Ademais, a introdução continua de germoplasma forrageiro tem contribuído, de forma positiva e significativa, como alternativa para uma alimentação mais econômica e racional dos rebanhos. Na Amazônia, a alimentação dos rebanhos bovinos esta fundamentada na utilização de pastagens cultivadas, as quais constituem o mais importante componente da produção pecuária.

Gramíneas e leguminosas apresentam potencial para produção de forragem, em quantidade e qualidade satisfatórias para a alimentação de animais herbívoros durante todo o ano. No entanto, o sucesso na utilização dessas espécies para a formação, renovação e/ou recuperação de pastagens, depende de uma serie de fatores envolvendo conhecimentos que permitam a escolha da espécie mais apropriada as condições de clima e solo da região, ate a adoção de praticas de manejo que assegurem o seu perfeito estabelecimento e persistência, alem de maximizarem sua produtividade e seu valor nutritivo. Assim, tem-se desde espécies adaptadas as regiões áridas ate aquelas que so se desenvolvem em regiões excessivamente úmidas; espécies que crescem e persistem em solos ácidos e de baixa fertilidade natural, e outras que exigem altos níveis de nutrientes no solo. Há ainda espécies que requerem um manejo mais cuidadoso e outras que são recomendadas para regiões de topografia acidentada por proporcionarem uma boa cobertura do solo, protegendo-o dos processos erosivos. A expressão máxima do potencial produtivo de uma espécie forrageira esta diretamente relacionada com sua capacidade de adaptação as condições edafoclimáticas predominantes no local de cultivo, bem como as práticas de manejo adotadas. Considerando-se estes fatores, um numero razoavelmente grande de pesquisas ja foi realizado, visando identificar genótipos mais adaptados as diferentes condições ecológicas da Amazônia Legal.

Na busca de novas opções de forrageiras para a região de Paragominas, Pará, avaliou-se a adpatabilidade de uma serie de acessos de gramíneas as condições de uma área anteriormente ocupada por floresta tropical. De 40 cultivares previamente selecionadas pelo Banco Ativo de Germoplasma da Embrapa Amazônia Oriental, apenas cinco foram consideradas altamente promissoras e quatro promissoras, enquanto que 21 foram consideradas inviáveis e dez com médio potencial. Salienta-se que, das noves cultivares melhor classificadas, sete foram de origem africana e apenas duas da América do Sul. Em geral, as gramíneas dos gêneros Panicum, Hyparrhenia, Brachiaria e Pennisetum tem sido as mais importantes para a formação de pastagens em áreas de floresta do trópico úmido brasileiro. O capim-colonião (Panicum maximum) tem sido a forrageira mais difundida em solos de media a alta fertilidade natural e devera ter, ainda, uma papel muito importante na região. Dentre as cultivares mais utilizadas destacam-se a Morumbu (comercial ou comum), Guine e Sempre Verde. No entanto, em virtude do aumento de interesse por outras gramíneas forrageiras e por falta de melhores cultivares, as taxas de expansão do colonião tem sido reduzidas em relação às demais gramíneas. Ha menos de 15 anos, o colonião era plantado em cerca de 85% das pastagens da região amazônica; enquanto que atualmente, estima-se que essa percentagem esteja entre 50 e 65% . Entretanto, nos últimos anos algumas cultivares tem se mostrado promissoras, tais como Makueni, Tobiatã, Vencedor, Centenário, Tanzânia e Massai. A grande ênfase que a pesquisa dedicou as gramíneas do gênero Brachiaria refletem sua importância para a região. As gramíneas deste gênero são menos exigentes quanto as condições físicas e químicas do solo, quando comparadas com outras gramíneas cultivadas na região; possuem hábito de crescimento decumbente, característica muito importante na região, onde a rebrota da vegetação nativa e rápida. Ademais, conservam melhor a umidade do solo, mantendo-se verdes durante o período seco. Atualmente, estima-se que as espécies deste gênero ocupam entre 35 e 45% das pastagens cultivadas em áreas de floresta. Por suas características agronômicas, B. humidicola e ainda a mais difundida na região; contudo, mais recentemente, B. brizantha cv. Marandu, por ser uma cultivar resistente as cigarrinhas-das-pastagens (Deois incompleta e D. flavopicta), além de apresentar altas produções de forragem com bom valor nutritivo, vem gradativa e rapidamente, destacando-se como a mais cultivada em Rondônia, ocupando mais de 50% do total das pastagens formadas no estado. O capim-jaraguá (Hyparrhenia rufa) teve papel relevante no inicio da expansão da pecuária de corte nas áreas de floresta de Rondônia, chegando a ser a segunda gramínea mais plantada no estado, com mais de 40% da área de pastagens cultivadas. No entanto, a pouca persistência, baixa qualidade, falta de diversidade genética, alem da acentuada redução na produção de forragem durante o período seco, foram fatores limitantes a sua expansão. As áreas estabelecidas com esta gramínea estão sendo paulatinamente substituídas pelo Andropogon gayanus, que apresenta algumas características agronômicas superiores, em relação àquela, tais como, tolerância ao fogo, resistência as cigarrinhas-das-pastagens, pouca exigência em termos de fertilidade do solo, boa aceitabilidade por bovinos, ovinos e eqüinos, boa compatibilidade com leguminosas forrageiras, alem de menor sensibilidade ao déficit hídrico.

