Aftosa: risco desnecessário
Izner Hanna Garcia*
A vitória, sempre, é má conselheira.
O Brasil recebeu em 06 de junho deste ano o status de país livre de febre aftosa sem a necessidade de vacinação, um reconhecimento concedido pela Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA).
Uma vitória, sem dúvida, por longas décadas de tratamento sanitário e cuidado com o rebanho brasileiro.
Em matéria vinculada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária:
“É o início de um processo em que o Brasil troca de patamar com um grupo de elite sanitária mundial, que é muito mais difícil se manter nessa elite. Com toda a dedicação, com os estados, todo o sistema, envolvidos, vamos atingir mercados muito exigentes, mas muito recompensadores.Vamos poder vender pra Japão, Coreia do Sul, que são mais remuneradores e poucos países podem acessar. Ao se declarar livre da Febre Aftosa sem Vacinação, o Brasil dá um passo importante”, destacou o ministro Fávaro.
Ao todo, mais de 244 milhões de bovinos e bubalinos em cerca de 3,2 milhões de propriedades deixarão de ser vacinados contra a doença, trazendo uma redução de custo direta, com a aplicação da vacina, de mais de R$ 500 milhões.”
Assim, a vacinação contra aftosa não é mais obrigatória.
Contudo, em termos sanitários, é prudente “descansar nos louros” desta vitória e deixar de vacinar o rebanho brasileiro?
Considerando a extensão do Brasil e que fazemos fronteira por terra com Uruguai, Argentina, Paraguai, Bolívia, Peru, Colômbia, Venezuela, Guiana e Suriname e com o Departamento da Guiana Francesa, será prudente adotar a não vacinação contra aftosa à partir de agora?
Mais: sopesando o custo da vacina por cabeça esta medida (de não vacinar mais o rebanho) é certa? Compensa esta economia?
Recentemente, no evento “Uma visão de futuro para a produção de carne bovina” promovido pelo Núcleo de Estudos em Sistemas de Produção de Bovinos de Corte e Cadeia Produtiva da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Nespro/UFRGS), Ex-ministro da Pecuária, Agricultura e Pesca do Uruguai, engenheiro agrônomo e pecuarista, Fernando Mattos lançou um alerta.
Ao responder um questionamento sobre o tema da febre aftosa, Mattos salientou que já não ocupa cargo público de alto escalão, o que o deixa à vontade para comentar sobre outros países e lembrou o contexto vivido por Uruguai e Brasil no início dos anos 2000.
“O Uruguai viveu uma enorme crise em 2001, com mais de dois mil focos de aftosa. No Rio Grande do Sul, havia poucos focos”, descreveu Mattos.
Na época, de acordo com o ex-ministro, seu país natal não vacinava os animais, enquanto o RS aplicava a precaução.
“O episódio pegou o Uruguai sem vacinar havia oito anos. Um ano depois da aftosa, tivemos a pior crise financeira que o país viveu em sua história”, disse o ex-ministro.
Ele destacou que, atualmente, o cenário é o oposto. Argentina e Uruguai utilizam a vacinação para se manter sem a doença, enquanto o Brasil abriu mão do recurso.
Mattos considera que o Brasil enfrenta ameaças eventualmente proveniente de vizinhos como Colômbia e Venezuela, nações nas quais “cada vez mais crescem os rumores de focos de aftosa”, e Bolívia, com garantias sanitárias mais precárias. Além disso, Mattos ressaltou a desestruturação do sistema de produção da vacina no território nacional.
Assim, o Brasil assumiu um risco totalmente desnecessário e altamente perigoso para a pecuária e setor de carnes do Brasil.
Izner Hanna Garcia, advogado, pós graduado FGV
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