Ao contrário das gramíneas, as leguminosas forrageiras não tem desempenhado papel relevante nas pastagens cultivadas nas áreas de floresta. Se por um lado ha falta de tradição e experiência dos pecuaristas do Estado em plantar e manejar pastagens consorciadas, pelo outro lado, as opções de genótipos de leguminosas tem sido em numero bastante reduzido e a produção de sementes comerciais tem se mostrado instável e insuficiente. Os gêneros Pueraria, Calopogonium e Centrosema tem sido os mais importantes, destacando-se P. phaseoloides e C. pubescens como as espécies mais difundidas. Atualmente, estima-se que menos de 10% das pastagens do estado estão consorciadas com leguminosas. Contudo, parece haver na região uma lenta mais gradativa conscientização dos pecuaristas para os benefícios advindos do uso de leguminosas forrageiras. Diversos trabalhos de pesquisa foram realizados em Rondônia, com vistas a identificação de novas opções, sendo os gêneros Desmodium, Leucaena, Cajanus, Pueraria, Centrosema e Stylosanthes, os que apresentaram a principal base genética para a seleção de espécies promissoras para a região. Na seleção de uma espécie forrageira, a distribuição estacional de sua produção, durante o ano, é um parâmetro de grande relevância, já que a baixa disponibilidade e qualidade da forragem, principalmente no período de estiagem, e um dos fatores que mais limita a produtividade dos rebanhos. No Pará, avaliando-se dez gramíneas forrageiras, observaram que Paspalum maritimum, Brachiaria mutica e Digitaria decumbens, foram as que apresentaram melhor distribuição estacional da produção de forragem, sendo registrado, durante o período seco, cerca de 50% da produção total verificada durante o ano. Da mesma forma, em Marabá, Pará, constatou-se que B. decumbens cv. IPEAN, Paspalum plicatulum, B. dictioneura, Hermathria altissima e Axonopus scoparius, forneceram a melhor distribuição de forragem, dentre as 19 espécies avaliadas, contribuindo com mais de 50% de suas produções totais, durante o período seco. Já, em Ouro Preto d'Oeste, Rondônia, selecionou-se A. gayanus cv. Planaltina, B. humidicola, Setaria sphacelata cv. S.O. Africa 1 e P. maximum cv. Sempre Verde, como as gramíneas mais produtivas durante o período seco. Em Ariquemes, Rondônia, avaliando-se 36 ecótipos de Panicum maximum detectaram-se variações altamente significativas quanto a produção estacional de forragem. Os ecótipos CPAC-3003, 3057, 3020, 3009, 3068 e 3071 foram os mais promissores para a região, produzindo entre 45 e 55% do total da forragem anual durante o período de estiagem. Resultados semelhantes foram reportados para as gramíneas Paspalum guenoarum FCAP-48, P. secans FCAP-12, P. coryphaeum FCAP-08, Tripsacum australe, Axonopus scoparius e B. brizantha cv. Marandu, cultivadas em Porto Velho, Rondônia. Com relação as leguminosas forrageiras, diversos trabalhos conduzidos em diferentes localidades da Amazônia indicaram que as espécies que apresentaram melhor distribuição estacional da produção de forragem foram Leucaena leucocephala, Desmodium ovalifolium CIAT-350, Stylosanthes guianensis, S. capitata cv. Capica, Centrosema macrocarpum, C. acutifolium e Cassia rotundifolia.

A composição química de uma planta forrageira e uma das variáveis utilizadas para medir o seu valor nutritivo e, dentre os diversos fatores que a afetam, a espécie e/ou cultivar e um dos mais importantes. Em Rondônia, na avaliação de dez espécies de gramíneas forrageiras, verificou-se que A. scoparius, B. decumbens, P. coryphaeum FCAP-08 e P. notatum CPATU-78092 foram as que apresentaram os maiores teores de proteína bruta, os quais foram superiores a 8%. Detectou-se diferenças altamente significativas para os teores de proteína bruta e coeficientes de digestibilidade n vitro da matéria seca (DIVMS) de 20 acessos de P. maximum, os quais variaram de 10,42 a 5,44% e, de 66,94 a 54,29%, respectivamente. Da mesma forma, foram selecionados quatro ecótipos de Stylosanthes capitata (CIAT-1019, 10280, 1405 e 1728), como promissores para a região de Porto Velho, Rondônia, considerando-se, alem das altas produções de forragem, seus elevados teores de nitrogênio, fósforo e coeficientes de DIVMS. Comportamento semelhante foi observado avaliando-se dez espécies de Desmodium. Os teores de proteína bruta e coeficientes de DIVMS registrados em D. ovalifolium CIAT-3673 e D. heterophylum CIAT-3791 foram 22 e 37% superiores aos verificados no tratamento testemunha (D. ovalifolium CIAT-350). Já, os teores de cálcio e fósforo de S. hamata e P. phaseoloides foram mais que o dobro dos obtidos com D. intortum, M. atropurpureum cv. Siratro e L. leucocephala.

Newton de Lucena Costa, Amaury Burlamaqui Bendahan (Embrapa Roraima)

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.